Bolsonaro quer congelamento de preços até que passe a eleição
É o sacrifício a ser feito pelos comerciantes de alimentos para evitar a volta da esquerda ao poder
atualizado
Compartilhar notícia
Num país de 33,4 milhões de famintos, o governo pede ao Congresso que autorize gastos em torno de R$ 30 bilhões para dar comida a quem não tem? Não. Para reduzir em pouco mais de R$ 1 o preço do litro de gasolina e beneficiar os donos de carros.
Insensibilidade social? Sim, mas também cálculo político. Donos de carros votam. E eles andam bastante irritados com os constantes anúncios de aumento do preço da gasolina. Por terem renda superior, não são os que mais sofrem com a inflação.
Para esses, do estrato inferior, em geral esquecidos pelo governo ao longo dos últimos três anos e meio e dispostos a eleger Lula em outubro próximo, Bolsonaro e Paulo Guedes, ministro da Economia, apelam à boa vontade dos comerciantes de alimentos.
Apelaram no primeiro ano da pandemia quando a cesta básica em São Paulo bateu R$ 560. Bolsonaro, então, sugeriu aos donos de supermercados que tivessem lucro próximo de zero na venda de alimentos. Os preços subiram mais de R$ 200.
Renovaram o apelo aos participantes de um evento da Associação Brasileira de Supermercados. Guedes o fez em termos stalinistas, embora o maior marxista, leninista e stalinista do país na opinião de Bolsonaro seja o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal.
“Empresários precisam entender que temos que quebrar a cadeia inflacionária. Estamos em hora decisiva para o Brasil. Nova tabela de preços só em 2023. Trava os preços, vamos parar de aumentá-los”, ordenou Guedes, rasgando de vez a cartilha do ultraliberal.
Foi Guedes, garoto da Universidade de Chicago, professor no Chile à época da ditadura do general Pinochet, o avalista de Bolsonaro junto aos mais afortunados que há 4 anos temiam a volta da esquerda ao poder, embora Lula estivesse preso em Curitiba.
Diante do risco de a esquerda voltar outra vez, e logo com Lula à frente, vale tudo para não perder o poder. Ele e Bolsonaro querem que os donos de supermercados cortem os próprios lucros para satisfação geral dos que passam fome ou comem mal.
Quando novembro chegar, uma vez reeleito Bolsonaro, o falso liberalismo poderá ser restabelecido com o fim do represamento dos preços. Será mais um estelionato eleitoral, além de doação indireta de dinheiro para a campanha de Bolsonaro, mas e daí?
Napoleão, o mais admirado general de todos os tempos, imperador da França no século XIX, ensinou: “Primeiro a gente ganha, depois a gente vê”. A inflação contida por meios artificiais explodirá mais adiante, mas aí Guedes 2.0 promoverá um arrocho fiscal.
Ele conhece bem a receita. Sabe de antemão quem pagará a maior fatia da conta, os brasileiros mais pobres, mas sempre foi assim e sempre será. O teto dos gastos já foi para o lixo, a dívida pública cresce, o Orçamento Secreto veio para ficar, mas vê-se depois.
Quantas legiões de empresários, tipo Luciano Hang, o velho da Havan, existem por aí capazes de atender a pedidos de sacrifício da dupla Bolsonaro-Guedes? Hang atenderia? Mal os pedidos foram feitos, os donos de supermercados se apressaram a responder.
João Galassi, presidente da Associação, divulgou nota propondo ao governo isenção de impostos dos produtos da cesta básica e a desoneração da folha de pagamentos. Diz que irá repassar ao consumidor qualquer redução que houver na cadeia produtiva.
Peça tudo a um político, só não peça que apoie um presidente da República à beira do precipício. Peça tudo a um banqueiro ou a um empresário, só não peça que abra mão de ganhar dinheiro.