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“Não conseguia nem abrir a mão”, conta mulher que teve AVC aos 30 anos

Meses depois de sofrer AVC grave, Maíra Veiga viu seus músculos ficarem rígidos e a mão fechar com tanta força que era impossível abrí-la

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Imagem mostra uma mulher branca, sentada em um hospital - Metrópoles
1 de 1 Imagem mostra uma mulher branca, sentada em um hospital - Metrópoles - Foto: Arquivo pessoal

Um AVC vira a vida do paciente de cabeça para baixo. Muitas vezes, os sintomas acontecem sem preparo e aviso prévio, e as consequências do acidente vascular cerebral perduram por muitos anos. “Fisioterapia e paciência” é o lema de grande parte das pessoas que sobreviveram ao evento de saúde grave.

Essa é a frase que, por muitos anos, regeu a vida da professora universitária Maíra Veiga, hoje com 38 anos. Aos 30, sem nenhum fator de risco, ela sofreu um AVC enquanto dormia, às vésperas de assistir, ao vivo, as Olimpíadas do Rio. Maíra acordou com muita vontade de ir ao banheiro, formigamento no rosto, uma dor estranha na lombar e fraqueza na perna. Achou que tinha dormido de mal jeito, ou se machucado na academia.

“Meu pai entrou no quarto porque ia me dar uma carona para o aeroporto. Ele tomou um susto, ficou desesperado. Eu estava com o rosto torto e a perna bamba, sem movimento. Falei pra ele que eu estava com dor, mas devia ser um mal jeito na coluna. Nunca imaginei que ia ter um AVC aos 30 anos, com a saúde perfeita. Nunca fui fumante, ia para a academia todos os dias e não tinha histórico na família”, lembra.

O pai de Maíra ficou desconfiado, e ligou para alguns vizinhos que eram médicos. Ninguém atendeu. Uma tia da paulista é médica, e atendeu o telefone: disse que devia ser um derrame, e eles deveriam ligar para o SAMU com urgência. Maíra foi andando para a ambulância, não usou cadeira de rodas no hospital. Na ressonância, o diagnóstico. AVC isquêmico.

“O médico até assustou o meu pai. Ele disse que o AVC era grande, que eu ia para a UTI e que, dali em diante, não dava para garantir nada. Eu continuava achando que estava com mal jeito nas costas, meus sinais vitais estavam normais”, conta Maíra.

Um primo neurologista olhou os exames, tranquilizou os dois, e disse que deviam esperar os médicos fazerem o protocolo do AVC. Um tio dela, que é neurocirurgião, foi visitar Maíra no hospital, e sugeriu que ela fosse transferida para um hospital que é referência, onde ele conhecia os médicos. “O convênio cobria, então eu fui”, diz.

Maíra ficou mais três dias na UTI antes de ser transferida para o quarto. O médico responsável pelo caso fez uma bateria de exames (“me revirou do avesso”) e concluiu que o AVC foi causado pelo anticoncepcional. A professora usava o medicamento desde os 12 anos de idade para controlar um diagnóstico de ovário micropolicístico, e fazia check-up anual. “Ninguém sabe exatamente o motivo, mas o sangue estava muito coagulado, até que o corpo não deu mais conta”, explica Maíra.

A professora lembra que estava em choque, e só dormiu quando chegou no quarto. Assustada e sem entender o que estava acontecendo, a ficha de Maíra só começou a cair quando percebeu as sequelas. Não conseguia ir ao banheiro e nem sentar sozinha. Foi quando ouviu o conselho do médico: “Fisioterapia e paciência”.

Espasticidade, uma sequela complicada do AVC

A vida de Maíra se transformou completamente depois do AVC. Ela ficou um mês internada, e saiu de cadeira de rodas do hospital — foi para casa com home care, acompanhada de uma enfermeira. “No início foi muito difícil. Eu tinha uma vida saudável e, de repente, estava sendo carregada por alguém e usando fralda geriátrica”, lembra.

De segunda a segunda, ela fazia mais de uma sessão por dia de fisioterapia, além de terapia ocupacional e acupuntura. Aos poucos, o movimento foi voltando: primeiro o dedão do pé, e depois o joelho. “Uma fisioterapeuta me colocou de pé e eu comecei a dar os primeiros passos. Dois meses depois, voltei a andar, mas sempre me segurando em alguém. Fui em um fisiatra, e ele me recomendou uma órtese que se encaixa dentro do tênis. Sempre tive na minha cabeça que eu ia voltar 100% para a minha vida”, conta a professora.

Imagem mostra a sala de uma casa com vários colchonetes e pesos para fisioterapia - Metrópoles
A sala da casa de Maíra se tornou uma espécie de centro de fisioterapia

Porém, três meses depois do AVC, a mão de Maíra, que estava bem molenga, como a de uma boneca, começou a ficar rígida. O quadro foi evoluindo, ao ponto que ela não conseguia abrir a mão esquerda e ficava até machucada com as próprias unhas. A perna também ficou dura. A condição é chamada de espasticidade.

Um a cada três pacientes que sofrem AVC têm a complicação, que é mais comum em quem teve uma lesão no sistema nervoso central que comprometeu uma área motora. Não é uma questão de ser uma pessoa jovem ou idosa, homem ou mulher. Depende da extensão do acidente e da região em que ele aconteceu.

“Existe um equilíbrio harmônico entre os neurônios motores para promover movimentos assertivos e precisos. Uma lesão rompe esse equilíbrio e causa contraturas involuntárias e rigidez. Na primeira fase, há uma interrupção aguda e a paralisia é flácida ou arreflexica. Algum tempo depois, a atividade se manifesta em contraturas involuntárias”, explica o neurologista Amauri Araujo Godinho, do Hospital Santa Lúcia, em Brasília.

Na prática, há uma alteração do tônus muscular que o torna enrijecido. Como não é um movimento voluntário, o paciente não consegue desfazer a contração. É como se o nervo ficasse duro. “O membro se endurece de uma forma que causa muita dor e atrapalha a mobilidade. Não é uma situação reversível, mas melhora com o tratamento”, ensina a neurologista e neuroimunologista Natália Nasser Ximenes, também do Hospital Santa Lúcia.

Godinho lembra que é muito importante tratar a espasticidade, uma vez que o paciente vai ficando cada vez mais rígido, os membros se encolhem e os tendões vão se encurtando. O quadro avançado dificulta muito o transporte e higiene dessas pessoas, que algumas vezes não conseguem sequer se sentar em uma cadeira de rodas.

O tratamento envolve relaxantes musculares de ação no sistema nervoso central e também outras classes de medicamento, incluindo anticonvulsivantes e benzodiazepínicos. Em casos de pacientes que tiveram encurtamento de tendão, pode ser necessária cirurgia para que ele possa esticar a perna novamente, por exemplo. Em situações graves, pode ser necessária uma cirurgia cerebral para ajudar na recuperação.

Além de fisioterapia, que é obrigatória para quem tem qualquer lesão após o AVC, o padrão-ouro para o tratamento da espasticidade é a toxina botulínica. Nesses casos, a aplicação passa longe da estética: o objetivo é relaxar o músculo, permitindo que o paciente recupere alguns movimentos.

Maíra faz, até hoje, aplicações da toxina botulínica a cada três ou quatro meses. A professora explica que a toxina botulínica tem ganhos, já que trabalha uma musculatura de cada vez, mas, em tese, pode parar de fazer efeito eventualmente. Até que aconteça, ela seguirá no tratamento.

Mas, com muita fisioterapia e a ajuda de um robô que “salvou sua vida” ao treinar o punho, pulso, cotovelo e ombro, hoje ela já recuperou os movimentos do braço.

“Não tenho força e destreza, não consigo digitar no computador nem abrir um pote de palmito. Mas consigo fazer muita coisa. Demorou anos, mas hoje sou capaz de colocar um sutiã e camiseta sozinha. Trabalho normal, estudo, concluí duas pós graduações. Minha vida foi voltando. Mas ainda tenho espasticidade”, conta.

Neste processo que já dura oito anos, cada comemoração de aniversário foi especial, e cada problema superado merecia ser celebrado. Um dos momentos mais emocionantes da recuperação de Maíra foi seu casamento. Ela fez o botox e conseguiu entrar na igreja vestida de noiva, caminhando. “Foi muito especial, uma vitória mesmo”, conta.

Imagem mostra Maíra Vieira vestida de noiva e o pai, entrando na igreja - Metrópoles
Uma das maiores vitórias de Maíra foi conseguir entrar caminhando em seu casamento

Outras complicações

Dependendo da extensão, tipo e local onde acontece o AVC, outras sequelas além da espasticidade podem aparecer. Segundo o fisiatra Eduardo Rocha, pode haver dificuldade para engolir, assimetria facial, alteração da fala, perda de força e equilíbrio (resultando em dificuldades para caminhar), além de déficit cognitivo, como perda de memória e concentração.

Rocha também alerta para a possibilidade de ter um outro acidente vascular cerebral. Anualmente, entre 5 e 14% dos pacientes que tiveram AVC sofrerão outro episódio. “Essa é uma probabilidade que aumenta com o tempo: cinco anos após o primeiro AVC, as chances de um novo ataque são de 24% para as mulheres e 42% para os homens”, afirma.

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O acidente pode ocorrer por diversos motivos, como acúmulos de placas de gordura ou formação de um coágulo – que dão origem ao AVC isquêmico –, sangramento por pressão alta e até ruptura de um aneurisma – causando o AVC hemorrágico
Muitos sintomas são comuns aos acidentes vasculares isquêmicos e hemorrágicos, como: dor de cabeça muito forte, fraqueza ou dormência em alguma parte do corpo, paralisia e perda súbita da fala
O derrame cerebral não tem cura, entretanto, pode ser prevenido em grande parte dos casos. Quando isso acontece, é possível investir em tratamentos para melhora do quadro e em reabilitação para diminuir o risco de sequelas
Na maioria das vezes, acontece em pessoas acima dos 50 anos, entretanto, também é possível acometer jovens. A doença pode acontecer devido a cinco principais causas
Tabagismo e má alimentação: é importante adotar uma dieta mais saudável, rica em vegetais, frutas e carne magra, além de praticar atividade física pelo menos 3 vezes na semana e não fumar
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O acidente vascular cerebral, também conhecido como AVC ou derrame cerebral, é a interrupção do fluxo de sangue para alguma região do cérebro

Agência Brasil
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O acidente pode ocorrer por diversos motivos, como acúmulos de placas de gordura ou formação de um coágulo – que dão origem ao AVC isquêmico –, sangramento por pressão alta e até ruptura de um aneurisma – causando o AVC hemorrágico

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Muitos sintomas são comuns aos acidentes vasculares isquêmicos e hemorrágicos, como: dor de cabeça muito forte, fraqueza ou dormência em alguma parte do corpo, paralisia e perda súbita da fala

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O derrame cerebral não tem cura, entretanto, pode ser prevenido em grande parte dos casos. Quando isso acontece, é possível investir em tratamentos para melhora do quadro e em reabilitação para diminuir o risco de sequelas

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Na maioria das vezes, acontece em pessoas acima dos 50 anos, entretanto, também é possível acometer jovens. A doença pode acontecer devido a cinco principais causas

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Tabagismo e má alimentação: é importante adotar uma dieta mais saudável, rica em vegetais, frutas e carne magra, além de praticar atividade física pelo menos 3 vezes na semana e não fumar

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Pressão alta, colesterol e diabetes: deve-se controlar adequadamente essas doenças, além de adotar hábitos de vida saudáveis para diminuir seus efeitos negativos sobre o corpo, uma vez que podem desencadear o AVC

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Defeitos no coração ou vasos sanguíneos: essas alterações podem ser detectadas em consultas de rotina e, caso sejam identificadas, devem ser acompanhadas. Em algumas pessoas, pode ser necessário o uso de medicamentos, como anticoagulantes

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Drogas ilícitas: o recomendado é buscar ajuda de um centro especializado em drogas para que se possa fazer o processo de desintoxicação e, assim, melhorar a qualidade de vida do paciente, diminuindo as chances de AVC

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Aumento da coagulação do sangue: doenças como o lúpus, anemia falciforme ou trombofilias; doenças que inflamam os vasos sanguíneos, como vasculites; ou espasmos cerebrais, que impedem o fluxo de sangue, devem ser investigados

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Para evitar recidivas, é importante não fumar, evitar o consumo excessivo de álcool e manter uma alimentação saudável, além de praticar exercícios regularmente e controlar a pressão arterial e glicemia. “A paciência e a perseverança são fundamentais”, conta Maíra, que até hoje se cuida para evitar novos problemas.

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