Cientistas curam paciente com Covid longa usando leite materno
Paciente com doença rara vinha testando positivo para Covid-19 há 120 dias. Leite de puérperas vacinadas ajudou a derrotar o vírus
atualizado
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Pesquisadores da Universidade de Campinas (Unicamp) usaram um método bastante diferente para tratar uma paciente adulta com uma doença rara que sofria com Covid longa: o leite materno. A mulher tem uma condição no sistema imunológico que a impede de combater vírus e bactérias sozinha e vinha testando positivo para a Covid-19 há 120 dias.
Uma semana depois de começar a tomar 30 ml de leite materno a cada três horas (fora o período noturno), a paciente finalmente recebeu o teste negativo para a presença do coronavírus.
“Tenho acompanhado essa paciente desde criança e, quando ela me contou que estava com Covid-19, fiquei muito apreensiva. O erro inato da imunidade que ela apresenta deixa seu sistema de defesa todo desregulado. Sua resposta inflamatória é deficitária, há poucas células se mobilizando para o local da inflamação e baixa produção de anticorpos. As características de virulência dos agentes infeciosos podem levar a dois desfechos nesses casos: infecção crônica ou morte”, contou a pediatra Maria Marluce dos Santos Vilela, professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM-Unicamp) à Agência Fapesp. Ela é a autora principal do artigo que relata o caso e foi publicado na revista científica Viruses.
A médica explica que o organismo humano produz cinco tipos diferentes de anticorpos (IgM, IgA, IgG, IgE e IgD). Porém, pessoas com a doença da paciente, conhecida como síndrome da imunodesregulação, têm pouco IgE e IgA no corpo, o que dificulta a neutralização de patógenos. Há apenas 157 casos da condição no mundo.
Nos primeiros 15 dias da infecção pelo coronavírus, a paciente teve febre, perda de apetite, perda de peso, tosse e indisposição. Apesar disso, não teve maiores complicações nos pulmões e outros órgãos. Porém, dois meses depois, ela continuava com os sintomas e testando positivo para o vírus.
Os profissionais tentaram tratar a paciente com plasma de convalescente, que é a transfusão de anticorpos de pessoas que se recuperaram da Covid-19. Essa parte do sangue é rica principalmente em anticorpos IgG.
Ela teve melhora dos sintomas e redução dos marcadores inflamatórios, mas continuou com os sinais da doença e fraqueza muscular.
“Ficamos receosos de que a infecção se prolongasse por muito tempo, o que a debilitaria ainda mais e aumentaria o risco de contaminar outras pessoas. Nessa mesma época, saíram os resultados de um estudo mostrando que mulheres lactantes imunizadas com a vacina da Pfizer produziam leite com uma quantidade razoável de IgA. Decidimos então fazer a experiência assistencial de reposição de IgA via leite materno”, explicou a pesquisadora Maria Marluce.
Os cientistas escolheram a via oral a cada três horas para evitar que o vírus se replicasse. A pediatra ensina que o IgA funciona como uma “vassoura”, levando patógenos durante seu caminho e até ser eliminado pelas fezes.
A paciente continua fazendo exames até hoje — o caso começou em março de 2021. Os médicos temem que ela pegue alguma variante do vírus e seja assintomática para a Covid-19. Até o momento, nenhum teste deu positivo e ela parou de sentir os sintomas da doença.
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