E se a esquerda, derrotada, tivesse a pedir a anulação das eleições?
Ela seria ou não acusada de golpismo?
atualizado
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Derrotado por Fernando Collor no segundo turno da eleição de 1989, a primeira pelo voto popular desde o fim da ditadura militar de 64, Lula foi chorar suas mágoas no apartamento emprestado em que morava em São Bernardo do Campo, São Paulo.
Repetiu a dose em 1994 e em 1998 quando foi derrotado no primeiro turno por Fernando Henrique. Por mais que a presidente Dilma Rousseff tenha denunciado como golpe o processo de impeachment que a derrubou, ela não jogou a carta da sedição.
Participou de todas as fases do processo, defendeu-se o quanto pôde respeitando o que determinou o Supremo Tribunal Federal, acatou a decisão do Senado de cassar-lhe o mandato, mas não os direitos políticos, e foi para seu apartamento em Porto Alegre.
Lula fez tudo que estava ao seu alcance para não ser preso e condenado por crimes que jura nunca ter cometido. Ficou preso durante 580 dias, mas não pregou a sublevação de parte dos brasileiros inconformados com o seu infortúnio.
Acabou solto e reabilitado pelo Supremo Tribunal Federal, que julgou parcial a conduta do ex-juiz Sérgio Moro. Candidatou-se e se elegeu presidente pela terceira vez sem dar um passo além das quatro linhas da Constituição e falando em pacificar o país.
Mas, imagine só se ele tivesse sido derrotado, dissesse que a eleição fora comprada, e o PT estimulasse seus militantes a baterem às portas dos quartéis e a ocuparem as ruas pedindo a anulação dos resultados das eleições?
E se, pacificamente, o Movimento dos Sem Terra se juntasse aos petistas sublevados? E se caminhoneiros independentes, queixosos das condições em que vivem, bloqueassem estradas na contramão da lei que assegura o direito de ir e vir das pessoas?
Então, a esquerda faria por merecer o adesivo de “golpista” que a direita tenta aplicar-lhe desde a intentona comunista de 1935, sufocada em poucos dias. A partir daí, todos os golpes, bem ou mal sucedidos, carregam as impressões digitais da direita.
Uma das mentiras fundamentais do fascismo “é a ideia de que a ditadura é a forma mais verdadeira da democracia”, segundo o historiador americano Federico Finchelstein, autor do livro “Uma breve história das Mentiras Fascistas”, editado pela Vestígio.
“Os fascistas [acreditam] que suas mentiras [são] a prova de uma verdade mais profunda. O líder e a ideologia [são] para eles a evidência de que aquilo pelo que lutam representa uma verdade absoluta na qual acreditam e querem acreditar”.
Perguntem a qualquer bolsonarista que vagabundeia por aí a repetir que as eleições foram fraudadas se ele tem alguma prova do que diz. Prova não lhe interessa, basta a palavra e a ideologia do seu líder, e o desejo de acreditar que seja verdade.
É por isso que eles se dizem democratas, defensores da liberdade de expressão, embora defendam a ditadura.