Nitazoxanida não reduz sintomas da Covid-19, só carga viral, diz estudo
Na segunda (19/10), o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações afirmou que remédio seria eficaz para o tratamento precoce da doença
atualizado
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Uma pré-publicação do estudo encomendado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a respeito do medicamento nitazoxanida, vermífugo comercialmente conhecido como Annita, informou que o medicamento não tem evidência de impacto para o tratamento da Covid-19.
Os testes apontaram que, após 5 dias de terapia, não houve diferença significante na resolução dos sintomas da doença entre o grupo que recebeu a medicação e os voluntários que tomaram as doses de placebo. Um resultado considerado secundário pelos pesquisadores é a redução da carga viral entre os pacientes que tomaram a nitazoxanida.
A medicação foi apresentada pelo governo, em cerimônia no Palácio do Planalto na última segunda-feira (19/10), sem a divulgação completa dos dados da pesquisa. Na ocasião, em uma peça publicitária produzida para a cerimônia, o governo usou um gráfico genérico, adquirido em banco de imagem, acompanhado da afirmação de que o estudo realizado pela pasta “confirmou de forma científica a eficácia do medicamento”
O gráfico exibido pelo Ministério da Ciência e Tecnologia foi acompanhado da afirmação de que o estudo realizado “confirmou de forma científica a eficácia do medicamento”. Na ocasião, o ministro Marcos Pontes declarou que “temos um medicamento, comprovado cientificamente, que é capaz de reduzir a carga viral. O que significa isso? Na prática, significa que reduz o contágio das pessoas que tomam o medicamento. E mais: diminui a probabilidade dessas pessoas aumentarem os sintomas, irem para o hospital e falecer”.
Porém, não há comprovação científica de que a quantidade de vírus no organismo faça diferença na transmissão ou no desenrolar da doença. Há estudos que mostram essa associação apenas em casos graves. A pesquisa publicada hoje foca em pacientes leves.
A publicação prévia foi feita nesta sexta-feira (23/10) pela revista científica medrxiv. O chamado pré-print ainda não passou pela chamada revisão por pares, que pode apontar inconsistência nos resultados e métodos usados para o levantamento.
“A droga antiparasítica nitazoxanida é amplamente disponível e exerce atividade antiviral in vitro. Contudo, não há evidência de seu impacto na infecção por Sars-CoV-2”, diz o estudo no primeiro parágrafo. “Em pacientes com Covid-19 moderada, a resolução de sintomas não teve diferença entre grupos tratados com nitazoxanida ou placebo após 5 dias de terapia.”, escrevem os cientistas.
De acordo com o infectologista Alberto Chebabo, do Laboratório Exame, os pesquisadores procuravam uma redução de febre e tosse, sintomas leves, nos primeiros cinco dias e redução da carga viral. Não houve diferença nos sintomas neste intervalo, mas sim em sete dias.
“É um estudo interessante, mostra que o remédio tem atividade antiviral, mas em termos de tratamento, não muda nada. Precisamos de uma droga que mude desfecho grave, de paciente que precisa de oxigênio, de ser entubado. Uma droga que reduz febre não muda muito a história natural da doença”, explica o especialista.
Segundo ele, a diminuição da carga viral propagandeada pelo governo pode ser interessante se houver comprovação de que há diminuição na transmissão. “O estudo infere, mas não existe comprovação”, afirma. “Até o momento, a droga tem resultados muito pouco importantes”, diz.
Chebabo explica que este estudo abre as portas para outras pesquisas, mas “como protocolo de tratamento encampado pelo governo, não vejo vantagem. Vai ter um custo de compra, de distribuição. Ainda é cedo”, diz.
O Metrópoles tentou contato com Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) para falar com a coordenadora do estudo, Patrícia Rocco, por email e por telefone. No entanto, até a publicação desta reportagem, não recebeu resposta. O MCTIC também foi acionado para comentar sobre o estudo, mas também não enviou declarações. O espaço continua aberto às manifestações.