Se for solto antes de delatar, Mauro Cid corre o risco de ser morto
À espera do apocalipse bolsonarista
atualizado
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O futuro de Bolsonaro e do bolsonarismo depende do que contar à Justiça o tenente-coronel Mauro Cid, preso desde o início de maio no Batalhão do Exército de Brasília comandado pelo tenente-coronel Bruno Fett, seu amigo. Fett formou-se na turma de 1999 da Academia Militar de Agulhas Negras, Bolsonaro na seguinte.
Onde está hoje, o ex-ajudante de ordem de Bolsonaro está seguro. Caso seja solto antes de delatar, sua vida correrá perigo, segundo ouvi de um ministro de Estado sinceramente preocupado com a situação de Mauro Cid. O tenente-coronel é dono de segredos que Bolsonaro gostaria que fossem sepultados com ele.
Não é o que dizem os auxiliares mais próximos de Bolsonaro. O advogado Fábio Wajngarten, que representa Bolsonaro, teve a desfaçatez de afirmar: “Não há absolutamente nada que o tenente-coronel Cid possa delatar que se relacione com o presidente”. É mesmo? Então, por que a pressão para que ele se cale?
Mauro Cid simplesmente se propõe a falar sem filtros sobre as tentativas abortadas de golpe militar; a falsificação de atestados de vacina contra a Covid-19; o roubo de joias dadas de presente ao Brasil por governos estrangeiros; e as finanças obscuras de Bolsonaro e de sua mulher, Michelle, nos últimos quatro anos.
O que contar sobre um único desses tópicos bastará para condenar Bolsonaro e remetê-lo à prisão. Bolsonaro já foi preso à época em que servia ao Exército, e serviu mal. Uma vez, quando presidente, chorou ao relembrar os poucos dias de detenção e ao admitir que tem medo da eventual prisão de um dos seus filhos.
Uma coisa é Bolsonaro estar inelegível por oito anos, podendo circular por aí como um “cabo eleitoral de luxo” do seu partido, o PL, a encher o bolso de dinheiro doado por seus devotos. A doação também está sendo investigada. Outra coisa seria ele pegar alguns anos de cadeia, deixando desprotegidos a mulher e os filhos zero.
Bolsonaro usou e abusou da sorte de se eleger presidente. Foi o presidente mais improvável da história recente do país. Seu maior adversário, e líder das pesquisas de intenção de voto, estava preso, e assim permaneceu por 580 dias. Lula foi preso em abril de 2018. Bolsonaro se elegeu no fim de outubro do mesmo ano.
O instituto da colaboração premiada está previsto na lei das organizações criminosas e estabelece que um colaborador – o que Cid se oferece para ser – ”deve narrar todos os fatos ilícitos para os quais concorreu e que tenham relação direta com os fatos investigados”. Além de narrar, tem que provar o que disser.
Em artigo publicado no site Conjur em 2018, o advogado de Mauro Cid, Cezar Bitencourt, escreveu que o delator “não é melhor que nenhum dos demais membros da organização criminosa”. Pelo contrário, só é mais mau-caráter e traidor de seus comparsas”. À Folha de S. Paulo Bittencourt diz que não mudou de opinião:
“Mas a minha concepção doutrinária não pode prejudicar o meu cliente. A delação é um instituto jurídico aceito e reconhecido pela Justiça. Eu seria um imbecil se não o utilizasse para beneficiar o meu cliente”.
Na última quarta-feira (6), Bittencourt e seu cliente procuraram o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, e oficializaram o pedido de delação premiada em troca de uma pena mais leve. Moraes, em 2021 chamado de “canalha” por Bolsonaro, ficou de responder ao pedido na próxima semana.
“Dura Lex sed lex”. (A lei é dura, mas é a lei.)