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Brasil de luto. Psicólogas ensinam a lidar com a dor de 310 mil mortes

Luto individual e coletivo neste momento de angústia precisa ser trabalhado, para que problemas maiores não sejam desenvolvidos no futuro

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movimento de enterros e carros de funerária no cemitério vale da paz, em goiânia, goiás
1 de 1 movimento de enterros e carros de funerária no cemitério vale da paz, em goiânia, goiás - Foto: Vinícius Schmidt/Metrópoles

Nas últimas semanas, o Brasil tem vivido o momento mais complicado desde o início da pandemia. Neste sábado (27/3), com o sistema de saúde em colapso e a média móvel passando de 2 mil óbitos por dia, o país alcançou a trágica marca de 310 mil mortes decorrentes da Covid-19. E a situação tem tudo para continuar piorando.

São famílias inteiras que se contaminaram juntas, pessoas que morrem com horas de diferença, jovens e idosos com a vida interrompida pelo coronavírus. Despedidas pela tela de um celular antes da intubação, enterro com caixão fechado e a impossibilidade de encontros para velar o corpo. A conta da tragédia é alta, e somos obrigados a aprender a lidar, de uma única vez, com luto, medo e desesperança.

“A ansiedade é gerada, especialmente, pela incerteza que marca o agora. Proteger-se e proteger a quem se ama é a primeira medida para lidar com a situação. O momento atual exige que cada pessoa faça sua parte para salvar o coletivo”, explica Danielle Vasconcelos, mestra em psicologia clínica e cultura pela UnB e psicóloga da Integrate.

A psicóloga Karla Peres, da clínica Inspiração K, explica que é preciso encontrar equilíbrio entre estar informado, saber o que está acontecendo (até para adotar medidas de controle de acordo) e manter a saúde mental. Não é fugir da realidade, pontua, mas desfocar um pouco. “É preciso buscar algumas coisas positivas, senão o emocional fica tão abalado que o paciente não dá conta e adoece. Nem todo mundo está preparado para o enfrentamento: ou se distrai, ou precisa de acompanhamento psicológico para enfrentar o luto coletivo”, frisa.

Danielle sugere que se viva um dia de cada vez, pensando no que pode ser feito no dia de hoje. É importante, ainda, encontrar estratégias para amenizar a angústia, seja praticando exercícios físicos ou mantendo contato com familiares e amigos por videochamada, partilhando momentos com quem se ama, ainda que a distância. Manter uma rotina mínima de sono e alimentação, em horários marcados, também pode ajudar.

“No geral, o autocuidado pede que cada um busque fórmulas que sejam eficazes individualmente. Há quem opte pela meditação, pelo ioga. E há quem encontre uma boa aula de funk no Youtube. A criatividade é a melhor amiga nesta hora, buscando o que é bom para si”, ensina.

A negação de tudo o que está acontecendo não é a solução para lidar com o fardo da pandemia — não adianta entrar em uma bolha e ficar lá até que tudo volte ao normal. “Negar não resolve. Cada um precisa fazer a sua parte, se cuidar e cuidar dos seus, senão vai ficar tudo mais difícil”, enfatiza Karla.

Morte repentina

A morte de uma pessoa por Covid-19 costuma ser repentina e, por causa das chances de transmissão, muitas vezes não há tempo de se despedir. Para evitar o contágio, muitas famílias não se encontram há meses, e não podem contar com a presença dos parentes neste momento difícil, já que é preciso manter o distanciamento. Tudo isso pode dificultar ainda mais o luto.

“Hoje, a morte por Covid-19 é quase uma roleta russa. As pessoas sentem raiva, culpam a Deus, questionam por que não protegeu aquela vida. Deus protege, mas precisamos fazer a nossa parte. Não vamos falar para não chorar, chore, coloque para fora o que está sentindo, e enfrente o luto com a ajuda de um psicólogo. Nem todo mundo está preparado para a morte, e a nossa cultura é do sofrimento, o fim é visto como algo doloroso”, explica Karla.

A profissional lembra que uma maneira mais saudável de aceitar a morte é focar em boas lembranças e nos momentos felizes vividos juntos. A psicóloga sugere que se faça uma carta de despedida, escrevendo tudo o que gostaria de falar para quem morreu.

“As pessoas estão tendo que velar a distância, um caixão fechado, não tem uma última olhada, uma oportunidade de agradecer pelos momentos que viveram juntas. A carta pode ajudar a colocar esses sentimentos para fora. Mas o luto nunca é fácil, cada um sofre de uma forma”, ressalta.

Danielle salienta que o mais importante no momento de luto é não estar só: ainda que com distanciamento físico, o contato com amigos e familiares ajuda, e é preciso ter com quem conversar. Se não há uma pessoa na com quem desabafar, a orientação é procurar um profissional para lidar com o cenário de dor.

Outra sugestão é fazer um ritual de despedida, sem a necessidade de um corpo presente. “É uma situação que exige criatividade, mas é muito importante se despedir e deixar marcada a lembrança dos bons momentos”, ensina.

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