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“Ninguém se perde no caminho de volta”. Não me perguntem o nome do autor da frase acima. Morro, mas não digo. Porque citá-lo atrai desgraças. Os antigos sabem disso.
Nos anos 70, quando era repórter da revista MANCHETE, acompanhei o ex-presidente JK em viagem de carro entre Recife e João Pessoa, onde o autor da frase morava à beira mar.
JK queria o voto dele para entrar na Academia Brasileira de Letras. Tratava-se, pois, de um acadêmico – e já me arrisco muito em avançar em tal relato. Vai que me distraio e digo o nome…
Pois bem: além de bater três vezes em um objeto de madeira antes e depois de conversar com ele, JK conseguiu a proeza de não pronunciar seu nome em instante algum.
Gastou todo seu estoque de adjetivos – “grande” isso, “ilustre” aquilo, “extraordinário” escritor, porém não se referiu a ele pelo nome. O autor da frase prometeu votar em JK. Não votou. JK não se elegeu para a Academia porque lhe faltou um voto
Mas todo esse lenga-lenga é só para dizer que a frase “Ninguém se perde no caminho de volta” se aplica sob medida ao ex-governador de Pernambuco e atual deputado federal Roberto Magalhães.
Magalhães está de volta ao PFL. Pela terceira vez. Primeiro, ele foi da Arena, partido criado pela ditadura militar para apoiá-la. Depois foi para o PDS, o novo nome da Arena quando a ditadura começou a claudicar.
Em seguida, ajudou a formar o PFL, dissidência do PDS que ajudou a eleger Tancredo Neves presidente da República em 1985 e a dar posse a seu vice, José Sarney.
(Creio que até os jovens leitores deste blog sabem quem foi Tancredo, assim como sabem que ele subiu a rampa do Palácio do Planalto dentro de um caixão, cedendo a vaga a Sarney.)
Do PFL, Roberto Magalhães foi para o PTB – e daí retornou ao PFL. Por um tiquinho de nada, não acabou no PDT. Aceitou o convite de Brizola para ser seu candidato a vice-presidente da República em 1989.
Na ocasião, foi presenteado por Brizola com as duas garrafas de vinho mais preciosas que repousavam em sua adega – e Brizola lamentaria a perda dos vinhos pelo resto da vida.
Ao desembarcar no Rio para sacramentar sua aliança com Brizola, Magalhães foi recepcionado no aeroporto por partidários da candidatura a presidente de Mário Covas, do PSDB.
Levado para a casa do jurista Afonso Arinos de Melo Franco, ali foi convencido a virar vice de Covas – e virou. Ficou menos de duas semanas no PSDB. Voltou ao PFL. Mais adiante, escapou outra vez para o PTB. E agora está novamente no PFL.
De alguma maneira, ao comportamento de Magalhães também se aplica outra frase – essa proferida pelo ex-ministro da Justiça do governo Sarney, Fernando Lyra:
– Ele só se perde no caminho de ida. O de volta sabe de cor.
Meu personagem inesquecível é Lyra, um dos melhores frasistas da política contemporânea. Em 1985, ao elogiar Sarney que acabara com a censura no país, Lyra disse sobre ele:
– É a vanguarda do atraso.
Ao falar sobre Fernando Henrique Cardoso que criticara Sarney às vésperas do anúncio do Plano Cruzado, Lyra afirmou:
– Eu pisei no tomate, mas Fernando Henrique pisou no tomateiro.
(Publicado aqui em 21 de dezembro de 2004)