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Executivos da Vale e BHP fizeram bilhões desde o desastre de Mariana

Documentos exclusivos mostram que os 38 maiores executivos da Vale e da BHP fizeram bilhões desde o desastre de Mariana

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Homem observa a destruição após o desastre ambiental causado pela Sanmarco em Mariana
1 de 1 Homem observa a destruição após o desastre ambiental causado pela Sanmarco em Mariana - Foto: Gustavo Basso/NurPhoto via Getty Images

Os maiores executivos da BHP e da Vale, operadores da Samarco e responsáveis pelo rompimento da barragem de Mariana, em 2015, ganharam aproximadamente US$ 516 milhões — R$ 2,9 bilhões — das mineradoras desde o rompimento da barragem. Mais de 600 mil vítimas do desastre esperam suas indenizações e a responsabilização da BHP e da Vale. A tragédia de Mariana matou 19 pessoas, deixou centenas de famílias desabrigadas e despejou rejeito de minério em três rios e no Oceano Atlântico.

Nesta segunda-feira (21/10), às vésperas do aniversário de 9 anos da tragédia, a Alta Corte de Justiça de Londres começa a julgar a responsabilidade da BHP no desastre. O julgamento deve se estender até março de 2025. A Vale, que chegou a ser ré na justiça inglesa, acordou com a outra mineradora que dividiria 50% dos custos das indenizações às vítimas caso a BHP seja condenada.

Uma análise feita pelo portal de investigação britânico Finance Uncovered e divulgada em colaboração com o Metrópoles mostra que, sozinhos, os 38 maiores executivos da Vale e da BHP fizeram, desde o desastre de Mariana, 1.07% do valor total da indenização destinada às mais de 600 mil vítimas. As investigações também mostram que os executivos da Samarco eram mais incentivados financeiramente a aumentar os lucros da empresa do que a promover ações de prevenção de riscos.

Os autores da ação cobram US$ 47 milhões na justiça inglesa, aproximadamente R$ 248 bilhões. O valor da indenização representa quase um quarto — 24.6% — das ações da BHP e da Vale juntas.

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O maior critério para o pagamento dos bônus era o esforço dos executivos para aumentar o preço das ações da Vale e da BHP e o aumento dos dividendos das mineradoras. Em contraste aos altos bônus dos executivos ao longo dos últimos nove anos, a grande parte das vítimas do desastre de Mariana ainda não ganharam compensação.

Em janeiro deste ano, a Justiça Federal brasileira condenou a Vale, a BHP e a Samarco por danos morais coletivos pelo desastre de Mariana. As empresas, de acordo com a decisão do juiz federal substituto Vinicius Cobucci, da 4ª Vara Federal Cível e Agrária de Belo Horizonte, deveriam pagar R$ 47,6 bilhões aos cofres públicos por danos morais coletivos. A Vale recorreu, mas considera que “possível a perda no mérito”.

Além disso, o Ministério Público Federal (MPF), a Advogacia-Geral da União (AGU) e a Samarco — empresa controlada pela Vale e pela BHP — participam de um acordo para indenizar em R$ 100 bilhões as vítimas do desastre.

Com os atrasos da responsabilização da BHP e da Vale na justiça inglesa e na brasileira, as empresas mantêm seus lucros alto. Enquanto isso, as mais de 600 mil pessoas que sofreram os impactos do maior desastre ambiental do Brasil continuam esperando suas indenizações.

Os incentivos aos executivos da Samarco sobre prevenção de riscos

Em colaboração com o Finance Uncovered, a investigação teve acesso como executivos da Samarco eram incentivados a prevenir riscos. Documentos internos da empresa, que é controlada pela Vale e pela BHP, mostraram que, em 2015, dentre as ações que compunham os bônus dos executivos, a prevenção de risco representava apenas 20%.

O restante dos incentivos eram focados em retornos financeiros e entrega de projetos voltados para o grandes investimentos de longo prazo para construir, melhorar ou manter os ativos da empresa. Executivos da Vale e da BHP formavam o comitê que definia os pacotes salariais de seus pares na Samarco.

Dentro dos 20% de incentivo à prevenção de riscos, havia uma lista de 20 riscos enfrentados pela Samarco — apenas um previa especificamente o rompimento de uma barragem.

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Slide retirado de uma apresentação de gestão para o Comitê de Riscos da Samarco em junho de 2014, detalhando a Avaliação de Controle de Riscos Materiais da empresa. Ele mostra que a Classificação de Risco Residual atribuída ao “Valor crítico da operação da barragem” foi reduzida de uma pontuação de 90 em 2013 para uma pontuação de 30, passando de um risco “vermelho” para um risco “amarelo” em uma escala de semáforo

Em agosto de 2015, três meses antes do desastre de Mariana, um dos documentos internos da Samarco mostrou que o comitê de remuneração — ou seja, os executivos da BHP e da Vale — esperava dar aos executivos da Samarco a pontuação máxima por sua gestão de riscos.

Em 2014, um ano antes do desastre, a Samarco, ainda de acordo com os documentos obtidos pela coluna e pelo Finance Uncovered, minimizou os riscos de um rompimento de barragem. A justificativa para o número eram os projetos de prevenção de desastres apresentados pelos executivos da empresa.

A coluna e o Finance Uncovered questionaram a Samarco se a subestimação dos riscos, baseado nos projetos apresentados pelos executivos, teve algum impacto nos bônus recebidos por eles no final daquele ano. A empresa, entretanto, não respondeu.

O documento também resumiu como o conselho da Samarco imaginava que seria uma falha catastrófica da barragem: uma perda máxima estimada de US$ 2,6 bilhões, com apenas duas fatalidades na barragem de Fundão, impacto em Bento Rodrigues e a possível morte de um transeunte. Nesse cenário hipotético da Samarco, uma área de cerca de 30 hectares seria poluída ou danificada e levaria cerca de cinco anos para se recuperar.

A realidade, entretanto, foi muito pior. O rompimento da barragem resultou na morte de 19 pessoas e na destruição de comunidades inteiras — entre elas Bento Rodrigues. O desastre deixou cerca de 600 desabrigados e a lama tóxica poluiu o Rio Doce, devastou ecossistemas ao longo de 650 km e comprometeu a biodiversidade local, com danos ambientais que até hoje, nove anos depois, não foram mitigados.

O que dizem os citados

A Samarco, BHP e Vale não responderam às perguntas feitas pela coluna e pelo Finance Uncovered e forneceram apenas declarações subjetivas. A BHP e a Samarco acrescentaram que os processos legais e as negociações de acordos restringiam o que poderiam dizer sobre os processos.

A Vale afirmou que a Fundação Renova já compensou cerca de 430.000 pessoas.

“No total, mais de R$ 37 bilhões já foram investidos por Vale, BHP e Samarco em ações para compensar e reparar o meio ambiente e a infraestrutura afetados”, disse a empresa.

A Vale afirmou que o processo no Reino Unido “trata de questões já abordadas no Brasil, seja por meio de processos judiciais ou pelo trabalho de reparação realizado pela Renova.”

A Samarco disse: “A empresa reafirma seu compromisso e permanece dedicada à reparação total dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão.”

A BHP declarou: “A BHP continua a defender a ação judicial no Reino Unido, que duplica os esforços já em andamento no Brasil e, se bem-sucedida, faria com que até 30% de qualquer indenização concedida a um reclamante individual fosse destinada aos advogados e financiadores da ação coletiva associados ao caso.”

Reportagem escrita com contribuições de Simon Bowers, editor de investigação do Finance Uncovered.

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