O SUS está dando conta da pandemia? Conheça erros e acertos
Apesar de existir desconfiança em relação ao sistema público de saúde, especialistas afirmam que ele cumpriu seu papel dentro do possível
atualizado
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O Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil é conhecido internacionalmente por ser um dos melhores do mundo. São poucos os países onde todas as pessoas podem receber tratamento médico gratuito para qualquer condição.
Com a pressão da pandemia do coronavírus, os hospitais públicos precisaram incorporar serviços para atender milhares de brasileiros com sintomas da Covid-19, um adicional enorme ao contingente de pacientes que já usava o SUS diariamente. Segundo uma pesquisa da Famivita – empresa de produtos para a saúde -, feita com 11.800 pessoas, 56% dos brasileiros acreditam que o sistema não deu conta da demanda da pandemia.
Apesar da baixa confiança declarada, o presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica (SBCM), Antônio Carlos Lopes, afirma que o SUS deu conta sim da demanda — foi feito o possível tendo em vista a quantidade de pacientes e a estrutura existente que não recebe o apoio necessário.
“Cumprimos os objetivos na medida do possível, com o que tínhamos disponível. Podia ter sido melhor, se tivéssemos voltado a nossa atenção para o SUS há mais tempo. É um sistema que não recebe investimentos para ter uma infraestrutura razoável”, opina.
O professor do departamento de saúde coletiva da Universidade de Brasília (UnB) Jonas Lotufo concorda. Para ele, o SUS reforçou sua importância durante a pandemia. “A Covid-19 reforçou o papel do SUS como garantidor do direito à saúde. É uma doença nova e vamos aprendendo junto com ela”, explica.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) também já elogiou o sistema de saúde brasileiro e sua ação durante a pandemia. O diretor de emergências da entidade, Michael Ryan, afirmou, mais de uma vez, que o SUS deu conta da demanda e reforçou a necessidade de investimentos no serviço público.
Erros e acertos
Por ser uma doença nova, a Covid-19 apresentou grandes desafios ao sistema de saúde. Segundo Jonas, o país acertou ao mudar rapidamente as recomendações e pedir para que os pacientes com falta de ar procurassem atendimento médico. No entanto, o cenário mostrou a necessidade de maior investimento na atenção primária e no sistema de vigilância epidemiológica.
“Estamos falando disso há décadas, mas a pandemia trouxe esse assunto de maneira mais relevante. Precisamos de uma vigilância com capacidade, porque ela articula e traz inteligência para a tomada de decisões. A atenção primária também precisa ser forte para ajudar a comunidade no dia a dia. Sem ela, jamais teremos hospitais suficientes para a demanda”, explica.
O presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica lembra que, além disso, para preparar o país para uma possível segunda onda de Covid-19, é preciso lidar com a estrutura. Exames e diagnósticos de imagens precisam ficar prontos mais rápido e os laboratórios para processamento dos testes devem ser mais ágeis. A falta de medicamentos para intubação não pode se repetir.
“Estamos trocando a roda do carro com ele andando. Outra iniciativa importante seria uma educação continuada para uniformizar a conduta do tratamento da Covid-19. Muitas pessoas foram internadas e intubadas sem necessidade porque a equipe não sabia o que fazer”, conta.
Ele chama a atenção ainda para a necessidade de valorizar os profissionais de saúde que se expõe diariamente para garantir o atendimento à população. De acordo com o presidente da SBCM, não há um plano de carreira que dê perspectivas ao trabalhador, tanto de salário e progressão dentro do sistema, quanto de recolocação mais perto de casa. Muitos profissionais acabam se mudando para cidades do interior, mas não conseguem ficar por muito tempo, abandonando o SUS.
SUS em perigo
Apesar de ter se mostrado essencial durante a pandemia, o sistema único de saúde brasileiro está ameaçado com a perda de verbas. “Corremos riscos relacionados ao desfinanciamento. A PEC do teto de gastos vem limitando a expansão do sistema e, com isso, os estados vem investindo menos no atendimento à população. O maior desafio do SUS é se fortalecer”, afirma o professor da UnB.
Outro perigo é a iniciativa privada, que vem tentando expandir sua área de atuação. “Se tenta vender a ilusão de que se garantirá o acesso à saúde. Vários países entraram nessa aventura, mas o custo para o Estado só aumentou”, detalha Jonas. “O SUS coloca a saúde como um direito da população e tem conseguido efetivar isso de maneira concreta.”