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Cloroquina: entenda como a ciência está enxergando o medicamento

Uso de medicamento contra a malária é alardeado pelo presidente Jair Bolsonaro, mas visto com cautela pela ciência

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1 de 1 remédios - Foto: Hal Gatewood/Unsplash

No dia 19/03, depois de um pronunciamento do presidente americano, Donald Trump, boa parte da população mundial ouviu falar, pela primeira vez, na cloroquina. O medicamento – usado para tratar pacientes com malária, artrite reumatoide e lúpus –, teria ótimos resultados contra o coronavírus de acordo com estudos preliminares e seria utilizado nos Estados Unidos para tratar a Covid-19, segundo o chefe do Executivo americano.

Logo depois, o presidente Jair Bolsonaro comprou a ideia e passou a alardear o uso da cloroquina contra o vírus causador da pandemia. O Brasil é um dos grandes produtores do medicamento no mundo. Com uma das maiores incidências de malária no planeta, os médicos brasileiros conhecem bem a cloroquina.

O presidente se engajou na campanha pelo uso do remédio e até foi fotografado durante uma reunião on-line do G20 com uma caixa do medicamento na mão. Em pronunciamento à Nação no dia 31/03, Bolsonaro afirmou que a produção da cloroquina seria multiplicada. “Os laboratórios químico-farmacêuticos militares entraram com força total e, em 12 dias, serão produzidos um milhão de comprimidos de cloroquina, além de álcool em gel”, afirmou o chefe do Executivo.

Porém a animação com os resultados quase milagrosos da cloroquina não foi acompanhada pela ciência e nem pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que enxerga o assunto com cautela. Há pesquisas científicas sendo feitas com o medicamento em vários países do mundo, mas as evidências ainda são frágeis.

A esperança geral não é a de encontrar uma cura para a Covid-19, e sim um medicamento que diminua o tempo de internação melhorando a situação do paciente. Vale lembrar que, em casos leves, que representam de 85% a 90% dos pacientes, o organismo lida sozinho com o coronavírus e, em 14 dias, o paciente é considerado curado.

“Depende do estágio em que é administrada e da quantidade. Ninguém aqui fala sobre cura, uma pílula mágica para se recuperar da Covid-19, e sim de uma maneira de prevenir que os pacientes evoluam para um estado grave”, explica o chefe do programa de emergências da Organização Mundial da Saúde, Mike Ryan.

No mundo, há mais de 90 estudos clínicos sendo realizados com a cloroquina. Em entrevista à BBC, Kome Gbinigie, pesquisador da Universidade de Oxford e autor de um estudo sobre o uso da cloroquina contra o coronavírus, reconhece que ainda falta informação. “Precisamos de estudos clínicos maiores, de melhor qualidade, randomizados (com uso de placebo) para avaliar melhor a efetividade”, explica.

Um estudo publicado na última quinta (09/04) na revista científica BMJ, uma das mais conceituadas do mundo, afirma que os métodos de pesquisa usados até agora são “pobres”. “O uso desta droga é prematuro e pode trazer danos”, escrevem os cientistas britânicos das universidades de Oxford e Birmingham, na publicação. “Até agora, exceto por medidas de suporte, a infecção do Sars-CoV-2 é ‘essencialmente intratável'”, dizem.

No Brasil, por enquanto, o uso foi liberado apenas para pacientes críticos e graves, que estejam hospitalizados. A cloroquina tem alguns efeitos colaterais que precisam ser monitorados em ambiente hospitalar. A arritmia é um delas: como a maioria dos pacientes internados pela Covid-19 tem alguma cardiopatia, é preciso acompanhamento próximo de um profissional de saúde.

Também foram relatados efeitos adversos como perda da visão periférica, fortes dores de cabeça e cólicas. A Suécia, inclusive, desistiu de testar a cloroquina por considerar que o benefício não supera esses fatores.

Uma pesquisa brasileira, que está sendo feita pela Fiocruz com a Fundação de Medicina Tropical revelou que a letalidade em pacientes graves que foram medicados com o remédio foi de 13% — 11 morreram em um grupo de 81 testados positivos para Covid-19. Entre as pessoas na mesma condição, mas que não tomaram nenhum remédio, a letalidade foi de 18%.

Segundo os pesquisadores responsáveis pelo estudo, a porcentagem ainda é muito próxima e não denota uma melhora convincente para justificar o uso. O levantamento segue sendo feito até que se chegue a resultados definitivos. A única conclusão até agora é que doses de 10 g apresentam maior toxicidade e não são seguras: a opção é seguir com metade dessa dose.

De acordo com Denizar Vianna, secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, no Brasil, nove medicamentos estão sendo testados para avaliar a eficácia contra o Sars-Cov-2: cloroquina, hidroxicloroquina com azitromicina e apenas hidroxicloroquina (uma versão com menor toxicidade do que a cloroquina) estão entre os protocolos de pesquisa.

Alguns hospitais particulares, como Albert Einstein, Sírio-Libanês e Oswaldo Cruz, devem iniciar o protocolo de pesquisa de cloroquina em pacientes leves nesta sexta-feira (10/04).

Segundo Mandetta, médicos podem prescrever a cloroquina para pacientes leves, mas devem assumir os riscos e comunicar à família da falta de evidências científicas. Enquanto Ministério da Saúde, a pasta só deve recomendar o uso para esses pacientes quando houver pesquisas suficientes comprovando a eficácia e a segurança do medicamento.

Por enquanto, o coronavírus segue sem cura. É preciso esperar a ciência para bater o martelo sobre o tratamento com a cloroquina, ou qualquer outro medicamento.

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