Cientista Stanislas Dehaene explica como potencializar aprendizado
Neurocientista francês detalha os passos necessários para garantir a fixação de conteúdos no cérebro e retardar o envelhecimento cognitivo
atualizado
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O francês Stanislas Dehaene, de 57 anos, é um expoente da ciência cognitiva, campo que se dedica a entender como o cérebro humano adquire, usa e transmite o conhecimento.
Professor do Collège de France – uma das mais tradicionais instituições de ensino e pesquisa da França – e diretor da Unidade de Neuroimagem Cognitiva do Instituto Nacional de Saúde e de Pesquisa Médica da França, Dehaene se formou em matemática mas enveredou por pesquisas relacionadas ao funcionamento do cérebro ainda no início da carreira.
No fim dos anos 90, seu livro La Bosse des Maths, que ainda não tem tradução para o português, detalhou como os conceitos matemáticos são fixados. Em 2011, publicou Os neurônios da leitura: como a ciência explica a nossa capacidade de ler (Penso) e, nesse ano, está lançando É assim que aprendemos – Por que o cérebro funciona melhor do que qualquer máquina (Contexto).
Na semana passada, o neurocientista esteve no Brasil e, a pedido do Metrópoles, respondeu algumas questões sobre como potencializar o aprendizado e evitar o declínio cognitivo que acontece com o passar do tempo. Confira a entrevista:
Como o nosso cérebro aprende novos conteúdos?
Cada vez que nosso cérebro aprende, ele se modifica — as sinapses que conectam os neurônios se fortalecem ou desaparecem. É assim que o órgão interioriza os modelos mentais do mundo exterior.
O córtex cerebral está revestido de regiões especializadas que coletam, cada uma, estatísticas de uma determinada área do conhecimento. Por exemplo, apenas uma pequena região é especializada em aprender a ler. Nosso cérebro compila estatísticas em todas as áreas, agindo como um verdadeiro cientista, e o faz desde o nascimento.
O que podemos fazer para facilitar o processo de aprendizagem?
Até o momento, o cérebro funciona melhor do que qualquer máquina. Para facilitar o processo de aprendizado, em primeiro lugar, precisamos prestar atenção – isso significa focar no assunto a ser aprendido sem se deixar distrair.
Em segundo lugar, precisamos do engajamento ativo: o indivíduo deve ser curioso, fazer perguntas e gerar hipóteses. Em terceiro lugar, é necessário feedback: o aprendiz deve receber um retorno preciso que lhe mostre onde ele estava certo e onde estava errado.
Em quarto lugar, é necessário praticar: temos que repetir o que aprendemos dia após dia para tornar o processo mais rápido e totalmente inconsciente. Isso liberta nossos recursos mentais para aprender outras coisas.
Com o tempo, o cérebro envelhece, parte dos neurônios morre e muitas conexões se desfazem. Até que ponto é possível retardar esse processo natural?
A educação é um fator de proteção, especialmente a musical. As pesquisas mostram que as pessoas que aprenderam a tocar um instrumento musical, especialmente se continuaram a tocá-lo ao longo de suas vidas, preservam suas funções cognitivas e estão até mesmo protegidas da surdez. É importante permanecer ativo e continuar aprendendo ao longo da vida.
O excesso de estímulos aos quais somos submetidos hoje via telas afeta nossa capacidade cognitiva?
Sim. Tanto para o bem, quanto para o mal. As crianças que jogam videogames de ação se beneficiam muito com o tempo rápido de respostas e a tomada rápida de decisões.
O principal problema é o excesso em todas as áreas. O tempo gasto é um fator preocupante. Todos esses programas são desenvolvidos para ser viciantes e nos fazer perder a noção do tempo.
Em segundo lugar, a constante distração que as telas proporcionam atrapalha a nossa concentração. Numerosas experiências mostram que a leitura de um livro em um tablet em vez de em papel leva a uma menor compreensão do significado do texto. Para evitar essa distração, a França proibiu o uso dos telefones celulares no ensino fundamental.
Quais são os hábitos mais importantes para evitar o declínio cognitivo?
Boa alimentação, sono de qualidade e atividade física durante o dia contribuem de alguma forma para limitar os efeitos da idade no cérebro. Mesmo que estas sejam inevitáveis. Gosto da visão japonesa de que os idosos são tesouros nacionais porque acumularam conhecimento e sabedoria em seus cérebros que só podem ser adquiridos através de anos de experiência.
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