Por que Mauro Cid decidiu cantar, cantar até perder a voz se for o caso
Delatar, jamais, seria vergonhoso. Apenas colabora com a Justiça
atualizado
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De trás para frente: não foi porque, de repente, tenha se convencido de que só a verdade liberta. Para ele, para tantos, a verdade é uma coisa relativa, algo que obedece às circunstâncias. Se for conveniente, ela deve ser dita, do contrário, escondida.
Mauro Cid, ex-ajudante de ordem de Bolsonaro nos últimos quatro anos, não decidiu contar parte do que sabe à Polícia Federal porque só agora, e com atraso, reconhece que o ex-presidente a quem serviu com tamanho zelo pôs a democracia em perigo.
Por mais que, com aquela carinha e penteado, pareça um idiota, com ar de adolescente desligado do mundo ao seu redor, ele teve que estudar muito para chegar a tenente-coronel. Em algum momento, aprendeu a distinguir democracia de ditadura.
Não aprendeu que o golpe de 64 que suprimiu a democracia foi um golpe porque isso não se ensina nas academias militares; muito menos que fez um tremendo mal ao país, porque isso também não se ensina. Mas ali também não se ensina que golpe é coisa boa.
Ensina-se, de maneira errada, que o artigo 142 da Constituição confere às Forças Armadas o papel de intervir sempre que a ordem pública estiver ameaçada. Noutras palavras: a missão de tutelar o Poder Civil, e não de serem tuteladas por ele.
Também não foi porque se arrependeu de ter feito do seu pai, o general Mauro Cesar Lourena Cid, um muambeiro de joias roubadas por Bolsonaro do Estado brasileiro, e de ter se transformado, ele mesmo, em muambeiro. Não foi por isso.
Mauro Cid decidiu cantar, cantar porque concluiu que Bolsonaro estava prestes a repetir com ele o que fez com tantos outros: cortar-lhe a cabeça para salvar a sua. Talvez Mauro Cid tenha imaginado que com ele não seria assim. Enganou-se. Seria.
Por meio de terceiros, Bolsonaro tentou acalmar Mauro Cid, garantindo-lhe que estavam juntos, que sempre estariam juntos, e que por isso fechasse o bico. Até que avistou uma casca de banana do outro lado da rua e resolveu ir pisá-la, como de costume.
Foi quando Bolsonaro disse que Mauro Cid tinha autonomia para tomar decisões sem consultá-lo. Decisões sobre pagamento de despesas com o cartão corporativo da Presidência, manejo de presentes e trocas de mensagens sobre o que bem entendesse.
Bolsonaro tirou o seu da reta, pôs na reta o de Mauro Cid, o do pai de Mauro Cid, e o de quem mais necessário fosse. Nada de excepcional na trajetória de um covarde. Só que Mauro Cid pensou que com ele seria diferente. Não foi. O amor engana. Taí.