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Irmãos sofrem com doença rara que torna a vitamina B12 tóxica

Doença rara leva à dificuldade do corpo em processar a vitamina B12 e pode causar cegueira, comprometimentos musculares e até morte

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Acervo pessoal
Foto mostra irmãos Lucas e Alexandre, ambos tem uma doença genética rara que os impede de processar a vitamina b12
1 de 1 Foto mostra irmãos Lucas e Alexandre, ambos tem uma doença genética rara que os impede de processar a vitamina b12 - Foto: Acervo pessoal

Quando tinha apenas 22 dias de vida, o pequeno Alexandre Guedes Bisneto teve de lutar pela própria vida. Quem o vê hoje em dia, aos 8 anos, não imagina que ele quase não sobreviveu ao primeiro mês de vida por conta de uma doença rara.

Ainda recém-nascido, Xandinho, como é chamado pela família, foi internado às pressas e precisou fazer uma viagem de UTI aérea de Salvador (BA) a São Paulo.

“Foi terrível viver tudo aquilo. O meu filho não ganhava peso de jeito nenhum. Faziam as transfusões de plaquetas para ele conseguir pelo menos ir para a UTI aérea e, nem assim, ele tinha estabilidade. Foram dias de apreensão e medo”, lembra a mãe dele, a jornalista Luana Brito.

A criança tem uma doença genética chamada acidemia metilmalônica com homocistinúria (AMH-CblC). Trata-se de um distúrbio do metabolismo para a vitamina B12, que se torna ácida e tóxica ao organismo. O defeito no processamento da B12 pode matar ou deixar graves consequências, se não for controlado.

Foto mostra irmãos Lucas e Alexandre, ambos tem uma doença genética rara que os impede de processar a vitamina b12
Família não conhecia a condição na época do nascimento de Xandinho, que quase morreu devido à doença

A doença que quase matou Xandinho

A AMH ocorre em média em uma criança a cada 70 mil nascidas. “Como essa mutação ocorre no cromossomo X, a chance de meninos terem a doença é maior, já que eles possuem apenas um cromossomo desses”, explica a geneticista Amanda Shinzato, da empresa de diagnósticos Igenomix Brasil.

Os sintomas variam de gravidade a depender da velocidade em que a doença leva à intoxicação. “Os indivíduos afetados podem apresentar comprometimentos neurológicos e oculares, letargia, convulsões e anemia megaloblástica, com a diminuição das plaquetas”, resume a especialista.

A AMH pode ter início precoce ou tardio, levando em conta o primeiro ano de vida como marco temporal. Quanto mais cedo os sintomas se manifestam, maior tende a ser a gravidade do caso.

Uma luta ao nascer

No caso de Xandinho, os primeiros sinais surgiram dez dias após o nascimento. “Eu era uma mãe de primeira viagem, mas já estranhava o comportamento dele. Achava ele muito molinho, não acordava pra mamar, os bracinhos não se flexionavam e ele ficava sempre quietinho no berço”, lembra Luana.

Apesar de achar o bebê apático, Luana só percebeu a gravidade da situação quando notou que, ao redor dos 17 dias de vida, Xandinho começou a perder peso e, por mais que mamasse, não parecia com energia suficiente.

“Fui ficando extremamente angustiada com tudo aquilo. Quando ele completou 22 dias, depois de dias de perda de peso seguidos, levei meu filho ao pronto-socorro. Naquele mesmo dia, ele foi internado”, conta a mãe.

Xandinho tinha níveis muito baixos de plaquetas, as células responsáveis pela coagulação sanguínea. As transfusões de plaquetas que começaram a ser feitas aumentavam os índices da criança por umas poucas horas.

Fizeram uma ressonância magnética no bebê que revelou que ele tinha uma hidrocefalia grave, com muito acúmulo de líquido no crânio. Durante a internação, também constaram que o menino tinha uma infecção generalizada, mas nada indicava o que poderia causar aquilo.

Os médicos conseguiram identificar uma acidose metabólica, um acúmulo de ácidos no corpo, mas tampouco entenderam a origem. Para investigações mais complexas, o bebê foi transferido de UTI aérea para São Paulo.

Foto mostra irmãos Lucas e Alexandre, ambos tem uma doença genética rara que os impede de processar a vitamina b12
Os dois irmãos possuem doença que torna a vitamina B12 tóxica em seus organismos, mas estão com os sintomas controlados

O tratamento

Internado no Hospital Albert Einstein, Xandinho foi submetido a um tratamento de emergência. Antes mesmo de o diagnóstico ser fechado, a equipe médica começou a dar ao garoto um remédio que combatia a AMH.

“O médico que nos atendeu lembrou de um caso semelhante que já tinha visto. Ele disse, se não for o que estou pensando, a gente suspende o tratamento. A experiência prévia do médico nos salvou”, conta a mãe.

O tratamento da AMH é feito através da suplementação com injeções de vitamina B12 processada e ácido fólico. “Dependendo de como ela age no corpo, pode ser necessário o acompanhamento médico especializado para tratamento e manejo dos sintomas”, conta Shinzato.

Segundo a mãe de Xandinho, a injeção intramuscular de administração diária é extremamente dolorosa, mas, acompanhada de remédios orais para o equilíbrio metabólico, ela leva a uma melhora em poucos dias.

Naquele primeiro momento, também foi feita uma cirurgia para drenar o líquido que estava acumulado no cérebro do garoto. O passo seguinte foi iniciar uma jornada para entender os problemas cardíacos e oftalmológicos associados à AMH.

“O prognóstico era muito ruim. Os médicos achavam que ele teria uma perda na visão ou, até mesmo, deixaria de enxergar. Também cogitaram sequelas graves neurológicas. A gente não sabia o quanto isso poderia ter afetado meu filho e o que iria acontecer no desenvolvimento dele. Mas o tempo foi passando, a gente foi se organizando dentro do que era necessário e ele foi se desenvolvendo da melhor maneira possível”, comemora Luana.

Lucas: uma nova chance

Já conhecendo as origens da AMH e os impactos que a doença, Luana e o marido, Alexandre Guedes Neto, decidiram aumentar a família, mas dessa vez com um planejamento reprodutivo.

A fertilização in vitro (FiV) é o método mais recomendado pelos geneticistas para a reprodução de casais que têm risco aumentado de doenças genéticas raras.

No caso de Luana e Alexandre, eles não conseguiram ter sucesso com este método. Em abril de 2020, ela engravidou naturalmente e começou a tomar injeções de B12 para evitar o aparecimento da doença.

A menina que ela estava esperando não tinha a AMH, como demonstraram exames de coleta do líquido amniótico. Entretanto, a bebê sofreu uma parada cardíaca fetal faltando apenas dois dias para o parto. “Foi uma tristeza profunda”, conta.

Ela engravidou novamente após sete meses, também naturalmente. Como antes, Luana fez o tratamento com injeções de B12 e o mesmo teste que já tinha feito, descobriu que seu terceiro bebê tinha a AMH.

“Como é uma doença que aumenta o risco de hidrocefalia e morte, me perguntaram se eu queria seguir com a gestação. Eu decidi continuar, fazendo aplicações de vitamina todos dos dias desde a quinta semana”, conta.

Lucas, o segundo filho, tomou sua primeira injeção de vitamina B12 ainda na sala de perto e nas primeiras 24 horas de vida já começou a tomar os remédios que já faziam parte da rotina do irmão. Betaína anidra, ácido folínicol e l-carnitina passaram a fazer parte da rontina da família.

“O Lucas vai fazer 2 anos e nunca apresentou os sintomas da doença, tem um desenvolvimento absolutamente normal. Para a gente, é uma experiência e tanto de vida controlar uma doença que sempre foi tratada como um carma inevitável. Estamos todos surpresos e muito felizes”, conta Luana.

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