Não haverá paz no Oriente Médio com o atual governo de Israel
Foi isso que Lula não soube dizer
atualizado
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Dá-se pouca atenção até aqui em Israel à crise desatada por seu governo com o Brasil. Em discurso recente na Etiópia, Lula comparou o tratamento oferecido, hoje, pelo governo de extrema-direita de Israel aos palestinos ao tratamento dado ao povo judeu por Adolf Hitler durante a 2ª Guerra Mundial. Para quê fez isso?
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu reagiu com sete pedras nas mãos e acusou Lula de negar o Holocausto, que matou mais de 6 milhões de judeus, ciganos, poloneses e outras minorias. No dia seguinte, simplesmente o ministro das Relações Exteriores de Israel declarou Lula persona non grata no país, algo inédito.
No passado, em um congresso sionista, Netanyahu relativizou a culpa de Hitler na morte em escala industrial dos judeus. Para isso, reescreveu a história afirmando que foi um líder religioso mulçumano de Jerusalém quem deu a Hitler a ideia da Solução Final. A intenção de Hitler, de início, seria expulsar os judeus da Europa, segundo Netanyahu.
A crise Israel-Brasil subiu de tom depois que o chanceler israelense Israel Katz, à direita da direita de Netanyahu, se é que isso é possível, humilhou Frederico Meyer, embaixador do Brasil em Tel Aviv. Meyer foi atraído para o Museu do Holocausto e ouviu de Katz uma reprimenda a Lula, em hebraico. Uma cena sob medida para as redes sociais.
Netanyahu é prisioneiro dos partidos extremistas que fazem parte do seu governo e que ameaçam abandoná-lo se ele os desgostar. Se isso acontecesse, o governo cairia e haveria eleições para a escolha de um novo primeiro-ministro. Como mudar o governo com um país em guerra? É nisso que Netanyahu se fia.
Mas ele sabe que na história de Israel jamais um líder manteve-se no alto depois de um fracasso militar. Netanyahu fracassou quando o Hamas, grupo que governa ou governou a Faixa de Gaza, invadiu Israel em 7 de outubro do ano passado, matou 1.200 pessoas, entre militares e civis, e sequestrou cerca de 160.
Os dias de Netanyahu como primeiro-ministro estão contados. A não ser, como ele aposta, que ganhe a guerra a qualquer preço, ocupe para sempre a Faixa de Gaza, partes da Cisjordânia e do Líbano, blindando Israel de uma vez por todas. Mas, por quanto tempo? Pela vida eterna? Impensável. Os países árabes não permitiriam.
A pressão interna, liderada pelas famílias dos sequestrados, empurra Netanyahu para as cordas. O apoio dos Estados Unidos e da Europa ao seu governo balança, balança, e a cada balanço diminui. A solução dos dois Estados, o de Israel e o palestino, ganha força. Daí porque Netanyahu radicaliza cada vez mais. Viu em Lula mais um inimigo.
O exército de Israel já matou quase 30 mil palestinos. Acredita-se que mais de dois terços dos mortos na Faixa de Gaza sejam mulheres e crianças. Acredita-se que outros milhares estejam soterrados sob os escombros. Está em jogo a reputação do Ocidente como defensor dos valores universais e de uma ordem baseada em regras.
Esta é uma guerra que o atual governo de Israel já perdeu. A situação dos combates em Gaza sugere que é remota a possibilidade de Israel desferir um golpe de misericórdia no Hamas. Estima-se que menos de um terço da força militar do Hamas foi morta ou capturada. Terminar o trabalho só a um custo indefensável de vidas palestinas.
A guerra tem que ser suspensa, os sequestrados devolvidos, dando início ao processo de criação do Estado palestino. Mas nada disso parece realizável com Netanyahu e seus sacripantas no governo. Foi isso, com outras palavras, que Lula quis dizer, mas não soube. Não tinha que meter o Holocausto no meio disso.