Estudo mostra que comer placenta pode fazer mal para mãe e bebê
O assunto polêmico divide opiniões e vem ganhando adeptos que defendem seus benefícios. Agora, pesquisadores mostram os possíveis riscos
atualizado
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Quando a apresentadora Bela Gil declarou que ingeriu a placenta do filho Nino, o assunto repercutiu e virou debate de gente grande. Muitos torceram o nariz e fizeram críticas pesadas, outros se mostraram simpatizantes da causa e defenderam os benefícios desse ato.
Na época, em entrevista à Veja Rio, a chef chegou a dar detalhes do preparo: “Nem senti o gosto, porque misturei com vitamina de banana. A Flor, minha primogênita, também bebeu enquanto comemorava a chegada do irmão”. Bela alegou que a placenta era “uma fonte incrível de nutrientes”, mas será mesmo?
Um estudo realizado pela Faculdade de Medicina Weill Cornell, da Universidade Cornell, em Nova York, e publicado no American Journal of Obstetrics and Gynecology, veio para resolver a questão, mostrando como o hábito pode trazer riscos para a mãe e para o bebê.
“A verdade é que comer a placenta é potencialmente perigoso e não há nenhuma evidência de que haja benefícios. Portanto, não faça isso”, diz o professor e ginecologista-obstetra Amos Grunebaum, pesquisador à frente do estudo.
O especialista refez os testes para descobrir os supostos benefícios de ingerir placenta e não obteve resultados positivos. Muito pelo contrário. A conclusão foi de que as condições de aquecimento e manipulação da placenta, na hora do preparo, não a esterilizam corretamente para destruir vírus como o HIV, a hepatite ou o zika — o bebê pode não ser infectado no parto, mas as doenças permanecem concentradas na placenta. Sendo assim, a mãe teria mais uma chance de passar todas essas doenças para o bebê através da amamentação.
A descoberta científica reforça a recomendação do Centro de Controle e Prevenção a Doenças dos EUA, o CDC, que, desde julho de 2016, orienta as mulheres a não realizar o ato de ingestão da placenta e os médicos a explicarem os riscos da prática.
As diretrizes foram impostas após o caso de um bebê ter sido infectado por um estreptococo do grupo B vindo das cápsulas de placenta ingeridas pela mãe. Ainda no estudo publicado, Grunebaum relata que muitos obstetras pedem orientações científicas para passarem às pacientes com dúvidas sobre a placentofagia.
“A decisão de uma mulher deve ser baseada em informações científicas, não em crendices que não se sustentam. A ética é o aspecto mais importante da medicina. Precisamos falar para nossas pacientes o que é certo e o que é errado. E estar preparados para responder com base na ciência”, alega o pesquisador.
O modismo colabora para a incidência dos casos
O pesquisador relembra que as primeiras menções de humanas comendo as próprias placentas têm 100 anos. Outro fato curioso veio dos relatórios respondidos por obstetras de todos os cantos dos EUA para o estudo, mostrando o fascínio e a curiosidade de suas pacientes pela prática após declarações de celebridades famosas.
“As pacientes contam que suas doulas dizem a elas que a placentofagia é comum em outras culturas, mas só encontramos uma cultura em que comer a placenta virou moda, e é a das mulheres de classe alta dos EUA”, declara.
Para a coordenadora de Gestação de Alto Risco do Centro de Medicina Fetal do Hospital Santa Lúcia, Lucila Nagata, o modismo não é uma característica vivenciada apenas no exterior. As brasileiras também precisam ter mais cuidado antes de tomar essa decisão.
“Está em alta essa questão de voltar as origens, da humanização, das coisas mais naturais e a placenta não deixa de ser um ‘fígado’ rico em vários nutrientes – por isso alguns mamíferos comem por instinto. No entanto, ao contrário do que muitos acham, esse hábito veio dos rituais dos aborígenes australianos. Eles celebram o nascimento servindo a placenta para os convidados. Não é algo que realmente venha das nossas raízes”, explica.
A especialista não indica a prática para suas pacientes e sempre faz o alerta. Para as mães que desejam os benefícios propostos pelos boatos da ingestão do órgão, a médica recomenda a substituição por uma alimentação saudável, vitaminas e outros meios comprovadamente úteis.