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Lockdown de 3 semanas pode poupar 22 mil vidas, defendem especialistas

Em carta aberta ao presidente Jair Bolsonaro, profissionais defendem que a medida também pode reduzir média móvel de mortes por Covid-19

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Hugo Barreto/Metrópoles
lockdown comercio fechado brasília DF
1 de 1 lockdown comercio fechado brasília DF - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

Especialistas em saúde, acadêmicos e empresários divulgaram, nesta quinta-feira (1°/4), um documento no qual defendem um lockdown de três semanas para evitar 22 mil mortes em decorrência da Covid-19 em abril. Entre os 30 profissionais que assinam o texto, estão nomes como o de Pedro Hallal, epidemiologista e coordenador do Epicovid-19; Rubens Belfort Jr., presidente da Academia Nacional de Medicina; Monica de Bolle, professora da Johns Hopkins University e Acacio Sousa Lima, presidente da Academia de Ciências Farmacêuticas do Brasil.

Também assinam a carta, André Lara Resende, ex-diretor do Banco Central do Brasil (BACEN); Rubens Ricupero, ex-ministro do Meio Ambiente, da Amazônia e ex-ministro da Fazenda. Luiz Gonzaga Belluzzo, professor titular do Instituto de Economia da Unicamp e Ligia Bahia, professora Associada da UFRJ.

No documento, os especialistas se dirigem ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) bem como aos governadores e prefeitos do país. Segundo eles, três semanas de fechamento total de atividades não essenciais podem reduzir a média móvel de mortos pela metade, além de evitar a marca de 5 mil óbitos em um único dia, proporcionar tempo para a vacinação de quase todos os idosos acima de 60 anos e dificultar o surgimento de novas variantes.

As perdas econômicas poderiam ser neutralizadas caso o governo concedesse o auxílio emergencial em parcela única para indivíduos e micro e pequenas empresas, de acordo com o comunicado. Os profissionais sugerem algumas medidas nesse sentido, baseadas em estudos conduzidos pela Impulso Gov, organização brasileira de saúde pública que monitora o avanço da vacinação contra a Covid-19 no país.

Confira a íntegra do texto:

“Carta Aberta ao Presidente da República, Governadores e Prefeitos Brasileiros

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Excelentíssimos(as) Senhores e Senhoras Governadores(as),

Excelentíssimos(as) Senhores e Senhoras Prefeitos(as),

Nós, organizações, pesquisadores e especialistas de Saúde Pública, Economia e Políticas Públicas, nos unimos, hoje, para recomendar a Vossas Excelências a adoção de medidas baseadas em evidências e estudos científicos que tem como objetivo reverter o cenário de calamidade que hoje acomete o país.

O referido conjunto de medidas, intitulado “Abril pela Vida”, postula a adoção imediata de 3 semanas de lockdown, que seriam responsáveis por salvar pelo menos 22 mil vidas, acompanhado de auxílio emergencial que seria capaz de neutralizar os efeitos econômicos negativos do lockdown.

1. Contexto

A pandemia de COVID-19 tem sido responsável por retirar, diariamente, a vida de milhares de brasileiros. Na última semana, atingimos a marca de 300,000 mortos. Além disso, a pandemia tem sido responsável por sobrecarregar o sistema de saúde, hoje incapaz de atender toda a demanda de pacientes com COVID-19, bem como de tratar outras patologias.

A pandemia tem sido responsável por dilapidar, igualmente, nossa já fragilizada economia, haja vista a longa duração da crise e a desconfiança econômica dela proveniente por parte de consumidores e investidores.

Estudos desenvolvidos pela Impulso Gov, organização brasileira de saúde pública, suprapartidária e sem fins lucrativos, apontam que o avanço da vacinação no país terá impactos positivos a partir do mês de maio, podendo reduzir à metade a média móvel de óbitos no país e aliviar a pressão sobre o sistema de saúde2. Tal cenário se justifica pelas seguintes evidências:

Todas as vacinas testadas até agora mostraram alto potencial para prevenir hospitalização e morte.
Mais de 70% dos óbitos registrados no Brasil até aqui foram de pessoas acima de 60 anos.
O atual ritmo de produção nacional indica que teremos doses para vacinar quase todos os idosos (+60 anos) até o final de abril.
Todavia, para que esse cenário se torne realidade, é preciso reduzir a circulação do vírus de forma significativa e imediata. Caso contrário, podemos atingir a marca de 5 mil mortes diárias, conforme previsões de pesquisadores da Fiocruz; e podemos não ter leitos disponíveis, nem para pacientes com Covid-19 nem para aqueles com outras patologias, nas próximas semanas – cenário que infelizmente já é realidade em parte do país.

Nesse sentido, é fundamental que medidas de lockdown sejam adotadas, de forma coordenada pela União, Estados e Municípios brasileiros, pelas próximas 3 semanas com vistas a reduzir a circulação de pessoas e, assim, salvar vidas.

Estudos internacionais comprovam a eficácia da medida em 41 países, com efeito especialmente forte da redução de quaisquer aglomerações de mais de 10 pessoas; e recentemente observou-se a eficácia da medida também no Brasil. Após um mês de medidas restritivas, incluindo 10 dias de lockdown rígido como poucas vezes se viu no país, a cidade de Araraquara (SP) registrou, em 26 de março, o primeiro dia sem nenhuma morte causada por COVID-19, além de redução significativa no número de casos e da positividade dos testes.

2. Propostas

Apresentamos abaixo duas medidas emergenciais, parte da estratégia “Abril pela Vida”, com vistas a reverter o cenário atual de calamidade no país e salvar vidas.

Cientes de que as medidas de lockdown podem expor indivíduos em situação de vulnerabilidade ao risco econômico e reduzir a sua adesão às medidas, propomos soluções econômicas emergenciais que podem ser adotadas pelos três níveis de governo, com vistas a reduzir os impactos negativos que a menor circulação de pessoas pode ter sobre populações vulneráveis e, igualmente, sobre as economias locais.

a. Lockdown rígido em abril

Proibição de eventos presenciais como shows, congressos, atividades religiosas, esportivas e correlatas, bem como quaisquer aglomerações de indivíduos que não residem juntos.
Toque de recolher das 20h às 6h.
Fechamento de bares, restaurantes e praias.
Medidas de redução da superlotação nos transportes coletivos urbanos; transportes de trabalhadores dos serviços essenciais devem ser organizados pelas empresas, inclusive supermercados, farmácias e postos de gasolina.
Suspensão do funcionamento dos seguintes estabelecimentos: comércio atacadista, lojas de material de construção civil, casas de peças e oficinas de reparação de veículos automotores, comercialização de produtos e serviços de cuidados animais (permitido o funcionamento de clínicas médicas veterinárias e comercialização de alimentos), agências bancárias (permitindo o atendimento presencial para recebimento de benefícios) e instituições financeiras de fomento econômico, casas lotéricas; e atividade de pesca de lazer no mar (permitida a pesca comercial).
Adoção de trabalho remoto sempre que possível.
Instituição de barreiras sanitárias nacionais e internacionais, inclusive considerando fechamento de aeroportos e transporte interestadual.
Os hotéis e pousadas com capacidade de ocupação limitada a 30% dos quartos.
Ampliação de testagem e acompanhamento dos testados, com isolamento de casos suspeitos e monitoramento dos contatos.
b. Auxílio emergencial de parcela única

Concessão de parcela única de auxílio emergencial, para indivíduos e micro e pequenas empresas.
O valor do benefício seria: – Para indivíduos, equivalente ao valor médio de uma cesta básica em cada estado. – Para micro e pequenas empresas, no valor de mil reais.
Critérios de elegibilidade: ̵ Indivíduos: maiores de idade, desempregados ou informais, que não recebem aposentadoria, Benefício de Prestação Continuada, Seguro Desemprego ou qualquer outro programa social (exceto Bolsa Família) e tem rendimento domiciliar per capita abaixo de meio salário mínimo. – Micro e pequenas empresas: para setores mais afetados pela pandemia (Alojamento, Alimentação e Atividades Artísticas, Criativas e de Espetáculos) para empresas do Simples Nacional e MEIs.
Estima-se que, considerando todos os estados brasileiros, seriam 67 milhões de indivíduos elegíveis e 3,3 milhões de estabelecimentos beneficiados; os números exatos por estado estão disponíveis sob demanda.
Seriam necessários cerca de R$ 36 bilhões para financiar o auxílio para indivíduos e R$ 3,3 bilhões para as pequenas e micro empresas. Este programa, que, além de permitir a adoção das medidas restritivas, teria o efeito de neutralizar as perdas geradas pelo lockdown; números por estado estão disponíveis sob demanda.
3. Resultados esperados

A adoção da estratégia “Abril pela Vida” permitirá aos Governos e Municípios observar os seguintes resultados:

1. Reduzir a média móvel de mortos pela metade, o que pode significar pelo menos 22 mil vidas salvas;

2. Dispor de leitos para tratamento de COVID-19 e de outras patologias;

3. Reduzir a probabilidade de surgimento de novas variantes, capazes de superar a imunidade gerada pelas vacinas já desenvolvidas, com consequências globais desastrosas;

4. Neutralização de perdas econômicas, em razão do auxílio emergencial.

Sem a adoção das medidas supracitadas, teremos pelo menos 22 mil mortes adicionais, e podemos nos deparar com o surgimento de novas variantes, além de acentuarmos a crise de saúde pública e falta de leitos de UTI. A inação, além de causar impactos severos sobre o nosso sistema de saúde, exigirá medidas restritivas por mais tempo, e trará impactos econômicos ainda mais severos. A redução prolongada da atividade econômica por mais de quatro meses poderá anular completamente as possibilidades de crescimento econômico previstas para 2021.

À luz do exposto, e haja vista a competência dos Governos Federal, Estadual e Municipal para adotarem medidas eficazes no combate à pandemia, recomendamos aos Municípios, Estados e à União que adotem as medidas supracitadas, em esforço coletivo e coordenado para reverter o avanço da pandemia de COVID-19 no Brasil, salvando milhares de vidas e socorrendo a economia brasileira.

Caso se faça necessário, estamos à disposição para esclarecer eventuais questionamentos de Vossas Excelências, compartilhar estudos técnicos e simulações que embasaram as propostas aqui presentes e apresentar possibilidades de financiamento do auxílio, além de apoiar, individualmente, os Estados e Municípios na adequação e implementação imediata das medidas propostas ao contexto local.

Respeitosamente,

Impulso Gov

Vital Strategies Brasil

Acacio Sousa Lima, Presidente da Academia de Ciências Farmacêuticas do Brasil

Adriano Massuda, Médico Sanitarista, Professor e Pesquisador da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EAESP-FGV) e da Universidade Federal do Paraná

Ana Luiza Bierrenbach, Professora da Pós-Graduação do Instituto de Ensino e Pesquisa do hospital Sírio-Libanês e da Universidade Federal de Goiás

Ana Maria Malik, Professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), coordenadora do GVSaúde e membro do conselho da Associação Latina Para Análise dos Sistemas de Saúde (ALASS)

André Lara Resende, Ex-diretor do Banco Central do Brasil (BACEN) e Ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)

Andre Portela Souza, Professor de Economia da EESP-FGV

Fátima Marinho, Professora da Pos-Graduação em Saúde Pública da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Gabriela Spanghero Lotta, Professora e Pesquisadora de Administração Pública e Governo da Fundação Getúlio Vargas (FGV)

Guilherme Werneck, Pesquisador e Professor do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IMS/UERJ) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Hannah Arcuschin Machado, Gerente de Projetos da Vital Strategies

João Moraes Abreu, Diretor Executivo da Impulso Gov

Ligia Bahia, Professora Associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Luciano Coutinho, Professor titular no Instituto de Economia da UNICAMP e Ex-Presidente do BNDES

Luis Eugenio de Souza, Professor do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Vice-presidente da Federação Mundial de Associações de Saúde Pública (WFPHA)

Luiz Carlos Bresser-Pereira, Professor Emérito da Fundação Getúlio Vargas

Luiz Gonzaga Belluzzo, Professor Titular do Instituto de Economia da Unicamp (Aposentado)

Luiza Dickie Amorim, Consultora da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health

Manoel Pires, Pesquisador do IBRE/FGV e da UnB. Ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda

Marcelo Medeiros, Professor da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)

Márcia Castro, Doutora em Demografia e Professora Associada da Harvard School of Public Health

Marco Brancher, Coordenador de Dados da Impulso Gov e Pesquisador da FGV

Maria Amelia de Sousa Mascena Veras, Professora Adjunta do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

Monica de Bolle, Professora da Johns Hopkins University

Nelson Gouveia, Professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP)

Nelson Marconi, Professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (EAESP-FGV)

Naomar de Almeida Filho, Professor de Epidemiologia e ex-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA)

Paulo José da Silva e Silva, Professor de Matemática Aplicada da Universidade Estadual de Campinas e Pesquisador do Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria.

Paulo Schor, Médico, Professor e Diretor de Inovação da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)

Paulo Saldiva, Professor Titular de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP)

Pedro do Carmo Baumgratz de Paula, Professor da FGV Direito SP (FGVLaw) e Diretor-Executivo da Vital Strategies Brasil

Pedro Hallal, Epidemiologista, Professor da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e coordenador do Epicovid-19

Rubens Belfort Jr., Presidente da Academia Nacional de Medicina

Rubens Ricupero, Ex-Ministro do Meio Ambiente, da Amazônia e Ex-Ministro da Fazenda.

Soraya Smaili, Reitora da Universidade Federal de São Paulo

Vanessa Elias de Oliveira, Professora de Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC (UFABC)”

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