Afinal de contas, crossfit lesiona mais que outros exercícios?
Imperícia dos praticantes e busca pelo desafio são fatores que podem levar a acidentes em atividades além do crossfit, dizem especialistas
atualizado
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Apesar da popularidade, a fama de que o crossfit lesiona mais e com mais gravidade do que outras atividades físicas é disseminada na sociedade. Se você já fez a atividade alguma vez, certamente ouviu alguém te pedindo cuidado. A realidade, porém, não é tão simples, nem tão grave.
Especialistas ouvidos pelo Metrópoles destacam que sim, crossfit pode lesionar, mas os acidentes durante a prática não são mais frequentes do que em outros exercícios físicos.
O ortopedista André Pedrinelli, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício do Esporte (SBMEE) e diretor da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (Sbot), aponta que por se basear no desafio de superar limites pessoais, o crossfit pode favorecer lesões, mas não a ponto de tornar o esporte perigoso.
“A prática segura de qualquer atividade física depende de dois fatores que se equilibram em uma balança. De um lado, temos o indivíduo com seu condicionamento e histórico de saúde. Do outro, o perfil da prática e seus impactos. Quando há um desequilíbrio no que exigimos do corpo e o que ele pode fazer, temos uma lesão”, pondera.
Afinal, crossfit lesiona mais?
É difícil comparar de forma justa práticas diferentes de esporte e a proporção de lesões que elas causam. Pelas exigências musculares particulares de cada exercício, eles facilitam a formação de lesões distintas. Um exemplo são os machucados causados pelo futebol e pela ginástica artística.
Para criar um critério aproximado, as pesquisas usam um índice de acidentes a cada mil horas. Este número inclui, na maioria das investigações, apenas machucados traumáticos (como quedas e rompimentos), sem levar em consideração lesões por sobrecarga geradas pelo desgaste repetitivo.
A cada mil horas de prática do crossfit, foram registradas entre 3 a 3,4 lesões, de acordo com estudo publicado no Journal of Strength and Conditioning Research em 2013. É mais do que o índice da musculação — que conta com menos de 0,5 lesão no mesmo intervalo de tempo, segundo pesquisa divulgada na revista Sports Medicine em 2017.
Porém, o índice do crossfit é semelhante ao de levantadores de peso, por exemplo.
Os especialistas creditam as lesões especialmente a quatro fatores:
- Imperícia dos praticantes;
- Espírito de desafio do crossfit;
- Alta intensidade e diversidade de trabalho muscular da prática;
- Disseminação da prática, que faz com que o nome seja usado por estabelecimentos pouco idôneos.
“Exercícios realizados sem a devida orientação de um profissional e sem o praticante respeitar o processo de aprendizado podem sim ser lesivos, assim como com qualquer outra modalidade que envolva movimentos complexos e intensos”, resume o preparador físico e treinador nível 3 de crossfit Miguel Leite, da consultoria Nexus Saúde e Performance.
O cardiologista Rodrigo Jasbick, nível 2 (a graduação máxima é 4), aconselha a quem está interessado na prática focar no bem-estar e não no próprio ego ou em competições sem propósito.
“Toda atividade física faz parte de um processo. Não somos atletas, devemos entender que o aperfeiçoamento do movimento é um processo lento, mas não há contraindicações para a prática. Eu mesmo prescrevo crossfit para meus pacientes obesos, hipertensos, diabéticos: a prática é para todos quando bem acompanhada”, aponta.
Existem exercícios mais perigosos no crossfit?
Embora todos concordem que a prática não é perigosa em si (o risco está na execução mal feita), alguns exercícios podem levar a maiores riscos de lesão.
“Recomendo um cuidado especial com exercícios de alta complexidade para todos os crossfiteiros, mesmo os mais experimentados. Snatches (arrancadas), clean and jerks (arremesso com barra), muscle ups (subir a barra fixa) e handstands (paradas de mão) são bons exemplos. Todos eles requerem tempo de prática e dedicação no refino da técnica”, explica Leite.
O ortopedista Luciano Miller, do Hospital Albert Einstein em São Paulo, também faz recomendações quanto à importância de respeitar o período de descanso. “Quando você resolve fazer um exercício com uma alta performance, você tem que descansar. Tem trabalhos que mostram que quando você faz atividades esportivas repetitivas sem descanso, você tem mais chances de causar lesões. Além disso, é preciso repor as calorias gastas com uma dieta mais equilibrada”, explica.
Benefícios do crossfit
Jasbick é dono do perfil “Seu médico faz crossfit” no Instagram, e credita à prática o controle de seu quadro de hipertensão. “Eu era um homem sedentário de 40 anos que já tomava três comprimidos ao dia para controlar a pressão arterial. O condicionamento físico me permitiu não precisar mais usar os remédios”, lembra.
Segundo o cardiologista, a prática, quando bem executada e acompanhada, traz inúmeros benefícios: ajuda no condicionamento físico geral e melhora a resistência e a definição corporal a partir de um exercício que recruta, em simultâneo, membros superiores, inferiores e core. “Crossfit dói, sim, mas é a dor dos calos sendo feitos nas mãos e da musculatura crescendo e se fortalecendo”, brinca ele.
Crossfit é uma marca ou é um modelo de treino?
O crossfit é uma prática de resistência física combinada com levantamento de peso. Ela foi criada pelo preparador físico Greg Glassman em 2000 e é uma marca, com venda de produtos licenciados e treinamento de profissionais, ao mesmo tempo que combina exercícios e ferramentas que podem ser replicados em diversos espaços.
Por isso, há boxes de crossfit que são licenciados pela marca (mais caros, porém com mais exigências na formação dos profissionais) e outros que adaptam o modelo original de forma mais livre.
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