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Pesquisas de vacina do Brasil contra Covid-19 sofrem com falta de financiamento

Cientistas que tentam desenvolver fórmulas 100% nacionais esbarram na falta de recursos e em dificuldades para importação de insumos

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vacina sendo fabricada em laboratório
1 de 1 vacina sendo fabricada em laboratório - Foto: ThisisEngineering RAEng/Unsplash

Há quase nove meses convivendo com o coronavírus e tendo que transformar hábitos para se manter livre da Covid-19, o brasileiro espera, com ansiedade, o desenvolvimento de uma vacina que seja eficaz e segura. O Brasil comprou doses da vacina de Oxford, na Inglaterra. Há discussões sobre a imunização chinesa e novidades sobre a fórmula russa – porém, há também iniciativas nacionais tentando encontrar respostas para o problema.

Pelo menos 11 pesquisas para candidatas à vacina contra Covid-19 estão em desenvolvimento no país. As universidade de São Paulo (USP), a Federal de Minas Gerais (UFMG), a Federal do Paraná (UFPR), o Instituto Butantan e a Fiocruz/Bio-Manguinhos são algumas das instituições que estão em busca de uma solução segura e eficaz 100% nacional.

A maioria dos projetos ainda está na fase de testes em animais, uma etapa inicial em estudos de imunizações. A expectativa é que os ensaios clínicos com humanos comecem apenas a partir do segundo semestre de 2021.

Em entrevista ao Metrópoles, o pesquisador Sérgio Costa, da UFMG, conta que o projeto desenvolvido por sua equipe usa a BCG, a bactéria usada na vacina contra a tuberculose, para produzir alguns genes que são expressados pelo Sars-CoV-2, induzindo o corpo a criar imunidade a ele. A pesquisa é desenvolvida em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o Butantan.

“A BCG é extremamente segura, usada há muitos anos, sem efeitos adversos. Pensamos em melhorá-la para que possa atuar nas duas frentes. Ela também tem um efeito de ativar o sistema imune de forma heterogênea, potencializando as defesas contra outras patologias”, explica.

Segundo ele, a equipe está terminando os experimentos para fazer a bactéria expressar os genes da proteína Spike e do nucleocapsídeo do coronavírus in vitro e, no primeiro semestre do ano que vem, testará a fórmula em animais. “Como é uma vacina usada largamente, esperamos que a fase regulatória seja agilizada”, afirma.

Já o projeto da UFPR usa nanopartículas de polímero biocompatível e biodegradável que imitam os antígenos do vírus para acionar o sistema imune. Foi feito um experimento com camundongos — o grupo de animais que recebeu as partículas com a proteína viral teve 53 vezes mais anticorpos do que o grupo controle.

“As partículas que produzimos foram capazes de ativar o sistema imune para a produção de anticorpos contra o antígeno apresentado. Esse é um primeiro passo para um imunizante ter sucesso como vacina”, explica Marcelo Müller dos Santos, um dos responsáveis pelo desenvolvimento da candidata à vacina.

Agora, o grupo testará a fórmula em grupos maiores, com 12 camundongos, testando diferentes partículas e também a opção de vacina por via intranasal. A expectativa é concluir essa fase até a metade de 2021 e, se a imunização funcionar, entrar com pedido na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para começar os testes em humanos.

Fiocruz

À frente da produção da vacina de Oxford, a Fiocruz/Bio-Manguinhos também está desenvolvendo duas fórmulas por conta própria. O vice-diretor de Desenvolvimento Tecnológico da entidade, Sotiris Missailidis, explica que, desde o começo da pandemia, a Fiocruz está na corrida pela vacina.

São duas abordagens diferentes. Uma usa nanopartículas com peptídeos específicos da Covid-19 – a vantagem dela é ser sintética e, por isso, mais segura,  já que não usa o vírus para fabricar a vacina.

“É uma abordagem mais inovadora, é uma tecnologia que apostamos com relação à novidade, baixo custo e rapidez de desenvolvimento. Por ser uma tecnologia nova, não competiria com o contrato de transferência de tecnologia da AstraZeneca e nada nos impediria de desenvolvê-la em paralelo”, conta Sotiris. Já a segunda usa fragmentos de proteínas do vírus expressas por uma bactéria.

As duas fórmulas da Fiocruz foram testadas em animais, em um estudo pré-clínico para avaliar se são tóxicas, se geram anticorpos e se há resposta celular imune.

O próximo passo envolve a aplicação das melhores fórmulas em hamsters, que serão expostos ao vírus, e se não forem contaminados, será provada a eficácia da vacina. A expectativa da Fiocruz é que uma das candidatas seja avaliada em humanos a partir do meio de 2021.

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Dificuldades

Os pesquisadores são unânimes em apontar que a falta de financiamento e investimento em ciência é um dos principais entraves à produção deste tipo de tecnologia no país. Apesar de a área estar ganhando visibilidade e dinheiro, a falta de atenção nos anos anteriores tornam a resposta à pandemia muito lenta.

Há também falta de infraestrutura das instituições de pesquisa, que vão se enfraquecendo e se tornando obsoletas rapidamente. “Precisamos de um arcabouço de ciência e tecnologia no Brasil, para que possamos responder rapidamente aos desafios que o mundo moderno nos coloca”, diz Sérgio.

“Quando se tem pouco recurso, os grupos de pesquisa vão se enfraquecendo. Muitos pesquisadores que chegam ao doutorado, que são formados por nós, não conseguem bolsa para continuar estudando e acabam tendo que migrar para outros países. Perdemos recursos humanos qualificados, mas não temos como fixá-los no Brasil sem investimento”, explica o pesquisador.

Outro problema é a dificuldade em importar insumos para fabricar um produto sensível como a vacina. Enquanto países da Europa ou os Estados Unidos conseguem importar reagentes com um intervalo de dois dias, o mesmo material pode demorar até três meses para chegar ao Brasil.

“O dólar elevado nos prejudica muito, já que quase todo o material utilizado para o desenvolvimento de vacinas é importado. Burocracia para importação de material biológico para pesquisa científica também é presente e resulta em atrasos nos projetos”, conta Marcelo.

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