O que disse Barra Torres à CPI da Covid calou Bolsonaro
O presidente perdeu a voz porque não esperava um depoimento tão contundente. General Eduardo Pazuello quer proteção da justiça para ir depor
atualizado
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De manhã, antes do início do depoimento à CPI da Covid-19 no Senado do contra-almirante Antonio Barra Torres, presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Jair Bolsonaro fez o de costume antes de ir trabalhar: reuniu-se nos jardins do Palácio da Alvorada, onde mora, com um grupo de devotos, e deitou falação. Entre outras coisas, chamou jornalistas de “canalhas”.
No meio da tarde, informado sobre o que dissera Barra Torres, e ainda dizia, perdeu a voz. Nem sequer discursou, como estava previsto, na cerimônia em que o governo anunciou a liberação de mais dinheiro para a área da Saúde e para o socorro aos brasileiros pobres atingidos pela pandemia. Aquela seria uma ocasião para faturar politicamente, mas ele não o fez. Parecia bufar de tão furioso.
Não era por menos. Foi até aqui o depoimento que mais afrontou o governo e pessoalmente o presidente da República. Os dos ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich saíram conforme o previsto, assim como o de Marcelo Queiroga, o atual ministro, que poupou o governo e Bolsonaro dos maiores embaraços. Queiroga mentiu e sonegou informações.
Barras Torres, não. Ele confirmou que, no início da pandemia, houve uma reunião, no Palácio do Planalto, para discutir uma mudança na bula da cloroquina. Disse que não concorda com uso de cloroquina no suposto tratamento precoce do vírus. Defendeu o uso de máscaras e testagem em massa, e afirmou que falas de Bolsonaro sobre vacinas atrapalham o combate à pandemia.
Quer mais? Disse estar arrependido de ter aparecido ao lado de Bolsonaro em manifestação antidemocrática. O ato ocorreu em março de 2020. Considerou “inadequado” o passeio de moto feito pelo presidente no último domingo. E deu em Bolsonaro uma cutucada que ele jamais esquecerá: “No meio militar, o que causa mais irritação é o cidadão que quer ser algo que não é”.
Cercado de militares vassalos que só lhe dizem amém, Bolsonaro deve ter imaginado que Barras Torres se comportaria como eles. Como o general Eduardo Pazuello, por exemplo, adepto da teoria do manda quem pode, obedece quem tem juízo. Pazuello irá depor à CPI na próxima quarta-feira, se possível protegido por um habeas corpus que pedirá à Justiça, para calar-se ou falar pouco.
Tem tudo para ser comparado com Barras Torres e sair de lá execrado, ao contrário do seu colega de farda.