“Minha cadeira me dá asas”, diz atleta e bailarina de 17 anos com AME
Jovem com atrofia muscular espinhal (AME) supera limites, volta aos palcos e se torna campeã de bocha paralímpica no Parapan de Jovens
atualizado
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A bailarina e atleta Laíssa Guerreira passou por tantos obstáculos e batalhas por conta do diagnóstico de atrofia muscular espinhal (AME) e todas as limitações que a doença impunha ao seu corpo que decidiu adotar o sobrenome de luta. Aos 17 anos, ela coroou a trajetória com um feito: conquistou dois sonhos em apenas uma semana.
Ela foi campeã de bocha paralímpica nos Jogos Parapan-Americanos de Jovens de Bogotá 2023 no domingo (11/6) e nesta sexta-feira (16/6), participará de uma apresentação de dança ao lado do bailarino Marley Lucena, que tem formação no Bolshoi, na abertura da 8ª edição do Cenário das Doenças Raras.
“A cadeira de rodas não é um empecilho, ela me dá asas para que eu possa me movimentar, me deslocar. Lembro que, quando eu me sentei nela pela primeira vez, pude circular livre, e achei tudo muito divertido”, conta.
A sensação de liberdade, porém, só foi conseguida depois de anos superando obstáculos e barreiras. Por muito tempo, sofrer uma degeneração muscular que a obriga a estar na cadeira de rodas era o maior medo de Laíssa, explica a mãe dela, Edna Silva, de 44 anos.
“No dia que recebemos o diagóstico de AME, minha filha me abraçou chorando e disse que não queria deixar de andar. Ela tinha oito anos. Prometi que ela não ia para uma cadeira de rodas. Isso foi em outubro. Em dezembro, a Laíssa deixou de andar por conta da doença”, lembra.
O que é a AME?
A AME é uma doença genética ultrarrara que afeta a capacidade do organismo de produzir proteínas que permitem o funcionamento dos neurônios espinhais, prejudicando a movimentação do corpo e debilitando até a capacidade de engolir e respirar. Na maioria dos casos, se não for tratada, a doença pode ser fatal ainda nos primeiros anos de vida.
Em geral, os sintomas aparecem nos seis primeiros meses de vida, mas, no caso de Laíssa, os sinais só surgiram depois dos dois anos de idade.
“Ela nunca correu, nunca pulou e sempre caiu. Laíssa tinha problemas para deglutir e respirar, e eu não entendia porque aquilo tudo estava acontecendo. Comecei a ir em vários médicos, mas a gente levou seis anos para ter um diagnóstico preciso”, conta Edna.
Tratamento difícil
Quando Laíssa foi diagnosticada, não existiam medicamentos disponíveis para o tratamento. Hoje em dia, o paciente com AME pode receber atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), que oferece até um dos remédios mais caros do mundo, o Zolgensma — cada dose custa cerca de R$ 6 milhões.
No caso de Laíssa, o remédio não teria funcionalidade, já que ele é eficaz apenas para pessoas com até dois anos. Ainda assim, ela foi tratada com outro medicamento famoso, o Spinraza, que é injetado diretamente na coluna.
“Quando tomei a primeira dose, me emocionei muito. Aquele líquido me deu esperança de vencer. Lembro de chegar em casa depois das aplicações do remédio e conseguir comer uma fatia de pizza inteira, segurar meu próprio copo de suco”, conta.
Jornada pela superação
As três doses do remédio, administradas quando a garota tinha 12 anos, permitiram que Laíssa tivesse uma nova vida e conseguisse retomar velhos hábitos. Entre as novidades estava a bocha paralímpica, esporte que ela escolheu praticar. “Treino todos os dias, me dedico muito”, conta.
O treinamento incansável permitiu que ela realizasse seu sonho de competir no esporte. No domingo (11/6), ela foi campeã dos Jogos Parapan-Americanos de Jovens de Bogotá 2023 em duas modalidades. Foi ouro na classe BC4 (sem assistências) e na categoria de duplas mistas com André Martins.
“Foi incrível ir para o pódio. O meu maior sonho era representar o Brasil em um campeonato internacional, vestir a camisa e ver o nome do país ali no meu peito. Queria estar no pódio, mas nunca imaginei que ia conseguir dois ouros”, comemora.
Além disso, Laíssa também se destaca na dança. Ela chegou a praticar quando ainda caminhava e pensou que a necessidade da cadeira de rodas seria o fim deste sonho.
“Eu amo dançar. A dança para mim é uma forma de pintar, de ter a liberdade de ver até onde as minhas rodas poderiam me levar. Quando retornei ao palcos, me emocionei muito, porque achava que não ia conseguir tão cedo. Mas eu consegui”, conta.
“Vivemos intensamente o amor, e a força que ele pode trazer para se superar diariamente: essa é a verdadeira cura”, declara Edna.
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