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Ozempic: o futuro do remédio que revolucionou tratamento da obesidade

Em cenário no qual demanda supera em muito a oferta, fabricante do Ozempic se prepara para ampliar produção e lidar com o fim da patente

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Montagem mostra uma série de injeções de ozempic contra um fundo vermelho - Metrópoles
1 de 1 Montagem mostra uma série de injeções de ozempic contra um fundo vermelho - Metrópoles - Foto: Reprodução

No início de 2022, as perspectivas de tratamento para pacientes com obesidade passaram por uma revolução. O Ozempic, medicamento recomendado inicialmente para pessoas com diabetes, se mostrou extremamente eficaz para o controle do apetite, fazendo com que as pessoas perdessem até 30% do peso total.

De lá para cá, o uso “off label” se disseminou e a aplicação do medicamento se transformou em uma verdadeira febre. O Ozempic deixou de ser utilizado apenas por pacientes obesos, e até celebridades passaram a dizer que recorreram às canetas injetáveis para perder “alguns quilinhos”.

A Novo Nordisk se tornou a farmacêutica mais valiosa do mercado europeu por conta da semaglutida e moléculas similares, que estão no Saxenda, Wegovy, Rybelsus e Victoza. A fabricante se posiciona contra o uso “off label” do remédio e faz alertas constantes à população sobre a excassez do medicamento devido à demanda.

Em entrevista à CNN Internacional, o CEO da multinacional, Lars Fruergaard Jorgensen, afirmou que a empresa está investindo no aumento da capacidade de fabricação, mas disse não acreditar que será o suficiente para atender à procura mundial pelo remédio.

“Tenho a sensação de que pode levar alguns anos até realmente atendermos a demanda que já existe pelos nossos medicamentos. Na verdade, nem sabemos o quão grande ela pode ser, já que muitas pessoas com obesidade ainda querem receber o tratamento”, explica.

A versão da semaglutida especificamente contra a obesidade da Novo Nordisk, o Wegovy, foi aprovada em janeiro pela Anvisa, mas até hoje não tem data para começar a ser vendida no Brasil. A justificativa para a demora é a alta demanda global.

Atualmente, o Wegovy está disponível na Noruega, na Dinamarca e nos Estados Unidos. Alemanha e Reino Unido passaram a receber os remédios a partir deste mês.

Com obesidade e sobrepeso cada vez mais prevalentes no mundo, a onda Ozempic parece longe do fim e o mercado consumidor da medicação ainda pode ser ampliado muitas vezes. O remédio é caro — custa cerca de mil reais a caneta — mas, e se estivesse disponível no Sistema Único de Saúde (SUS)?

Incorporação no SUS

A Novo Nordisk entrou, em março deste ano, com um pedido de incorporação do Saxenda (que é aprovado pela Anvisa contra a obesidade e é uma versão anterior ao Ozempic) junto à Conitec, comissão que decide o que vai ser ou não disponibilizado pelo SUS.

“O comitê considerou que a tecnologia utilizada de forma isolada não é efetiva para o controle da obesidade como problema de saúde pública e que ela deveria estar associada a medidas de modificação no estilo de vida, tais como dieta hipocalórica, prática de exercícios físicos, tratamento psicológico, dentre outras”, escreveram os representantes da Conitec no relatório preliminar. Eles também citam que o medicamento teria elevado impacto orçamentário e não seria custo-efetivo.

Na consulta pública, 98,9% das participações foram favoráveis à incorporação da tecnologia. Ainda assim, a Conitec não mudou de posição e decidiu contra a disponibilização do Saxenda na rede pública.

A farmacêutica fez outra tentativa em maio, com o Victoza (que é aprovado para o tratamento de diabetes e tem o mesmo princípio ativo do Saxenda). A expectativa é que a decisão preliminar da Conitec seja anunciada em novembro. Em nota enviada ao Metrópoles, a Novo Nordisk afirma que não há previsão para incorporação do Ozempic.

A médica endocrinologista Cynthia Valério, diretora da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), conta que a entidade enxerga de maneira positiva a incorporação dessas drogas no SUS, desde que sejam observadas questões de custo e efetividade.

“Do ponto de vista prático, a obesidade traz comorbidades, muitas potencialmente fatais, que acabam sobrecarregando o sistema de saúde. Acreditamos que será de grande valor para a saúde pública e privada a possibilidade de tratar a doença mais precocemente e adequadamente”, explica a especialista.

A obesidade é uma das únicas doenças que não é tratada com medicamentos pelo SUS — por enquanto, o paciente que procura ajuda recebe apenas uma dieta e recomendações para a prática de exercícios. Em casos mais graves, há indicação para cirurgia bariátrica.

“Observamos que uma parte significativa das pessoas que têm obesidade precisa de tratamento farmacológico. E a gente vê um futuro promissor para o tratamento da obesidade desse ponto de vista: com o avanço da ciência, pois o número de medicações com segurança e eficácia comprovada vem crescendo“, explica o presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Paulo Augusto Miranda.

Ele aponta que os medicamentos disponíveis até o momento são caros, e que é preciso fazer uma conta complexa de custo/benefício para avaliar a incorporação tanto no SUS quanto na saúde suplementar. “A gente entende que o balanceamento entre o orçamento e o custo das medicações é complicado, e é um movimento que vai exigir o esforço de todos”, afirma.

A queda da patente

Porém, esse cenário pode mudar radicalmente a partir do próximo ano. A Novo Nordisk perderá a patente do Saxenda (liraglutida) a partir de 2024, e a do Ozempic (semaglutida), em 2026.

No Brasil, o entendimento é que o tempo de patente não pode ultrapassar 20 anos. A farmacêutica entrou com um recurso pedindo extensão da validade para considerar a demora da análise do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), mas o pedido foi negado em primeira instância. A empresa está recorrendo.

“A Novo Nordisk salienta que em suas ações judiciais não existe uma solicitação de extensão de patente, mas sim, apenas uma restituição ─ em medida exatamente igual, em natureza e tamanho ─ daquilo que lhe foi extraído pela inércia do INPI durante a fase de análise e aprovação das patentes objeto das ações judiciais”, afirma a empresa, em nota.

Se a patente realmente for derrubada, estima-se que o preço do medicamento possa cair até 75%.

Versões genéricas?

Em 2024, com a queda da patente do Saxenda, a indústria brasileira ficará livre para a produção de genéricos da liraglutida. A substância é uma das poucas liberadas pela Anvisa para o tratamento da obesidade, mas apesar de estar no mercado há muitos anos, a tecnologia para produzi-la não é simples.

Ainda assim, as farmacêuticas produtoras de genéricos estão se organizando para suprir a demanda. Procurada pelo Metrópoles, a Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (PróGenéricos) não quis comentar sobre a organização do grupo para fabricar a liraglutida ou semiglutida no futuro, mas afirmou estar acompanhando o assunto.

Porém, os representantes da Sbem e da Abeso afirmam que o Brasil não só tem fábricas preparadas, como as empresas estão correndo para desenvolver produtos de qualidade. “Existe uma movimentação da indústria, mas como é uma tecnologia diferente das medicações orais, talvez leve um tempo a mais do que os remédios de uso oral”, afirma a endocrinologista Cynthia, da Abeso.

Miranda conta que duas empresas nacionais têm um parque industrial capaz de produzir a substância para atender o mercado interno. “Talvez a quebra da liraglutida nos abra uma porta. As empresas estão em fase de andamento com registros e validações, e isso nos abre uma boa perspectiva de ter essas medicações com eficácia e segurança de longo prazo com um custo um pouco mais baixo”, afirma.

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