Diabetes tipo 1 caminha para ser considerada uma deficiência. Entenda
Tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei para reconhecer a diabetes tipo 1, uma síndrome metabólica congênita, como deficiência
atualizado
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Se seu filho dependesse da aplicação diária de injeções para viver sem sequelas de saúde, às vezes até cinco doses ao dia, como você se organizaria para garantir este acompanhamento? Esta é a realidade de pais de crianças com diabetes mellitus tipo 1 (DM1), que obriga muitos a pararem de trabalhar para cuidar de seus filhos. A luta deles é para que a condição seja reconhecida como uma deficiência física.
“No geral, o cuidado acaba ficando como responsabilidade das mães. A gente tem que acompanhar de perto a alimentação e aplicar os remédios para o resto da vida. Não podemos descuidar”, conta a dentista Adriana Santos, mãe de Henrique, 6 anos, que tem diabetes diagnosticada desde os 4.
O menino já chegou a registrar níveis glicêmicos abaixo de 50 e acima de 300, quando a quantidade ideal de açúcar no sangue deve ficar entre 100 e 140 mg/dl. Esta regulação é conseguida naturalmente pelo corpo pela ação da insulina, um hormônio produzido pelo pâncreas que abre as portas da célula para que a glicose entre.
A diabetes tipo 1 é uma doença autoimune em que o pâncreas produz insulina insuficiente e manifesta seus primeiros sinais, em geral, na infância e na adolescência. Para regular os níveis deste hormônio em pessoas com DM1, se utilizam duas insulinas, a basal (que tem ação prolongada ao longo do dia) e a rápida (após refeições para evitar que alimentos levem a picos glicêmicos).
Sem controle, a DM1 pode levar a severas complicações, já que a glicose circula pelo sangue sem conseguir entrar nas células e intoxica o organismo. No curto prazo, há sintomas de fadiga, dificuldade de enxergar, formigamento e dor de cabeça. Com o tempo, sem a regulação da insulina, o alto nível de açúcar no sangue aumenta o risco de morte e de amputações.
A maioria das pessoas com diabetes no Brasil possui o tipo 2, que é adquirido ao longo da vida, especialmente pelos hábitos alimentares. Pacientes com DM1 representam menos de 10% do total — ainda assim, o Brasil é o terceiro país no mundo em casos absolutos da doença, com 564 mil casos.
Diabetes tipo 1 como deficiência física
Por isso, cresce o número de pessoas que defende que a DM1 passe a ser considerada uma deficiência física. Estados Unidos, Reino Unido, Espanha e Alemanha são alguns dos países que já incluem a diabetes tipo 1 entre as deficiências.
Para as famílias, o reconhecimento como deficiência permitirá aos pacientes com DM1 exigirem horários especiais no trabalho e na escola para fazer as aplicações de insulina com segurança. Além disso, o status permite que as famílias entrem com pedido de auxílio financeiro para custear afastamentos temporários para cuidado de pacientes (nos casos dos responsáveis) e também para a compra de equipamentos de saúde.
A médica Solange Travassos, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), ela mesma uma paciente com a condição, confirma a importância da troca de status da diabetes tipo 1.
“É uma doença sem cura e sem prevenção possível que pode gerar grandes desvantagens e limitações. As pessoas com diabetes tipo 1 precisam aplicar a insulina constantemente, várias vezes ao dia, então é preciso garantir que existam insumos para atender essas necessidades específicas a qualquer momento. A proteção das pessoas com diabetes é uma questão de vida”, defende.
Para Adriana, o reconhecimento da deficiência ajudará as famílias a fazer este cuidado. “Não é privilégio, é uma real necessidade e um direito que meu filho e tantas outras crianças e adultos têm para conseguirem qualidade de vida. É uma deficiência física que traz limitações e precisa ser avaliada com cuidado”, explica.
Solange ressalta que, para o estudante com diabetes, o cenário nas instituições de ensino é ainda mais complicado. “Muitas vezes, a criança fica fora da escola ou os pais precisam parar de trabalhar para garantir a aplicação correta da insulina, já que não podemos deixar essa responsabilidade com os pequenos”, completa Solange.
Além disso, indivíduos com diabetes tipo 1 não podem consumir a mesma alimentação dos demais, já que correm risco com o pico dos níveis de açúcar no sangue. Outra dificuldade é em provas de concurso, onde, muitas vezes, eles não podem aplicar insulina durante o teste.
Mudança está próxima
Essa mudança está mais próxima de ocorrer no Brasil do que nunca. Em 2023, a Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou o reconhecimento legal da DM1 como deficiência. O projeto de lei foi enviado para a Comissão de Saúde da Casa, que deve apreciar o projeto a partir de fevereiro.
Caso aprovado, ele irá à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), sem precisar passar pelo plenário para aprovação definitiva da Câmara. Após este rito, o projeto segue para o Senado e, eventualmente, para a sanção presidencial. Não há prazo para que todas estas decisões sejam tomadas.
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