É preciso entender de vinho para beber? Não, mas melhora a experiência
Em sua coluna de estreia, o sommelier Sérgio Pires fala sobre como o conhecimento na área ajuda a degustar melhores rótulos
atualizado
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No século passado, no início dos frenéticos anos 1970, para comemorar, aos 19 anos, o meu primeiro emprego, convidei uma amiga para jantar em um dos bons restaurantes de Brasília. Naquela festiva ocasião, pedimos vinho, uma das três garrafas que constava da magra carta. Achei sofisticado consumir o líquido no jantar, mas não lembro se gostei do que provei.
De lá para cá, não só o meu conceito e gosto pelo vinho se modificaram, como também o mundo da enologia se transformou à nossa volta.
Nunca antes na história deste país vivemos um momento como o de agora, tão favorável para o consumo do néctar de Baco. O vinho está disponível em vários locais, desde lojas especializadas até postos de gasolina. Com variedades, origens e preços diversos, os restaurantes dispõem de excelentes cartas, além de adegas climatizadas, taças adequadas e profissionais treinados.
Como uma virtuosa consequência dessa evolução, temos muitos novos consumidores. Número em constante expansão, sem distinção de classe social, faixa etária ou orientação sexual. Em comum, nesses neo-enófilos, é a confissão: gosto, mas não entendo nada de vinho!
Papo de sommelier
Gostaria, falando como sommelier, diretor da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS-DF) e professor em cursos de vinho, de responder a essa ponta de angústia do novo amigo do vinho. Fiquem tranquilos! Para beber, basta gostar. Ter um saca-rolhas à mão também ajuda.
Mas, se não precisa entender, ler ou participar de cursos sobre vinhos, o que é que eu estou fazendo aqui? A vida é cheia de contradições. E lá vou eu, logo em minha primeira coluna, me contradizer. Acredito que, para melhor apreciar o vinho, o ideal é entender da bebida.
O conhecimento sobre o vinho nos leva a construir uma relação mais estreita com ele, permitindo-nos extrair de cada taça todas as informações possíveis, potencializando nossa experiência sensorial. E, não nos esqueçamos, esse saber nos concederá valorizar o nosso investimento financeiro.
Conhecimento e litragem. Consumir bem é consumir com moderação.
Três taças de vinho com o enólogo Douglas Chamon
1 – O vinho esteve presente na sua casa? Como foi a transição de enófilo para enólogo?
Ainda jovem conheci o vinho fino e me apaixonei. Por 30 anos foram degustações e visitas a países produtores, incluindo o Brasil. Amo o que faço, e depois de curtir a economia, foi a vez da enologia, para me aprofundar cientificamente e viver a emoção do parreiral e da cantina.
2 – O que é preciso ser feito para introduzir o vinho na cultura do brasileiro e para que se dê maior valor ao produto nacional?
Não adianta impor ao Brasil o consumo europeu, pois somos um país tropical. Precisamos aceitar que o vinho fino se restringirá a uma parcela da população, favorecendo a produção interna e a importação – para que esse consumidor tenha acesso a bons produtos.
O consumo do vinho fino brasileiro aumentará, como vem acontecendo, quando os enófilos tiverem acesso a ele, pois degustarão um produto com a mesma qualidade mundial. É o que faço em meu projeto Compras Coletivas, aproximando a vinícola do consumidor com bons preços e facilidade de entrega.
3 – Fale um pouco do seu Projeto de Vinificação em Grupo
A primeira edição, na safra 2017, contou com 46 membros, que aportaram recursos para o processamento de 4 toneladas de Barbera Piemonte, Cabernet Sauvignon e Merlot. Reunidos via internet, recebem informações ao vivo da uva no parreiral, da vinificação, do amadurecimento em tanques e barricas, do envase à entrega dos vinhos. Essa dinâmica ampliou o grupo para 190 membros na safra 2018, cujos recursos compraram 11 toneladas de seis cultivares. Na safra deste ano são 273 participantes, R$ 280 mil arrecadados para o processamento de 24 toneladas de 10 cultivares. Uma das motivações no desenvolvimento do projeto foi superar a frustração que eu tinha como enófilo, pois me sentia distante da produção, do enólogo e da enologia.
Agenda
19/06/2019 (quarta-feira) – Enoteca Decanter (CLS 103): Wine Tasting Argentina X Uruguai, às 19h. Investimento: R$ 100 por pessoa, sendo R$ 30 revertidos para compras no dia do evento. Mais informações: (61) 99902-8680 (Ayrton Gissoni)
25/06/2019 (terça-feira) – 2ª Edição do Dia do Vinho, das 19h30 às 23h, no restaurante Ticiana Werner (CLS 201), em parceria com a importadora Del Maipo. Cento e doze rótulos diferentes e bufê de antepastos. Preço: R$ 250. Mais informações no site
25/06/2019 (terça-feira) – Estação dos Vinhos (CLN 413). Rótulos e queijos artesanais de produtores da região. Também realiza uma degustação às cegas em que o cliente bebe quatro vinhos, de quatro uvas diferentes (50 ml de cada), por R$ 35 – sendo R$ 15 convertidos em descontos na compra de uma das garrafas provadas. Por mais R$ 15, é possível fazer a degustação com empanadas argentinas. Mais informações: (61) 3201-6886