O que ganha Bolsonaro ao negar às crianças a vacina contra a Covid
Era uma vez um escorpião que convenceu um sapo a transportá-lo para a outra margem de uma lagoa. No meio da viagem, picou-o e se afogaram
atualizado
Compartilhar notícia
Bolsonaro quer saber para expor à sanha dos seus devotos o nome dos técnicos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que deram parecer favorável ao início da vacinação contra a Covid-19 de crianças entre os 5 anos e os 11. Ele é contra a medida.
Como foi contra a compra de vacinas, e retardou-a o mais que podia. Como deve ser o único chefe de Estado que ainda não se vacinou. Contraiu o vírus uma vez, mas preferiu tomar cloroquina na veia e recomendá-la aos que lhe dão ouvidos.
No combate à pandemia, fez todas as apostas erradas, não por ter sido mal assessorado, mas porque só quis acreditar no que atendia aos seus propósitos. Ao invés de adotar medidas severas de isolamento social, deixou morrer os mais vulneráveis à doença
Na sua nada santa ignorância, temeu que o isolamento prejudicasse a economia, o que poderia impedi-lo de se reeleger. Se ao invés de conceder passe livre à circulação do vírus o tivesse combatido, dificilmente haveria candidato capaz de derrotá-lo.
Está numa sinuca de bico quase impossível de ser superada. Na pesquisa espontânea, quando o eleitor responde de memória sobre em quem votaria, segundo o Ipec (ex-Ibope) ele perde para Lula por 40% a 20%; e segundo o Datafolha, por 32% a 18%.
A rejeição a Bolsonaro é a mais alta entre os candidatos nas duas pesquisas divulgadas esta semana. É de 55% contra 28% de Lula na pesquisa Ipec, e de 60% contra 34% de Lula na pesquisa Datafolha. São eleitores que dizem que jamais votariam nos dois.
Em um país que já enterrou mais de 617 mil pessoas vítimas da Covid-19, a essa altura, o que Bolsonaro teria a ganhar se opondo à vacinação de crianças? Não é sobre tornar a vacinação obrigatória, mas como facilitar o acesso das crianças aos imunizantes.
Sabedor de que o Ômicron, a nova variante do vírus, mais transmissível do que letal, espalha-se pelo mundo e chegou por aqui, por que Bolsonaro tenta barrar a exigência do passaporte de vacina para os estrangeiros que queiram entrar no Brasil?
Manter-se na contramão do que pensa a esmagadora maioria dos brasileiros só beneficiará Bolsonaro se ele estiver conformado em ficar de fora do primeiro turno da próxima eleição. Não parece que esteja. Então, o que pode explicar seu comportamento?
Remete à fábula do escorpião e do sapo que o carregou nas costas para atravessar uma lagoa. Escorpião é um bicho venenoso e traiçoeiro. O sapo prestou-se a transportá-lo porque não faria sentido o escorpião picá-lo e os dois morrerem afogados.
Foi picado. Prevaleceu a natureza assassina do escorpião.