“Encaro como um jogo”, diz atleta em tratamento do câncer de mama
Aos 39 anos, a campeã sul-americana de vôlei de praia Fabíola Constâncio luta pela segunda vez contra o câncer de mama
atualizado
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Em abril deste ano, a jogadora de vôlei de praia brasiliense Fabíola Constâncio, 39 anos, foi diagnosticada pela segunda vez com câncer de mama. Uma recidiva da doença levou a campeã sul-americana a colocar o esporte que faz seus olhos brilharem em segundo plano mais uma vez para cuidar da saúde.
A luta de Fabíola contra o câncer começou em 2019, quando a atleta descobriu um nódulo na mama direita durante o autoexame. Quatro anos depois, mesmo com a mastectomia, um novo tumor apareceu no mesmo local. No mês de conscientização contra o câncer de mama, a brasiliense faz um alerta para as mulheres que acreditam que a cirurgia previne completamente a recidiva da doença e deixam de prestar atenção à saúde.
“O segundo diagnóstico no mesmo lugar foi muito inesperado. Eu já era mastectomizada e, na minha cabeça, não era possível ter recidiva se não tinha mais a mama. Mas aconteceu”, afirma, em entrevista ao Metrópoles.
O tumor apareceu entre a pele e a prótese de silicone. Inicialmente, ele se apresentou como uma fibrose pequena, mas aumentou de tamanho rapidamente, chamando a atenção dos médicos.
A oncologista Elisa Porto, da Oncoclínicas Brasília, explica que as taxas de recidiva local após a mastectomia dependem de dois fatores: da biologia do tumor, ou seja, o quão agressivo ele é; e do estadiamento da doença, que determina o tamanho do tumor na mama e se há comprometimento dos linfonodos axilares.
“Existe um senso comum equivocado de que a mastectomia confere uma proteção maior à paciente, eliminando a chance de recidiva. Mas o fato é que, na maioria dos casos, a mastectomia não oferece maiores possibilidades de cura ou um melhor resultado do tratamento”, afirma Elisa.
Fabíola tem o tumor do subtipo receptor hormonal de estrogênio e progesterona, o mais comum — ele corresponde a 70% dos cânceres de mama. As células desses tumores têm receptores que se ligam aos dois hormônios, que ajudam as células cancerígenas crescerem e se disseminarem.
Afastada das quadras
O primeiro diagnóstico de câncer de mama, em 2019, fez com que Fabíola ficasse afastada das quadras por quase três anos. Nesse período, ela foi submetida a uma mastectomia, sessões de quimioterapia e tratamento hormonal.
Sua fórmula para se manter otimista foi se blindar de qualquer pensamento negativo. “Apesar de toda a mudança na minha rotina, com a troca das quadras por clínicas e hospitais, tentei proteger a minha mente e criei uma redoma, selecionando o que eu consumia de leitura, na internet, e com quem eu iria conviver. Para mim, era importante ter pessoas que me colocassem para cima e não me olhassem com cara de ‘coitada'”, conta.
“Encarei o diagnóstico como um jogo. Coloquei na minha cabeça que seria o mais difícil da minha vida”, afirma.
Recidiva do câncer
No início deste ano, Fabíola estava em fase de remissão, mas voltou a sentir queda no desempenho físico. A fadiga e a falta de energia foram os primeiros sinais de que a saúde não andava bem.
“Terminei 2022 muito bem fisicamente, rendendo nos jogos, mas em janeiro de 2023 comecei a ter sintomas bem parecidos aos do passado. Eu ia treinar me arrastando, e a confirmação da recidiva veio com os exames”, lembra.
A notícia foi recebida com frustração, mas Fabíola segue com o tratamento indicado pela equipe médica. Ela passou por uma cirurgia mais simples para a retirada do tumor e três semanas de radioterapia. Agora, faz tratamento com hormonioterapia.
A recidiva do câncer de mama pode acontecer meses ou anos após o aparecimento do tumor. Significa que, depois de todo o tratamento e acompanhamento sem a doença ser detectada, o câncer retornou. De acordo com a oncologista Elisa, essa é uma preocupação muito comum entre os pacientes.
O risco de retorno é diferente para cada pessoa e depende de múltiplos fatores, incluindo subtipo e estágio do câncer, fatores genéticos, tipo de tratamento e tempo desde a intervenção.
“Por isso, depois de completar o tratamento para o câncer de mama, é muito importante consultar o médico regularmente para checar se está tudo certo e que não há sinais de que o tumor tenha voltado”, pondera a oncologista.
Lei de proteção aos atletas
Depois do primeiro diagnóstico, Fabíola treinou por um ano inteiro para voltar a competir no Circuito Brasileiro de Voleibol de Praia de 2021. Quando se sentiu confiante fisicamente para retornar às quadras, ela foi surpreendida ao saber que tinha perdido toda a pontuação alcançada durante os 12 anos de carreira.
A briga pelo direito de ter sua pontuação de volta, além de uma postagem em tom de desabafo nas redes sociais, sensibilizou políticos e deu origem à Lei Fabíola Constâncio nº 7.050/2022, vigente no Distrito Federal e que assegura a pontuação obtida em rankings esportivos aos atletas licenciados para tratamento de câncer e outras doenças que exijam um longo afastamento.
“Se algum atleta precisar se afastar da sua modalidade por um problema de saúde, pode ter a pontuação garantida por até sete anos. Ele pode fazer o tratamento em paz, sem ser prejudicado”, explica a brasiliense.
Futuro nas quadras
A volta para as quadras ainda é incerta. “Meu olho brilha quando eu falo do esporte, eu amo vôlei de praia e acompanho todos os jogos, mas ainda não sei se vou voltar. Passa muita coisa na cabeça. Não sei se vou dar conta com a medicação que uso agora”, considera.
Fabíola tenta lidar com os efeitos colaterais da hormonioterapia, que causa sintomas semelhantes aos encontrados na menopausa, como fogachos (calores) e dificuldade para ganhar massa muscular. “São questões que eu ainda tenho que me adaptar”, conta.
Enquanto faz o tratamento e avalia o futuro profissional, a atleta se dedica ao Instituto Esporte e Saúde Fabíola Constâncio, voltado para as duas bandeiras defendidas pela atleta: esporte e saúde. A primeira ação dele foi uma corrida de Outubro Rosa – a iniciativa aconteceu em Águas Claras, no Distrito Federal.
“O esporte salva vidas e é fundamental como política pública. Quando se investe no esporte, você tira pessoas da rua, dá saúde”, destaca a atleta.
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