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No país da hipocrisia, maconha e aborto é só para quem pode

Joe Biden, o bom velhinho, é a favor de liberar as duas coisas

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Paulo Pinto/ Agência Brasil
Mulher durante manifestação a favor da legalização da maconha STF
1 de 1 Mulher durante manifestação a favor da legalização da maconha STF - Foto: Paulo Pinto/ Agência Brasil

Fui apresentado à maconha quando era repórter no Recife da extinta revista Manchete, no início dos anos 1970. Estava em Petrolina, no sertão de Pernambuco, a caminho de Salgueiro, dali distante quase quatro horas de carro, para fazer uma reportagem, já não me lembro sobre o quê.

Era noite, e o fotógrafo que me acompanhava, Bráulio Pinho, ofereceu-me um cigarro. Não quis experimentar, mas ele insistiu. Puxei o fumo duas ou três vezes. Bastou para que começasse a ver índios pele-vermelha, a cavalo, atravessando a estrada. Assustei-me, mas não passei recibo.

À época, quem fumava maconha era chamado de maconheiro e sujeito à prisão. No bairro onde morava, o de São José, havia um bando de maconheiros liderados por Bolinha. Os chefes de família fechavam as portas à passagem deles. Nunca os vi criando confusão.  Levavam a vida numa boa.

A segunda vez que provei um baseado foi três anos depois, na orla de Fortaleza, e de novo a serviço da Manchete. Acabara de assistir a um show de uma turma de músicos que começava a fazer sucesso – entre eles, Fagner e Ricardo Bezerra. A turma se tornaria conhecida como “O pessoal do Ceará”.

O fotógrafo Tadeu Lubambo me ofereceu o “bagulho”. Depois de um tempo, eu estava com a boca seca, faminto e ria das coisas mais sem graça. Foi Lubambo, quando fazíamos em Morro Branco, no Ceará, uma reportagem sobre mulheres rendeiras, que me levou a fumar pela terceira e última vez.

Gostei e não gostei. Mas com receio de vir a gostar muito e de me tornar dependente, nunca mais fumei. Voltei a me sentir estranho quando, em 1979, cobri o carnaval de Salvador para a revista Veja. Na Praça Castro Alves, à falta de cocaína, valia cheirar desodorante e fornicava-se a céu aberto.

A Veja pretendia dar a reportagem de capa para ilustrar o que chamaria de carnaval da abertura política, embora a ditadura ainda existisse. Mas o que eu e o jornalista Bob Fernandes reportamos chocou a direção da revista e nada foi publicado. Vem de longe o conservadorismo dos paulistas.

No país da hipocrisia, onde fuma-se maconha em toda parte, da Praça dos Três Poderes, hoje restaurada depois do assalto dos golpistas, até o cafundó do judas, a justiça hesita em despenalizar pequena quantidade da droga para consumo de usuários, enquanto o Senado está pronto para proibir.

Bebida alcoólica, causa de milhares de mortes, pode ser consumida à vontade, desde que não se dirija. O cigarro comum, que também mata, pode ser queimado em áreas restritas. O consumo da “pantera” inocente mandará quem para a cadeia? O menino do Rio, dos Jardins, do Plano Piloto?

Nenhum deles. De preferência, os meninos das áreas pobres das grandes cidades, os negros, alvos constantes das polícias, e os desassistidos juridicamente pelo Estado. Dali sairão desempregados; uma mão de obra barata para o crime organizado. Com a vantagem de ter acesso ao fumo.

O aborto virou direito assegurado pela Constituição francesa. Aqui, a mulher que o fizer poderá ser presa, não qualquer uma. A Suprema Corte americana revogou o direito ao aborto. O presidente Joe Biden, candidato à reeleição, prometeu restaurar o direito abortado, e, ontem, no X, foi além:

“Ninguém deveria ser preso apenas por usar ou possuir maconha”.

Biden está à caça de votos. Lula, que por ora não está, assiste a tudo calado para não perder os que tem.

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