Carecas correm mais risco de desenvolver quadros graves da Covid-19?
Estudos observacionais indicam que sim e a explicação provável estaria relacionada a ação dos hormônios masculinos
atualizado
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Pesquisas científicas publicadas nos últimos meses levantaram a suspeita de que carecas são mais vulneráveis aos quadros graves da Covid-19.
Já está bastante documentado que os homens são maioria entre os que morrem por causa da infecção provocada pelo novo coronavírus e, ao observar a presença de muitos carecas hospitalizados, os pesquisadores lançaram a hipótese de que os andrógenos – hormônios sexuais masculinos relacionados à queda de cabelo, entre outras coisas – desempenhariam um papel que explicasse a maior virulência da doença no sexo masculino.
Um pequeno estudo preliminar publicado em abril, no site Wiley Online Library, identificou que de 41 homens, com idade média 58 anos, internados em hospitais da Espanha, 29 tinham alopecia androgenética masculina clinicamente significante, 16; grave e 12; irrelevante. Em um desdobramento deste trabalho, que foi publicado no Journal of the American Academy of Dermatology, os médicos relataram que de 175 pacientes internados, 79% eram carecas.
O médico infectologista, Sérgio de Andrade Nishioka, doutor em epidemiologia e consultor da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz-DF) lembra que a calvície está fortemente associada a níveis elevados de diidrotestosterona (DHT), um derivado mais ativo da testosterona. De acordo com ele, é provável que altos níveis de DHT sejam um fator de risco para formas graves da doença.
O Sars-CoV-2 entra nas células pulmonares a partir da ligação da proteína spike com proteínas receptoras (ACE-2) das células e essa ligação é catalisada pela enzima TMPRSS2. O gene que codifica essa enzima é ativado quando hormônios masculinos, em particular o DHT. A explicação seria, se há mais hormônio masculino, há mais ligações com receptores androgênicos, mais TMPRSS2 e maior facilidade para o novo coronavírus entrar na célula.
“O fato de facilitar a entrada do vírus e, consequentemente de um maior volume dele, sugere que a pessoa possa ter uma infecção mais grave, mas os estudos não demonstram cabalmente isso”, esclarece Nishioka.
As duas pesquisas usaram como critério a observação. Nenhuma delas avançou para o estágio de exames clínicos, por exemplo. Nishioka acredita que as descobertas podem ser usadas futuramente como um critério para médicos decidirem sobre o acompanhamento mais próximo de um paciente. “É um fator. Ele não será decisivo, mas são essas pequenas coisas que vão definir a conduta que será tomada”.
Um outro estudo, da Universidade de West Virginia, nos Estados Unidos, ainda sem revisão dos pares, sugere que homens carecas têm 40% mais chances de apresentar sintomas clínicos da infecção provocada pelo novo coronavírus e, quanto mais calvos, mais vulneráveis à forma grave da doença.
O consultor da Fiocruz ressalta que, a calvície ainda não pode ser considerada um fator determinante para complicações da Covid-19. “O fato de ser careca ou ter histórico de calvície na família não quer dizer que você está fadado a ir para uma UTI. Pode existir essa associação, mas o tamanho desse efeito é pequeno”, comenta.
Estudo nacional
Começa nesta quarta-feira (29/7), em Brasília, uma pesquisa sobre o uso de medicamentos anti-androgênicos – que regulam os hormônios masculinos – em pacientes da Covid-19. O estudo é comandado pelo médico endocrinologista Flávio Cadegiani, mestre e doutor (PhD) em Endocrinologia Clínica pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp/EPM).
Ele sugere o uso da dutasterida e da espironolactona para pacientes que possuem doenças cardiovasculares e testaram positivo para Covid-19. O experimento tentará checar se os medicamentos têm algum benefício para evitar que os pacientes evoluam para quadros graves da doença.