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Supremo Tribunal mantém a liberdade de imprensa, pero no mucho

O problema é o guarda da esquina

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Daniel Ferreira/Metrópoles
Estátua STF  – Brasília(DF), 15/09/2017
1 de 1 Estátua STF – Brasília(DF), 15/09/2017 - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

“Roma locuta, causa finita” é uma frase latina que significa literalmente em português: Roma falou, o caso está encerrado. A expressão é usada para indicar que um determinado assunto foi resolvido por alguém que possui autoridade incontestável.

O Supremo Tribunal Federal é o órgão que representa a instância máxima do Poder Judiciário brasileiro. Atua como defensor da Constituição Federal. Seja para acertar ou errar, é dele a última palavra sobre o que é constitucional ou inconstitucional.

Em 1995, o Diário de Pernambuco entrevistou o delegado Wandenkolk Wanderley, que acusou Ricardo Zarattini Filho de participar de um atentado a bomba no Aeroporto dos Guararapes, no Recife, em 1966, durante a ditadura militar.

A defesa de Zarattini Filho alegou que a acusação não era verdadeira e processou o jornal, cobrando indenização. O pedido foi julgado procedente pelo Superior Tribunal de Justiça; o jornal recorreu da decisão e o caso foi julgado, ontem, pelo Supremo.

Uma nota da assessoria do Supremo explicou a decisão tomada pela maioria dos ministros (9 x 2):

“Como regra geral, se um jornal divulga entrevista em que uma pessoa, sem ter provas, diz que outra praticou um crime, eventual indenização devida ao ofendido deve ser paga por quem fez a acusação falsa, não pelo veículo de comunicação. Em situações muito excepcionais, porém, a empresa jornalística pode ser condenada a pagar a indenização desde que comprovada a má-fé (dolo efetivo) ou culpa grave do jornal na divulgação da entrevista.

Para que isso ocorra, é preciso que a pessoa falsamente acusada de crime comprove que, na época da publicação da entrevista, o jornal (1) já sabia das fortes evidências de que a acusação era falsa e (2) não adotou os cuidados para divulgar aos seus leitores que a acusação do entrevistado era, no mínimo, duvidosa”.

O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do tribunal, achou por bem acrescentar à nota o seguinte comentário:

 “O veículo não é responsável por declaração de entrevistado a menos que tenha havido uma grosseira negligência relativamente à apuração de um fato que fosse de conhecimento público”.

O que é uma “situação muito excepcional” que obrigaria o jornal ou qualquer outro veículo de comunicação a pagar indenização a alguém que se considerasse ofendido pelo que disse um entrevistado? Não há definição legal a respeito.

O que são “fortes evidências”  de que à época da publicação da entrevista o jornal já soubesse que as acusações feitas pelo entrevistado eram comprovadamente falsas, mas ainda assim as publicou, incorrendo, portanto, no mesmo crime?

A partir de agora, como proceder com entrevistas ao vivo? O entrevistador ignora como suas perguntas serão respondidas. E se o entrevistado mentir e ofender quem quer que seja? Para não ser processado, o melhor é acabar com as entrevistas ao vivo.

O fato é que fazer jornalismo à luz da nova regra se tornará mais arriscado, difícil e perigoso. É um convite à autocensura.  Em 1992, o então presidente Fernando Collor começou a cair depois que a revista Veja publicou uma entrevista com seu irmão Pedro.

Sem dispor de provas, apenas de indícios, Pedro acusou o irmão de ser corrupto. Era o irmão do presidente da República contando o que se falava nos bastidores da política. O Congresso aprovou o impeachment de Collor. O Supremo o absolveria anos mais tarde.

Em 2005, também sem dispor de provas, mas se apresentando como um dos protagonistas do episódio, o deputado Roberto Jefferson detonou em entrevista à Folha de São Paulo o que entraria para a história como o escândalo do mensalão do PT.

Na noite de 13 de dezembro de 1968, dia de Santa Luzia, a padroeira dos cegos, o Conselho de Segurança Nacional reuniu-se em Brasília para votar o Ato Institucional nº 5, o mais violento dos atos da ditadura militar implantada no país quatro anos antes.

Um único membro do Conselho votou contra: o vice-presidente Pedro Aleixo. Como civil, advogado e jornalista, ao se dirigir ao general e presidente Costa e Silva, Aleixo cunhou a seguinte frase:

“O problema é o guarda da esquina.”

No caso da nova regra imposta ao exercício do jornalismo no Brasil, o problema não  é o Supremo Tribunal Federal, mas o juiz da primeira instância.

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