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Polêmica: atrasar a 2ª dose da vacina contra Covid-19 coloca eficácia em risco?

Decisão do Reino Unido de adiar o reforço pode influenciar outros países. Especialistas se dividem em relação ao tema

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1 de 1 Seringa - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

Desde que o Reino Unido anunciou que permitirá o atraso na segunda dose da vacina contra a Covid-19, no dia 30 de dezembro de 2020, a discussão sobre alterar ou não o esquema de imunização indicado pelos fabricantes das vacinas tem dividido opiniões. Os órgãos de saúde britânicos querem protelar a segunda dose da vacina Pfizer/BioNTech por até 12 semanas, em vez das três ou quatro semanas testadas nos ensaios clínicos, com o intuito de usar as doses prontas para imunizar o máximo de pessoas possível.

A tendência parece ter se alastrado pelo mundo. A Rússia também sinalizou que pretende testar se a vacina Sputnik V, que precisa ser administrada em duas doses, funcionaria em um esquema de dose única – a chamada “Sputnik Light”.

Na semana passada, o presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou que pretende liberar rapidamente a maioria das doses de vacina disponíveis a fim de proteger mais pessoas. A decisão vai de encontro às políticas da administração de Donald Trump, que tem retido milhões de doses de vacina para garantir que as pessoas possam receber uma segunda injeção.

O governo brasileiro também demonstra o intuito de segurar a aplicação da segunda dose para agilizar a vacinação contra a Covid-19. Em entrevista coletiva na noite de quarta-feira (13/1), o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, afirmou que a pasta estuda espaçar as doses, mas ainda não há definição sobre o assunto.

Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a vacina contra a Covid-19 feita pela Pfizer/BioNTech poderá ter a segunda dose adiada “em situações especiais”. O ideal, segundo o órgão, é que a segunda dose seja aplicada entre 21 e 28 dias após a primeira. Porém, com o aumento acentuado no número de casos e a dificuldade em se conseguir doses suficientes para imunizar os grupos de risco, a entidade sugere um intervalo de até seis semanas para a reaplicação.

Alguns estudos começam a indicar a possibilidade de espaçar as doses sem pôr em risco a eficácia das vacinas. Em entrevista ao jornal O Globo, Sue Ann Costa Clemens, coordenadora no Brasil dos ensaios clínicos do imunizante desenvolvido pela Universidade de Oxford em parceria com a AstraZeneca, afirmou que a segunda dose pode ser dada três meses depois da primeira, elevando a eficácia de 70% adquirida após a primeira injeção para mais de 80%.

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“Quando fizemos o intervalo de 4 a 6 semanas para a segunda dose, a eficácia foi mais de 60%. Entre 8 e 12 semanas, sobe para 72,85%. No subgrupo que recebeu a segunda dose após três meses, a eficácia foi de 81,9%”, afirmou a cientista em entrevista ao jornal.

Segundo Sue Ann, espaçar as doses para além das quatro a seis semanas originalmente recomendadas pode aumentar a estimulação do sistema imune, que teria mais tempo para criar anticorpos. O reforço após três meses faria com que o corpo atingisse a imunidade máxima.

Opiniões divididas

A falta de estudos clínicos detalhados sobre os efeitos do atraso na segunda dose da vacina é um dos motivos para considerar a ideia pouco aconselhável, segundo Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). “Temos resultados nesse sentido de estudos feitos pela AstraZeneca e pela Universidade de Oxford, mas é o único. Não podemos transferir esses resultados automaticamente para as outras vacinas”, justifica.

Segundo o imunologista, o ideal seria permanecer com os protocolos de aplicação realizados nos testes clínicos das empresas que desenvolveram os imunizantes. “Quando um medicamento é aprovado por órgãos reguladores, é aprovado naquele formato específico”, explica.

Um dos receios da comunidade científica, segundo Juarez Cunha, é que a alteração no cronograma das vacinas cause efeitos adversos desconhecidos, o que pode causar descrédito com relação aos imunizantes.

“Já temos muitas notícias falsas e muita discussão sobre a eficácia [das vacinas]. Se fizermos um esquema diferente de vacinação e ele não refletir o que foi visto nas pesquisas, podemos estimular grupos antivacina e levar ainda mais dúvidas à população.”

Ainda não é possível saber se um possível atraso na segunda dose da vacina poderia dar origem a novas cepas do coronavírus resistentes aos imunizantes, segundo Cunha. “Ainda temos muito o que aprender sobre este vírus e as vacinas. Seria prematuro afirmar se podemos aplicar só uma dose sem ter perda de segurança e eficácia. Por enquanto, preferimos ser cautelosos, seguir os protocolos e torcer para que as vacinas tenham eficácia contra as novas variantes.”

Pedro Burgel, professor do curso de biomedicina do Centro Universitário IESB e especialista em biologia microbiana e patologia molecular, também acredita que a falta de testes gera incerteza com relação às mudanças na imunização contra Covid-19. “Geralmente, quando temos uma vacinação com mais de uma dose, temos certeza que o sistema imune vai responder de forma robusta”, explica. “Com uma dose só, não sabemos se o corpo responderá de forma rápida a ponto de não dar tempo de desenvolver a doença.”

Para o especialista, a discussão tem mais a ver com estratégia do que com tecnicalidades a respeito dos imunizantes. “Se o Brasil adotar a Coronavac, não vejo benefício nessa estratégia, porque mesmo que se consiga uma cobertura vacinal de 100%, ainda teríamos metade da população correndo risco”, justifica. “Acho que seria melhor vacinar primeiro os grupos de risco, o que reduziria os atendimentos ambulatoriais em 78% e 100% dos casos graves, o que é o mais importante para a gente no momento.”

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