Bolsonaro usa Michelle como escudo humano para não ser atacado
Presidente fala menos do que sua mulher em mensagem sobre o Natal. De nada adiantou: panelas bateram em várias cidades
atualizado
Compartilhar notícia
É ou não coisa de gênio fechar o ano mais tenebroso da recente história da Humanidade como potencial assassino de crianças? Ou, na versão mais amena, como o único chefe de Estado que se opôs à vacinação de crianças entre 5 e 11 anos de idade ameaçadas pela nova variante da Covid-19?
Bolsonaro comporta-se como se nadasse em um oceano de votos, a ponto de dar-se ao luxo de abrir mão de uma boa parte deles. Sabe, porém, que não é assim. Se a eleição fosse hoje, até João Doria (PSDB) o derrotaria, quanto mais Lula (PT), Ciro Gomes (PDT) e Sergio Moro (Podemos).
Dirigir-se à nação na companhia de sua mulher para desejar feliz Natal não foi só jogada de marketing político – – foi também de desespero. Ele está mal entre as mulheres que o rejeitam em grande maioria. Apresentar-se ao lado de Michelle quem sabe, por ora, não o pouparia de críticas mais acerbas?
O pronunciamento do casal presidencial durou 1 minuto e 34 segundos. Bolsonaro disse:
“Sob a proteção de Deus, chegamos a mais um Natal”.
Michelle emendou:
“Um tempo especial na vida de todos os brasileiros. Tempo de agradecer, construir e confraternizar”.
Na parte mais longa de sua fala, Bolsonaro afirmou:
“Um ano de muitas dificuldades. No entanto, não nos faltaram seriedade, dedicação e espírito fraterno no planejamento e na construção de políticas públicas em prol de todas as famílias”.
Ficou por conta de Michelle o trecho mais marcadamente bolsonarista da mensagem:
“Com dignidade e respeito ao próximo, não economizamos esforços para apoiar a todos, em especial os mais vulneráveis. Não nos afastamos em nenhum momento do que acreditamos e defendemos: Deus, pátria, família e liberdade. Agradecemos a cada brasileiro pela confiança em nosso país. Desejamos que todos celebrem este Natal do jeito que amamos: com nossos familiares e amigos”.
A parte do boa noite coube a Bolsonaro:
“Que 2022 seja um ano de esperança, conquistas e realizações. Que Deus proteja as nossas famílias!”
Do total de 158 palavras, 55 foram ditas por Bolsonaro, 73 por Michelle. Nenhuma sobre a pandemia que por aqui matou mais de 618 mil pessoas. Nenhuma de conforto para os que perderam parentes e amigos. Nenhuma para os que passam fome. Sobre a vacinação infantil, apenas o silêncio.
Verdade que pela manhã, em mais um encontro com devotos no cercadinho do Palácio da Alvorada, Bolsonaro repetiu:
“Não tá havendo morte de criança que justifique algo emergencial. Tá morrendo criança de 5 a 11 anos que justifique algo emergencial? É pai que decide, em primeiro lugar. […]Se tem um problema na Saúde, vão me culpar. Quando quero dar uma opinião, estou interferindo. Situação minha é complicada”.
Complicada é a situação das crianças e dos seus pais, que querem vaciná-las. De acordo com dados do Sistema de Vigilância Epidemiológica da Gripe, do começo da pandemia até o último dia 6 foram registradas 301 mortes de crianças entre 5 e 11 anos por Covid-19 no país. E ainda não havia Ômicron no pedaço.
Em tempo: faltaram os pulinhos de agradecimento a Deus dados por Michelle quando o Senado aprovou a indicação do terrivelmente evangélico André Mendonça para ministro do Supremo Tribunal Federal. Uma graça!