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É universalmente tolerada a liberdade desfrutada pelos políticos de dizerem uma coisa e de fazerem outra. De mudarem de opinião com a mesma naturalidade com que mudam de roupa. De trocarem de lado como quem troca de gravata
No último dia 24 de outubro, ao celebrar na companhia dos comandantes militares o Dia do Aviador, Lula disse a eles que era favorável a manter “fechadinhos” os arquivos da ditadura de 64. Depois, bailou feliz nos braços de dona Marisa.
Nos últimos 20 dias, o governo emitiu sinais aparentemente convincentes de que mandará abrir os arquivos, sim. E de que todos os interessados terão acesso a eles. Começo a achar que me precipitei aqui outro dia ao festejar tais sinais.
Desconfio de que a abertura dos arquivos, se ocorrer, será parcial e pouco esclarecedora. O governo parece disposto a aceitar como verdadeira a história rocambolesca contada pela Aeronáutica de que os documentos destruídos na Base Aérea de Salvador ali foram introduzidos por quem desejava deixar mal os militares.
Quer dizer: não fariam parte de arquivos militares oficiais. Nem ali teriam sido incinerados por militares da ativa.
No fim da semana passada, o Exército comunicou mais uma vez ao governo que não guarda documentos sobre a Guerrilha do Araguaia promovida nos anos 70 pelo PC do B. E que não guarda mais, sequer, o comprovante de que eles foram destruídos. Também o comprovante teria sido destruído.
Se quiser, o governo poderá se contentar com as explicações e dar um jeito de tirar o assunto do noticiário. A mídia se cansa com facilidade de assuntos que se arrastam sem desfecho a curto prazo.
Se preferir, o governo poderá ir fundo na investigação ora em curso e tentar recuperar documentos perdidos ou dispersos, escondidos em arquivos oficiais ou particulares. E assim pagar a dívida pública que contraiu de resgatar parte de nossa história ainda oculta.
(Publicado aqui em 20 de dezembro de 2004)