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Compra de vacinas da Covid-19 por empresas oficializa “fura-fila”, dizem especialistas

A compra de doses por empresas ou clínicas particulares deve impactar no acesso público e gratuito da população aos imunizantes disponíveis

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1 de 1 carrinho de compras com seringas compra de vacina covid coronavírus - Foto: Getty Images

A compra de vacinas contra a Covid-19 por empresas e clínicas privadas vem causando polêmica. Nesta quarta-feira (27/1), a Associação Brasileira das Clínicas de Vacina (ABCVAC) fechou um acordo para comprar 5 milhões de doses da vacina indiana Covaxin, criada pelo laboratório Bharat Biotech. No início da semana, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) defendeu a aquisição de 33 milhões de doses da vacina desenvolvida pela Oxford/AstraZeneca por empresas privadas, que administrariam parte das vacinas em seus funcionários e doariam a outra metade ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Especialistas alertam, contudo, que a venda de imunizantes pode atrapalhar o andamento do plano nacional de imunização contra a Covid-19. De acordo com Juarez Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), a negociação de vacinas fora do âmbito governamental pode desencadear uma competição no mercado por um produto que já está escasso, não só no Brasil, mas no mundo inteiro. “Por que o governo não compra essas vacinas que estão sendo negociadas pelas empresas para incluir no Programa Nacional de Imunizações (PNI), que é uma campanha que já engloba grupos prioritários?”, questiona.

A imunização dentro de empresas pode até fazer com que o funcionário fique protegido da Covid-19, mas não ajudará a vencer a pandemia. Juarez Cunha explica que, para que o Brasil alcance a imunidade coletiva, é preciso vacinar mais que as 77 milhões de pessoas — o equivalente a cerca de 35% da população brasileira — previstas na primeira etapa do plano. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é preciso vacinar entre 65% e 70% da população mundial para que a transmissão do coronavírus seja controlada.

O fato de algumas farmacêuticas, como a AstraZeneca, terem se comprometido a fornecer imunizantes para coalizões que visam a distribuição igualitária do medicamento a todos os países, especialmente os de baixa renda, tornaria a negociação com empresas privadas ainda mais sem sentido, de acordo com Juarez. “Ficaria muito estranho alimentar o mercado privado sem antes finalizar a vacinação dos países mais pobres”, afirma.

Fura-filas

Eticamente, o fornecimento de vacinas para grupos privados também é um problema. Isso porque, segundo o presidente da Sbim, a imunização dos funcionários das empresas não necessariamente seria focada em grupos considerados mais vulneráveis para a Covid-19, como indígenas, quilombolas, profissionais da saúde e idosos. Deixar estas pessoas de fora poderia gerar ainda mais insatisfação entre quem espera seu lugar na fila da vacinação.

“Se não fosse uma competição de compra, até seria interessante [que as empresas privadas adquirissem as vacinas]. Porém, o mais lógico é ter estas doses alimentando a estratégia que o Ministério da Saúde pretende colocar em prática. O que vai acabar acontecendo é o que está sendo muito debatido atualmente, que é a questão das pessoas estarem furando fila para serem vacinadas”, afirma Juarez Cunha.

Fernando Pigatto, presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), explica que a preocupação com a mercantilização de doses da vacina contra a Covid-19 foi tema de uma carta aberta, assinada pelo CNS em conjunto com diversas entidades e ONGs. No documento, divulgado no dia 6 de janeiro, as entidades defendem a imunização exclusiva pelo SUS.

De acordo com Pigatto, a preocupação com o fortalecimento dos programas de imunização do Brasil vem de muito antes da pandemia de coronavírus começar. “Já vínhamos observando a diminuição das pessoas nas campanhas e doenças já erradicadas, como o sarampo, voltando”, detalha. “Tudo isso aconteceu graças aos movimentos contra vacinas, que se fortaleceram com as notícias falsas.”

Para o presidente da CNS, quando o governo federal abre mão de seu papel de coordenar a vacinação — com planos de enfrentamento bem articulados, estímulo a medidas preventivas, como o uso de máscaras, além de campanhas educativas — acaba atuando a favor do vírus.

“Quando a gente já apontava a importância do fortalecimento de planos de organização de campanhas de vacinação, tínhamos esse medo de chegar em um momento como o de agora, de atropelos e tentativas mágicas de resolver problemas que já existiam”, afirma Pigatto.

Agora, Pigatto afirma que, para sair da pandemia, o Brasil precisa do máximo de vacinas aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) disponíveis para todos, campanhas de sensibilização e união de forças — inclusive, do setor privado.

“As iniciativas privadas podem se esforçar para comprar vacinas para o governo federal. Podem defender a taxação de grandes fortunas para o SUS ter mais recursos e, assim, vacinar os grupos prioritários”, sugeriu. “Precisamos ter a equidade e universalidade das vacinas respeitados. Não podemos oficializar o fura-fila: quem tem dinheiro compra e, quem não tem, fica sem ou espera.”

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