Pesquisa usa plasma rico em anticorpos para reduzir gravidade da Covid-19
Estudo argentino, conduzido com 160 idosos, quer criar tratamento de baixo custo como opção até a disponibilização universal da vacina
atualizado
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Cientistas da Fundação Infant, na Argentina, podem ter encontrado uma forma de evitar a progressão da Covid-19 a partir de um tratamento com plasma de ex-pacientes com a doença. O ensaio clínico foi conduzido com 160 idosos com 77 anos.
De acordo com os pesquisadores, o tratamento custaria menos de R$ 1 mil por paciente, valor menor que outros na mesma linha. O trabalho foi publicado no periódico científico The New England Journal of Medicine.
O plasma sanguíneo usado na pesquisa foi obtido a partir de doações de pessoas que foram infectadas pelo coronavírus, mas já estavam assintomáticas e com teste negativo para a doença. Cada doação, de 750 ml de plasma, foi suficiente para tratar até três pacientes, que receberam infusões do plasma.
Os idosos selecionados para o ensaio clínico tinham comorbidades, como diabetes, hipertensão, doença renal crônica ou obesidade. Eles foram divididos em dois grupos: o primeiro recebeu o plasma e o segundo um placebo, ou seja, uma substância sem efeito. Nem médicos ou pacientes sabiam quem recebeu o tratamento ou a solução inócua.
Todos os voluntários ainda estavam na primeira semana de infecção (considerando o período de incubação do vírus), com início de sintomas até 72h antes de cada injeção de plasma. Cada infusão levou, em média, 1h30.
Diferença de outros testes
Aplicar as infusões no início da doença foi importante porque, de acordo com Fernando Polack, médico especialista em doenças infecciosas pediátricas e principal autor do estudo, outros testes semelhantes não foram bem sucedidos justamente por não terem sido feitos nos primeiros dias de infecção.
“Tratamentos para doenças respiratórias infecciosas geralmente funcionam melhor quando administrados antes, como no caso do Tamiflu contra a gripe. É possível conter a progressão, mas tem que ser rápido”, detalhou o especialista.
De cada quatro participantes, um não apresentou a forma grave da doença, segundo Polack. O risco de desenvolver o quadro respiratório grave, com respiração acelerada e baixa quantidade de oxigênio no sangue, foi reduzido em 48%.
Pacientes que foram inoculados com plasmas especialmente ricos em anticorpos (geralmente doados por pessoas que precisaram ser internadas) tiveram resultados ainda mais animadores, com proteção de até 73% contra a forma grave da Covid-19. Não foram observados efeitos colaterais do tratamento.
Os resultados evidenciaram a importância de focar em pacientes de maior risco para o coronavírus, segundo Polack. O estudo ainda é incipiente e não conseguiu mostrar significância estatística em alguns pontos, como a redução de mortes, por conta do número reduzido de participantes. Durante a pesquisa, dois idosos do grupo de teste (que receberam o plasma) faleceram, enquanto outros quatro morreram no grupo placebo.
Doadores
As milhares pessoas que foram contaminadas pelo Sars-CoV-2 poderiam ser potenciais doadores, de acordo com Fernando Polack, o que tornaria o tratamento altamente promissor, caso seja levado adiante. Mesmo pacientes já vacinados poderiam doar o plasma sanguíneo, uma vez que também já teriam anticorpos contra o vírus.
“É um estudo pequeno, mas se olharmos para os desfechos secundários, como necessidade de suplementação de oxigênio, intubação, internação em UTI, morte, todos apontam para a mesma direção. Sabíamos que não seria possível identificar essas diferenças estatisticamente, mas é possível com base no que vimos supor que com menos casos graves haverá menos hospitalizações e menos mortes”, analisou Polack.
O custo do tratamento foi estimado em US$ 186,25 (R$ 977,51) por paciente, o que também poderia ser um atrativo para a alternativa à vacina.