“Luto todos os dias da minha vida”, diz engenheira com lúpus e nefrite
Mariana se preparava para o vestibular quando começou a sentir dores nas articulações, que são um dos sintomas do lúpus
atualizado
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A engenheira civil Mariana Scheffer Cavanha, de 30 anos, foi diagnosticada com lúpus há 13 anos. Desde então, a doença afeta a vida dela diariamente.
Entre os 17 e 18 anos, Mariana começou a notar que seus dedos estavam frequentemente arroxeados. Depois passou a ter febre e a sentir um cansaço extremo. No início, os médicos atribuíram os sintomas ao estresse provocado pelo vestibular.
Convencida de que a causa dos sintomas não era emocional, ela começou a pesquisar seus sintomas na internet e se deparou com a possibilidade de estar com lúpus.
As informações da rede levaram a jovem até um reumatologista, que após exames de sangue e análise clínica, deu o diagnóstico da doença autoimune.
“Minha mãe acha que desenvolvi a doença antes, por volta dos 15 anos, pois tinha crises de enxaqueca muito fortes. Mas, de fato, a gente procurou um médico quando eu estava com 18 anos. Naquele momento, os sintomas começaram a crescer. Acredito que minha mãe está certa. O lúpus, provavelmente, me acompanhou por mais tempo do que imagino”, lembra Mariana.
De lá para cá, ela passou por diversos tipos de tratamento, incluindo o uso de imunossupressores e corticoides. A doença também atacou o coração, o pulmão e os rins da jovem, levando-a a uma inflamação crônica do órgão chamada de nefrite.
“Cheguei a pesar 45 quilos e ficar muito debilitada. Já fiquei sem andar por causa da artrite (inflamação nas articulações). É uma doença muito chata e debilitante. Por 10 anos, o rosto que eu tinha era o rosto de quem tomava muito corticoide, e hoje tenho osteoporose por causa desse excesso”, relata.
Mariana conta que é muito difícil controlar a doença, pois o lúpus é bastante ligado ao estresse, e qualquer aborrecimento pode ser um gatilho para ativá-lo. “Afeta até o ciclo social. Você tem 19 anos e não vai a lugar nenhum porque está cansado, e você vira a pessoa chata, porque nunca quer sair por estar sempre cansada. As pessoas não entendem e você vai perdendo os amigos”, lamenta.
A engenheira conta que não pode se expor ao sol pois esse também é um gatilho para a doença. Hoje ela toma imunossupressor, imunorregulador e muita vitamina D. Para trabalhar, o esforço é sempre em dobro, pois ela convive com fortes dores nas articulações diariamente.
“Alguns dias estou com muita dor pra levantar da cama e ir trabalhar, mas sei que se eu ficar, será pior. Tenho de lutar todos os dias da minha vida. Faço uma escolha porque ou eu enfrento ou tenho de me encher de medicamento. Fiz um combinado com meus médicos para evitar ao máximo os medicamentos”, desabafa Mariana.
A doença a obriga a fazer exames constantemente, seja por uma ferida que não cicatriza, ou por uma urina que de repente aparece espumosa.
Lúpus eritematoso sistêmico (LES)
O lúpus eritematoso sistêmico é uma doença autoimune: o sistema imunológico do paciente ataca erroneamente os tecidos saudáveis, deixando o corpo em estado permanente de inflamação. É uma doença crônica, que vem em surtos, e não tem cura, apenas controle.
O reumatologista Edgard Reis, coordenador da Comissão de Lúpus da Sociedade Brasileira de Reumatologia, explica que a doença causa um grande impacto na vida do paciente. “O paciente se preocupa com o cansaço ou uma nova lesão de pele que apareceu. Então, acredito que a maneira de equalizar seja ouvir cada vez mais o paciente e suas demandas, compartilhar decisões e trazer o paciente para o centro do tratamento”, explica Edgard.
O diagnóstico é complexo devido à variabilidade de órgãos que podem ser acometidos. Não existe um exame específico o que, muitas vezes, deixa a situação do paciente em suspenso, atrasando o início do tratamento.
Os métodos que auxiliam no diagnóstico incluem histórico médico e exame físico, testes de autoimunidade, exames de urina e de avaliação renal e exame de sangue. Também pode ser necessário realizar uma biópsia de pele ou dos rins, em alguns casos.
Apesar de ser muito mais frequente em mulheres entre os 12 e os 50 anos, também pode acometer pessoas do gênero masculino, além de crianças e idosos. Os sintomas do lúpus variam muito entre os indivíduos, mas os mais comuns incluem:
- Dor ou inchaço nas articulações;
- Dores musculares;
- Erupções cutâneas, especialmente uma erupção em forma de borboleta no rosto;
- Fadiga extrema;
- Perda de cabelo;
- Úlceras na boca;
- Dor no peito ao respirar profundamente;
- Linfonodos aumentados;
- Inchaço, pressão alta;
- Anemia, facilidade de sangramento.
“O tratamento envolve o uso de medicamentos que ajudam a equilibrar o sistema imune, incluindo o uso de imunossupressores, corticosteroides, e, em casos específicos, agentes imunobiológicos, de acordo com a gravidade e a atividade da doença”, explica o reumatologista.
A nefrite que Mariana desenvolveu é chamada nefrite lúpica, e é uma complicação grave da doença. “A nefrite lúpica pode levar à falência renal se não tratada. Nos casos mais graves, ela pode se apresentar com edema, pressão alta, sangue na urina”, esclarece o nefrologista Gabriel Montezuma, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Desafio no tratamento dos pacientes
O médico diz que o tratamento do lúpus e nefrite lúpica geralmente envolve o uso de corticoides para reduzir a inflamação e de imunomoduladores, para regular a resposta imunológica do corpo. Além de diversos imunossupressores para controlar as crises.
O grande desafio é que há uma diversidade de sintomas e o uso dos corticoides e imunossupressores causa efeitos colaterais. É necessário que seja feito um controle para evitar complicações a longo prazo.
“É importante que o paciente siga o tratamento indicado pelo médico. E para isso, é preciso estar atento aos horários dos medicamentos para que não haja esquecimento, além de ser muito importante não interromper o tratamento após a melhora dos sintomas, pois isso pode agravar o lúpus e a nefrite lúpica ao longo prazo”, alerta Gabriel.
Os medicamentos para tratamento de nefrite mais modernos não estão disponíveis na rede pública, e nem fazem parte da cobertura das operadoras de saúde. Para mudar esse cenário, até o dia 25 de junho, a Agência Nacional de Saúde Suplementar está conduzindo uma consulta pública para ouvir a sociedade sobre a inclusão do belimumabe no rol de remédios incorporados pelos planos.
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