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“Sem vacina, não existe segurança”, diz Gustavo Fernandes, diretor do Sírio

Em entrevista, o chefe do Hospital Sírio-Libanês em Brasília fala sobre isolamento, tratamentos e empatia: “Precisamos ser mais gentis”

atualizado

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Diretor do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Gustavo Fernandes
1 de 1 Diretor do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Gustavo Fernandes - Foto: Divulgação

Depois de cinco meses do primeiro caso registrado de Covid-19 no Brasil – em 26 de fevereiro –, a pandemia segue implacável. O país registra mais de 2 milhões de infectados e mais de 80 mil mortos. Não há perspectivas para um fim. Quem trabalha na linha de frente encara os próprios medos e a responsabilidade de lidar com tantas vidas enquanto aprende sobre uma enfermidade nova para todos. O desafio não tem sido fácil, ainda mais diante do clima de animosidade – e desconfiança – que se criou em torno da doença e suas implicações. Em entrevista ao Metrópoles, o diretor do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, Gustavo Fernandes, fez um balanço sobre o período de enfrentamento ao novo coronavírus no Brasil.

Para o oncologista, imerso no enfrentamento da Covid-19, a esperança de reaver o convívio social recai sobre a criação de uma vacina eficaz. “Enquanto a vacina não aparecer, a gente não tem um nível de segurança para sair. A solução mais real e mais rápida é a vacina”, afirmou ao Metrópoles. Confira os principais trechos da conversa com o médico:

Vacina
“Enquanto a vacina não aparecer, a gente não tem um nível de segurança para sair. A solução mais real e mais rápida é a vacina. A gente venceu os vírus, historicamente, com vacina. Aí está a bala de ouro do tratamento dessa doença. Deposito as minhas esperanças de poder abraçar meu pai, um parente, meus pacientes na criação de uma vacina. Nesse sentido, no Brasil, temos tido um papel interessante, estamos participando dos testes de duas das mais promissoras.”

Hidroxicloroquina

“Temos alguns estudos com a hidroxicloroquina no mundo. Todos foram negativos. A opinião dos infectologistas é que essa droga deve ser abandonada do tratamento. Quem critica [os médicos contrários ao uso do medicamento] afirma que os estudos têm falhas metodológicas. Mas não há nenhum estudo com hierarquia mais alta que sugira algum benefício razoável. Se hidroxicloroquina funcionar de alguma forma, é pouco, isso está claro. Eu não recomendo que os pacientes usem. Eu não tomo. Não tomo nenhuma dessas drogas que estão sendo usadas, ivermectina, hidroxicloroquina. Não há evidência que suporte o uso.”

Como deve ser o tratamento

“A gente não acha que nenhuma dessas terapias funcione, salvo a dexametasona, a heparina e o remdesivir, que não temos no Brasil. Para a gente prescrever um tratamento em medicina, tem de provar que ele ajuda e não provar que não atrapalha. Por outro lado, se criou uma animosidade, uma agressividade tão grande em cima disso – as pessoas estão tensas e nervosas com o tema – que tenho sido muito suave. Hoje estamos precisando ser mais empáticos, mais humanos, mais gentis. Admito discordância. Se alguém aqui dentro do hospital, em comum acordo com o paciente, achar que tem de tomar um medicamento ou outro, vou respeitar.”

Animosidade que atrapalha

“Está todo mundo machucado, com medo, receoso de adoecer ou perder um parente. As pessoas estão privadas de seus afetos, o que torna todas naturalmente mais agressivas. Existe uma nítida agressividade no ar, seja dos pacientes ou dos familiares. A vida fica árida. Essa aridez se manifesta nas expressões, na maneira que as pessoas se colocam na sociedade. Falta entender que não temos uma cura e precisamos nos respeitar mais. Que tipo de mundo é esse em que as pessoas acham que quem estudou a vida inteira; tem pai, mãe, irmão, amigos e é gente também está agindo em conluio para machucar a sociedade? Que tipo de doença a gente tem na cabeça? A gente precisa tentar influenciar as pessoas com argumentos certos, legítimos. Sem usar emoções e manipulações de medo. E, no final, se respeitar. É um momento de muita dúvida, difícil para a humanidade. Difícil para todas as pessoas. Temos deixado o nosso mau comportamento político influenciar a maneira como a gente se porta frente a um tema de saúde tão importante e significativo.”

Contato mais próximo?

“Existe como promover um encontro sem o contato físico direto, com algum grau de segurança. A gente faz aqui no hospital. Temos fluxo separado, distanciamento físico. Eu, médico, visito pacientes com Covid-19 e não peguei Covid-19. Qual é a dificuldade? Exige disciplina, protocolo, entendimento e até equipamento. É difícil fazer recomendação para a população geral, porque ela não é treinada. É como pilotar uma moto, um avião. Todo mundo pode fazer? Sim. Mas é seguro todo mundo começar a dirigir sem ter instrução, sem ter tido aula? Acho que não. Como acredito que esse pico da pandemia dure por uns seis meses, eu não recomendaria que as pessoas tentassem aprender como ter contato pessoal mais próximo sem se expor ao risco. As possíveis falhas nesse processo podem comprometer a saúde das pessoas. Não queremos que as pessoas vivam com a culpa de ter machucado alguém da própria família.”

UTIs no Sírio Libanês

“A gente tem tido pouquíssimas vagas, lotação praticamente completa, sobretudo nas últimas três semanas. Quando aparece vaga, fica entre duas e três horas livres apenas. Ainda é um problema. Já tivemos mais pacientes com Covid-19. Há uma semana, tínhamos mais. Isso é uma boa notícia, mas o número ainda é muito maior do que o de um mês atrás.”

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De acordo com o médico, há três semanas as UTIs do hospital estão lotadas
Fachada do Hospital Sírio Libanês
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O diretor Gustavo Fernandes deposita suas esperanças contra a Covid-19 na criação de uma vacina

Michael Melo/Metrópoles
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Sarayut Thaneerat/Getty
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De acordo com o médico, há três semanas as UTIs do hospital estão lotadas

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