Uma vez que poucos o defendem, Bolsonaro sai em seu socorro
Ele diz ter procurado meios dentro da Constituição para “resolver um problema”
atualizado
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Que tal? Pela primeira vez na história do Brasil, um ex-presidente eleito no período democrático é indiciado como responsável por tramar um golpe contra a democracia.
Pelo ineditismo da situação, e as provas reunidas contra ele pela Polícia Federal, Bolsonaro deveria calar-se e deixar que bons advogados cuidassem da sua defesa.
Mas ele não se cala. E provocado a falar por jornalistas, só diz idiotices e se complica ainda mais. Voltou a acontecer ontem, depois de alguns dias de repouso no litoral de Alagoas.
“Essa história de assassinato de autoridades, foi jogado. Não cola isso daí. Não sou jurista, quando começa um crime ou termina. No meu entender, nada foi iniciado”, disse ele.
“Não podemos começar agora a querer punir um crime de opinião”, ele disse, repetindo com outras palavras o que dissera seu filho Flávio Bolsonaro: “Pensar em matar alguém não é crime.”
A declaração de Flávio já foi rebatida pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal: o que a Polícia Federal descobriu aponta para “plano de execução e não mera cogitação”.
Bolsonaro esqueceu que em julho de 2022 reuniu seus ministros, afirmou que a eleição estava perdida e consultou-os sobre o que fazer? E que depois até sugeriu mudanças em minutas do golpe?
A justiça concluiu que as eleições foram limpas, mas Bolsonaro, agora, admite que mesmo assim estudou a possibilidade de decretar Estado de sítio para “resolver o problema”.
Qual problema? O de passar o cargo para Lula, presidente legitimamente eleito e diplomado pela justiça no dia 12 de dezembro daquele ano? O golpe estava marcado para o dia 15.
Os militares encarregados de matar Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes estavam armados e a postos. A ação foi abortada porque não localizaram Moraes.
De resto, Lula viajara a São Paulo, e os executores do plano não sabiam. Na verdade, Bolsonaro arregou porque uma parte do Alto Comando do Exército não aderiu ao golpe.
Se a maioria dos generais tivesse concordado com o golpe, uma junta militar assumiria o poder e, conforme o plano, convocaria novas eleições para que Bolsonaro as disputasse.
Desde quando os generais dariam um golpe para que um ex-capitão permanecesse no poder? Só Bolsonaro, um sujeito esperto, mas pouco inteligente, acreditaria numa coisa dessas.
“Todas as medidas dentro das quatro linhas da Constituição eu estudei”, insiste Bolsonaro. “Procurei saber se tinha alguma forma dentro da Constituição. Não teve como resolver? Descartou-se.”
“Alguma forma dentro da Constituição” para quê? Para impedir a posse de Lula? Por qual razão, se a justiça não encontrou nenhuma e o diplomou? Ou Bolsonaro se sentia acima da justiça?
Isso seria um golpe de qualquer jeito. Diz Bolsonaro que “ninguém dá golpe em um domingo, em Brasília, com pessoas com bíblias debaixo do braço e bandeira do Brasil na mão”.
Aí ele se refere ao outro golpe, o de 8 de janeiro de 2023, quando bolsonaristas acampados à porta do QG do Exército invadiram a Praça dos Três Poderes para destruir prédios públicos.
Se o golpe de dezembro tivesse dado certo, o de janeiro seria dispensável. Centenas de vândalos foram presos e condenados pelo segundo golpe. Cabe fazer o mesmo com os golpistas de dezembro.
“Eu posso ser preso agora, ao sair daqui [do aeroporto de Brasília]”, disse Bolsonaro. Por enquanto, é improvável que seja, a não ser que se empenhe em eliminar provas do golpe.