Mulher com síndrome rara: “Vivi um inferno por causa das coceiras”
A paulistana Érica Soeiro foi diagnosticada com a síndrome de Schnitzler. Ela apresentava coceira intensa nas pernas além de dor óssea
atualizado
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No Brasil, de acordo com associações de pacientes, uma pessoa com doença rara demora de cinco a sete anos para ser diagnosticada corretamente. A jornada pode incluir consultas com sete profissionais de saúde diferentes até que o indivíduo finalmente saiba o que está causando seus sintomas e comece um tratamento direcionado e eficaz.
Foi o que aconteceu com a bancária Érica Soeiro, de 41 anos, que começou a sentir sintomas estranhos em 2017, chegou a ser internada 30 vezes entre 2018 e 2019, e só conseguiu ser diagnosticada em 2021. O primeiro sinal de que algo estava errado foi um desmaio repentino, que a deixou desacordada por muitos minutos.
Ela procurou um médico, fez uma bateria de exames, mas não foi definida a causa do problema. Como não desmaiou novamente, deixou para lá. Porém, poucos meses depois, a moradora de Guarulhos, em São Paulo, começou a se sentir mal no trabalho. Érica foi ao hospital novamente, mas o profissional de saúde que a atendeu afirmou que ela não deveria se preocupar.
No mesmo dia, a bancária voltou ao centro de saúde com fortes dores no peito e passou uma semana internada com suspeita de pericardite. A mulher recebeu atendimento durante o período, e voltou à vida normal. Meses depois, “o inferno começou”.
“Decidi sair com meu marido para jantar e, no restaurante, comecei a passar mal. Senti muita fraqueza e uma coceira maluca nas pernas, do joelho ao tornozelo, que acreditei ser por causa da depilação”, lembra.
A busca por um diagnóstico
Em uma semana, a bancária foi ao pronto-socorro sete vezes e chegou a ser anestesiada para amenizar as coceiras intensas e persistentes. A partir daí, toda semana ela tinha crise e começou a pular de médico em médico, até se ver praticamente morando no hospital.
Um dia, depois que o chuveiro elétrico de sua casa parou de funcionar, ela descobriu acidentalmente que banhos gelados amenizavam suas coceiras. Érica passou a mergulhar as pernas em baldes de água gelada quando os medicamentos não surtiam efeito.
Ela conta que se consultou com neurologistas e psiquiatras, pois acreditava sofrer com algum problema psicológico. Durante três anos e meio, ela aprendeu a conviver com a dor óssea e com a coceira, pois ninguém sabia o que ela tinha. Entre 2018 e 2019, a bancária chegou a ser internada 30 vezes.
Depressão e obesidade
Érica foi afastada do trabalho durante três anos e já não saía mais de casa com medo de ter ataques de coceira. Ela desenvolveu depressão, passou a ter crise de pânico e, com todas as medicações, engordou 40 quilos em questão de meses. O peso extra fez com que sua dor óssea se intensificasse: ela chegou a andar de bengala e cadeira de rodas.
“Eu era acompanhada por uma equipe multidisciplinar, e uma das profissionais me indicou o médico Leonardo. Quando fui visitá-lo, ele já estava com todos os meus exames em mãos e me internou de imediato”, lembra.
No dia 16 de agosto de 2021, depois de muitas idas e vindas ao hospital, Érica finalmente descobriu que o motivo de suas coceiras intensas e fraqueza muscular era uma condição rara chamada síndrome de Schnitzler.
Síndrome de Schnitzler
O médico imunologista e alergista Leonardo Oliveira, coordenador do centro de doenças raras do Hospital 9 de julho, em São Paulo, explica que a síndrome de Schnitzler é uma doença rara autoinflamatória e de causa genética.
Os sintomas são febre recorrente, lesões na pele do tipo urticária, dor óssea e aumento dos linfonodos. De acordo com Oliveira, o que causa a síndrome é um defeito multifatorial genético que faz com que o inflamassoma, um pedaço das células que tem grande capacidade de inflamação, fique desorientado e comece a secretar uma quantidade exagerada de interleucina no organismo, uma espécie de citocina inflamatória.
Quando o paciente demora a ser diagnosticado e fica sem tratamento, pode sofrer graves consequências, inclusive falência dos rins. A síndrome de Schnitzler não tem cura. O tratamento é feito por toda a vida com a administração de um medicamento capaz de inibir a interleucina.
“Depois que ela começou a tomar o remédio, os exames da Érica melhoraram de uma maneira absurda, ela nunca mais teve anemia e as inflamações do corpo se resolveram. Além disso, ela reduziu muito a quantidade de corticoide e ganhou qualidade de vida. Hoje, ela é outra pessoa, muito mais feliz”, diz Oliveira.
Mudança de vida
“Foi a partir do diagnóstico que eu passei a ter qualidade de vida”, afirma Érica. Hoje, ela vai ao hospital uma vez por mês para tomar a medicação e a frequência das crises diminuiu consideravelmente.
Com a doença sob controle, a bancária consegue dar atenção para seus filhos e marido, que por muitos anos, viveram anos turbulentos ao seu lado. Ela conta que seu filho mais novo tinha ataques de pânico quando alguém demorava a buscá-lo na escola, acreditando que algo de ruim tinha acontecido com sua mãe.
Em junho de 2022, a bancária voltou a trabalhar e, em setembro, realizou uma cirurgia bariátrica para controlar o peso acumulado durante o pico da doença. “Estou me sentindo infinitamente melhor”, finaliza.
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