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Rachadinha, um fantasma do passado, volta a assombrar Bolsonaro

Irmã da segunda mulher do presidente da República conta como os Bolsonaro ficavam com o dinheiro dos seus empregados

atualizado

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Reprodução/Foco do Brasil/YouTube
bolsonaro no cercadinho
1 de 1 bolsonaro no cercadinho - Foto: Reprodução/Foco do Brasil/YouTube

Foi por sua irrelevância política à época como deputado federal que o ex-capitão Jair Bolsonaro, embora filiado a partidos do Centrão, ficou de fora dos esquemas de desvio de recursos públicos que tantos prejuízos causaram ao país. Alguns dos esquemas acabaram descobertos e viraram escândalos. Pouca gente foi punida.

A ambição de Bolsonaro por dinheiro era conhecida desde os seus anos como militar e pesou na decisão do Exército de obrigá-lo a tirar a farda. Como vereador e mais tarde deputado, para enriquecer, ele se valeu da expropriação de parte dos salários que a Câmara pagava aos funcionários do seu gabinete.

É de rachadinha que se trata. Ao empregar servidores que não trabalhavam, e outros que, apesar de trabalharem, devolviam ao patrão o grosso do dinheiro pago a título de salário, Bolsonaro e seus filhos zero construíram um patrimônio milionário que ainda está por ser mais bem avaliado, se é que será um dia.

Depois de duas semanas de sufoco com a denúncia da compra superfaturada de vacinas contra a Covid-19, Bolsonaro foi surpreendido pelo fantasma da rachadinha, que parecia adormecido, mas agora despertou outra vez e volta a assombrá-lo. Mais uma culpa que ele, naturalmente, jogará nas costas da imprensa.

É o que costuma fazer quando não tem ou não pode dar explicações ao distinto público sobre qualquer coisa. O distinto público não é todo mundo, limita-se aos devotos sempre dispostos a acreditar no que ele disser. Está bonito de ver nas redes sociais os bolsonaristas argumentarem que todo político faz rachadinha.

Nem todos fazem. Os que fazem são criminosos. Porque é crime empregar funcionários que não trabalham. É crime subtrair dos que trabalham uma fatia do que ganham. É crime que tal dinheiro vá parar no bolso dos que não deveriam recebê-lo. Afinal, dinheiro público não cai do céu, sai do bolso dos que pagam impostos.

Os áudios atribuídos pelo site UOL à fisiculturista Andrea Siqueira Valle, irmã da segunda mulher de Bolsonaro, Ana Cristina Siqueira Valle, dão conta do gigantesco esquema da rachadinha montado por Bolsonaro no seu e nos gabinetes de pelo menos dois dos seus filhos zero, o atual senador Flávio e o vereador Carlos.

No primeiro trecho do áudio, ela fala do irmão, André Siqueira Valle, empregado no gabinete de Bolsonaro em 2006. Ele ficou pouco tempo por lá porque não seguiu ao pé da letra a regra de ouro de devolver o que havia sido combinado. Foi o próprio Bolsonaro quem o demitiu. Andrea com a palavra:

“O André dava muito problema porque o André nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6 mil, o André devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil. Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: ‘Chega. Pode tirar ele porque ele nunca devolve o dinheiro certo’”.

Andrea fez parte da folha de pagamento do gabinete de Bolsonaro na Câmara de setembro de 1998 a novembro de 2006. Depois, seguiu para o gabinete do então deputado Flávio, onde ficou até 2018. O Ministério Público do Rio apurou que 10 parentes de Ana Cristina sacaram em dinheiro vivo um total de R$ 4 milhões.

A palavra, de novo, com Andrea:

“Não é pouca cosia que eu sei não. É muita coisa que eu posso ferrar a vida do Flávio, posso ferrar a vida do Jair, posso ferrar a vida da Cristina [a irmã dela]. Entendeu? Então, é por isso que eles têm medo e aí mandam eu ficar quietinha, não sei o que, tal. Entendeu?”  [Flávio exonerou Andrea em outubro de 2018.]

Outro arquivo de áudio relata um pedido de ajuda a um tio de Andrea chamado Hudson, identificado pelo UOL como o coronel da reserva do Exército Guilherme dos Santos Hudson, colega de Jair Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras e encarregado de recolher o dinheiro da rachadinha. Segue Andrea:

“O tio Hudson também já até tirou o corpo fora porque quem pegava a bolada era ele. Quem me levava e me buscava no banco era ele. Na hora que estava aí fornecendo também, e ele também estava me ajudando, lógico, e eu também estava porque eu ficava com R$ 1 mil e pouco, e ele ficava com R$ 7 mil reais.”

O terceiro áudio traz a voz de Márcia Aguiar, mulher de Fabrício Queiroz, apontado pelo Ministério Público do Rio como o operador da rachadinha no gabinete de Flávio quando ele era deputado estadual do Rio. Márcia comenta com a filha, Nathalia, que o marido ainda pensava em voltar a circular entre políticos:

“É que ainda não caiu a ficha dele que agora voltar para a política, voltar para o que ele fazia, tão cedo, esquece. Aí bota anos para ele voltar. Até porque o Zero Um, o Jair, não vai deixar. Tá entendendo? Não pelo Flávio, mas enfim. Ele ainda não caiu essa ficha dele. Fazer o quê?”

Em fevereiro último, o Superior Tribunal de Justiça anulou todas as provas obtidas a partir dos dados bancários e fiscais dos envolvidos nas rachadinhas no gabinete de Flávio Bolsonaro. O caso subiu para o Supremo Tribunal Federal e ali parou. Não há data marcada para que seja julgado.

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