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Afinal, uma única dose da vacina de febre amarela é eficaz?

Diante do aumento de casos, pessoas têm formado filas nos postos de vacinação. Desde 2017, Brasil adota esquema de dose única

atualizado

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André Borges/Agência Brasília
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1 de 1 vacina2_agenciabrasilia - Foto: André Borges/Agência Brasília

O iminente surto de febre amarela que ronda algumas regiões do país – a Sudeste, principalmente – gerou uma imensa corrida dos brasileiros aos postos de vacinação. Horas de espera depois, no entanto, muitos voltam para casa com os braços intocados. Quando veem um carimbo do antígeno já constando nas carteirinhas, os profissionais de saúde avisam: uma única dose, recebida em qualquer momento da vida, deve ser suficiente para garantir que o paciente não entre para as estatísticas da doença. Próximo da fila.

Isso porque, desde abril do ano passado, o Ministério da Saúde decidiu abolir a dose de reforço do calendário de vacinação nacional. Em vez de uma a cada 10 anos – ou duas por toda a vida, segundo regia o esquema anterior à atualização –, a conclusão da pasta foi de que a dose adicional não é necessária para blindar o sujeito contra a febre amarela.

Não é raro, no entanto, encontrar pelas filas gente em busca da segunda, terceira ou quarta vacina contra a virose, sob o argumento de que “cuidado nunca é demais”.

Tiago Queiroz/Estadão
Filas para vacinação em São Paulo rodeiam quarteirões


Vacina 1 x 0 Teorias
No mesmo passo em que sobe o número de casos, aumentam também as “teorias da conspiração” contra a medida do governo. Segundo a mais repetida delas, a decisão teria se baseado em um temor de os estoques não darem conta da demanda mundial.

Afinal, aquela única dose tomada ainda na infância, que consta na sua carteira de vacinação, é suficiente para proteger você de um eventual surto da doença, mesmo tantos anos depois? O Metrópoles consultou especialistas não vinculados ao governo, em busca da resposta.

O epidemiólogo Pedro Luiz Tauil, professor da Universidade de Brasília (UnB) e um dos maiores especialistas em medicina tropical do país, não considera errada ou irresponsável a decisão das autoridades brasileiras, mas reconhece que a extinção da segunda dose “não é consenso” na comunidade médica.

Antigamente, se fazia uma dose a cada 10 anos. Mas a vacina é difícil de ser fabricada, é antiga, de tecnologia obsoleta, e os laboratórios talvez não se interessem em produzi-la, porque é um produto barato

Pedro Luiz Tauil, especialista em medicina tropical

Lote importado
Hoje, a Bio-Manguinhos/Fiocruz, no Rio de Janeiro, é a maior fabricante do mundo do imunobiológico. A francesa Sanofi Pasteur também produz uma versão no exterior, que geralmente é a disponível nas clínicas particulares. Diante do aumento da demanda, na última quinta-feira (18/1), a farmacêutica teve o aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para importar um novo lote do produto, com rótulo em língua estrangeira. Segundo a empresa, a produção teve um aumento de 300% em 2017, na comparação com o ano anterior.

 

Fiocruz/Divulgação
“Diante da escassez e de evidências de que a proteção com uma dose era segura, o ministério seguiu uma recomendação já antiga da Organização Mundial da Saúde (OMS)”, explica Tauil. “Porém, não é consensual. Existem registros de pessoas infectadas com vacinas com mais de 10 anos. Mas são pouquíssimos casos. É como se o governo falasse ‘vamos então garantir que todos os brasileiros recebam, pelo menos, uma dose’”, comenta.

A recomendação citada pelo especialista foi publicada em uma revisão da OMS de 2013. “Uma única dose da vacina de febre amarela é suficiente para sustentar uma proteção por toda a vida; uma dose de reforço não é necessária”, diz a publicação do órgão.

Meses após o anúncio da OMS, um estudo publicado no Travel Medicine Journal questionava a recomendação, sob o argumento de que as evidências eram “limitadas”. “Ainda que a eficácia da vacina não esteja em dúvida, o anúncio é um pouco surpreendente, já que há limitações na base de evidências e, mais importante, porque ele não é acompanhado de nenhuma mudança iminente na regulamentação internacional”, escreveram as autoras.

À reportagem, Hilary Simons, enfermeira britânica especialista em medicina do viajante e uma das responsáveis pelo artigo, disse estar acompanhando a evolução da febre amarela no Brasil, mas afirmou não se sentir à vontade para comentar a decisão brasileira.

Crianças menores de 2 anos
A Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), por sua vez, não questiona a decisão do governo, de podar os reforços da vacina contra a febre amarela. Segundo a presidente da SBIm, Isabella Ballalai, justamente por ser o maior produtor do antígeno no mundo, o Brasil adiou o máximo que pôde a atualização do protocolo de vacinação.

A gente podia se dar a esse luxo porque somos o principal fabricante”, comenta a especialista. “Justamente porque somos autossuficientes, o governo decidiu esperar resultados de pesquisas da Fiocruz até tomar a decisão, quatro anos depois de a OMS recomendá-la

Isabella Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações

Reprodução/Flickr

 

Ballalai reforça ainda que, além das evidências demonstradas em estudos, a vacina em dose única tem se provado eficaz na prática. “Quem adoece, em geral, é quem nunca tomou. Não temos vacinados que adoeçam”, comenta a médica. No entanto, há uma situação para a qual a medida encontra obstáculos: as crianças menores de 2 anos.

“Sabe-se que a resposta da vacina no sistema imunológico de crianças dessa idade não é a mesma observada em adultos ou crianças mais velhas. Por isso, a segunda dose para quem tomou a primeira aos 9 meses ainda é a parte sobre a qual não há consenso. Para os adultos, não conheço quem questione a decisão do governo, de dose única”, sublinhou a especialista. Segundo ela, mesmo que seja em caráter de “emergência”, a decisão do Ministério da Saúde não é “irresponsável ou insegura”.

Por outro lado, Pedro Luiz Tauil acredita que, num cenário futuro hipotético, no qual a produção da vacina aumente, a segunda dose de segurança pode voltar às carteiras de vacinação. “Em um país endêmico como o Brasil, a medida está adequada. Mas, no momento em que se tenha maior oferta, é possível que a vacinação a cada 10 anos volte”, disse.

Na tarde desta sexta-feira (19/1), a Secretaria de Saúde de São Paulo confirmou três mortes em decorrência de reações adversas à vacina. A suspeita é de que tenha ocorrido falha na triagem das pessoas, antes da vacinação. O imunológico é contraindicado em alguns casos, como para alérgicos aos componentes da dose (ovo, por exemplo) ou para pessoas imunodeprimidas por doença ou uso de medicamentos. Confira abaixo quem não deve ser vacinado:

 

Arte/Metrópoles

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