Aluno com epilepsia instala protocolo contra crises na universidade
Lucas Liandro sofre com epilepsia e ajudou a instalar o método CALMA, que ensina alunos e professores a lidar com crises convulsivas
atualizado
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A epilepsia é um distúrbio cerebral que causa crises convulsivas espontâneas caracterizadas pela atividade elétrica excessiva e sincronizada do cérebro. A condição pode trazer impactos significativos na vida diária do paciente, como problemas de memória, sono e até depressão e ansiedade.
Para o estudante Lucas Liandro, 27 anos, de Goiânia, a principal consequência das crises de epilepsia é a dificuldade de lembrar dos conteúdos estudados na infância. “Na vida social, foi um problema me relacionar com as pessoas, ir ao cinema era ruim e até escutar música era um desafio”, afirma.
A doença também afetou a vida profissional de Lucas, que foi demitido de alguns empregos por causa da epilepsia. “Sempre me despediam com o discurso de que eu precisava me cuidar, descansar, que não seria o melhor momento para trabalhar e que eu devia priorizar minha saúde”, revela.
Embaixadora da Associação Brasileira de Epilepsia (ABE), Aline Pansani pontua que a epilepsia é um problema que afeta 1% da população mundial, e as razões de seu desenvolvimento ainda necessitam de mais pesquisas. “Traumas, lesões cerebrais, infecções, problemas durante o parto e até fatores genéticos podem causar a condição. Essas situações podem criar regiões no cérebro que geram as crises”, explica.
Epilepsia impedia de estudar
A primeira lembrança de crise de Lucas foi aos 12 anos, quando ele não tinha o diagnóstico e sua família não sabia o que era epilepsia. O conhecimento da condição só veio aos 16 anos.
“Foi uma surpresa, pois eu não sabia o que era. E, ao mesmo tempo, um alívio, já que antes eu sofria sem saber como lidar e tratar de forma adequada”, desabafa o estudante.
Porém, mesmo com a identificação do distúrbio, Lucas teve de passar por muita burocracia na rede pública para conseguir os medicamentos que controlam as crises. “Hoje, tenho fácil acesso aos remédios pelo SUS, mas foi um desafio. Ainda que eu tivesse o diagnóstico em mãos, os médicos me pediam mais e mais exames, o que levava muito tempo”, pontua.
Até começar o tratamento de fato, Lucas teve várias crises e precisou parar de estudar. “Saí da escola no ensino médio por causa da epilepsia. Mas, com a aprovação no Enem, consegui o certificado de conclusão e veio a possibilidade de ingressar na Universidade Federal de Goiás (UFG)”, conta o estudante de Artes Visuais.
CALMA
Na UFG, ele conheceu Aline e, juntamente com ABE, fez parte da instalação de um guia de protocolo para apoio em primeiros socorros de crise convulsiva na universidade. O C.A.L.M.A significa:
- Coloque a pessoa de lado, com a cabeça elevada, para que ela não se sufoque com a saliva;
- Apoie a cabeça da pessoa para proteção em algo macio, como mochilas, blusas, jalecos;
- Localize objetos que possam machucar a pessoa, como óculos, correntes, móveis e roupas apertadas, e afaste-os;
- Monitore o tempo. Caso a crise dure mais que 5 minutos ou aconteça outra logo após a primeira, ligue para o Samu (192);
- Acompanhe a pessoa até ela acordar. Em caso de ferimentos ou se for a primeira crise, ligue para o Samu.
“Participei indicando quais necessidades a universidade poderia atender para ajudar quem tem epilepsia. Isso foi útil na formulação do protocolo institucional”, conta Lucas.
A intenção é levar maior segurança e conhecimento para lidar com crises dentro do ambiente acadêmico, onde alguns gatilhos podem desencadeá-las. Muitas vezes, outros alunos e professores não sabem como agir diante do episódio convulsivo.
Inicialmente, foram feitas atividades de conscientização, palestras e campanhas de esclarecimento sobre as crises no campus. Após alguns casos de episódios convulsivos em sala de aula, a equipe decidiu criar um protocolo para ajudar alunos com a condição.
Aline explica que o CALMA foi implementado na UFG para educar sobre a epilepsia e instruir sobre os primeiros socorros. “A ação incluiu lives, campanhas no hospital e palestras para professores e alunos, visando à conscientização e à criação de um ambiente mais seguro e acolhedor para quem tem epilepsia”, afirma.
“Quero conquistar tudo o que for possível”
Lucas comemora a oportunidade de conscientizar as pessoas de seu ciclo social sobre a epilepsia — assim, não serão pegos de surpresa quando alguém próximo precisar de ajuda. “Percebo que já melhorei bastante e hoje consigo falar abertamente sobre o assunto, reivindicar meus direitos e buscar formas de melhorar minha rotina”, diz.
“Não é fácil, nunca foi nem será. Lidar com a epilepsia é um mix de sensações e desejos que hoje são mais fáceis de acessar, pois tenho a ajuda da minha família, da universidade e do meu trabalho. Enquanto eu estiver bem, quero conquistar o que for possível”, conclui Lucas.
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