Aprovação de Mendonça para o STF vira moeda de troca no Senado
Se o ensaio de golpe do 7 de setembro ficar só nisso, e se depois Bolsonaro baixar a bola, quem sabe o Senado não aprova o nome de Mendonça
atualizado
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À saída, ontem, do prédio do Congresso, alguns senadores que haviam acabado de aprovar a recondução de Augusto Aras ao cargo de Procurador-Geral da República foram surpreendidos pela pergunta de um repórter sobre a indicação de André Mendonça pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal com a aposentadoria do ministro Celso de Mello.
“Acho que até dezembro decidimos sobre a indicação”, respondeu um dos senadores da bancada do governo, e os outros, entre eles um da oposição, concordaram. Mendonça está sob o sol e a chuva desde que Bolsonaro oficializou sua indicação em 13 de julho último. Cumpriu as formalidades exigidas, reunindo-se com a maioria dos 81 senadores presencialmente.
Respondeu a todas as perguntas que lhe fizeram, só se calando diante de poucas a respeito de determinados temas da agenda bolsonarista sobre costumes, como o aborto. Nem por isso sente-se seguro da aprovação do seu nome pelo Senado. Se isso acontecer, jamais será pelo placar elástico de 55 votos contra 10, como ocorreu com Aras. O que um tem que o outro não parece ter?
As diferenças são grandes, e todas favoráveis a Aras. Bolsonaro já disse que acabou com a Lava Jato porque não há mais corrupção no governo. Não foi ele que acabou, mas Aras. E isso deixou felizes os parlamentares suspeitos ou processados por corrupção, e também aqueles que no futuro poderão se tornar suspeitos ou processados. São muitos os aspirantes à tal condição.
Política virou negócio que enriquece os que a usam sem nenhum escrúpulo. Este blog, há duas semanas, ouviu a confissão de um senador de folha corrida reconhecidamente limpa: “Você não sabe como é fácil roubar se estiver no governo, qualquer governo, ou se for aliado de um”, disse o senador do sul do país. “Eu rezo todo dia para não cair em tentação.” Que Deus atenda às suas preces!
“Meu pai foi vereador, prefeito, deputado estadual, e eu sei quanto é dura e sofrida a vida de um político”, discursou Aras ao ser sabatinado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado. “A Lava Jato criminalizou a política, e eu me opus.” Palavras que soaram como música aos ouvidos de uma plateia que sempre quis ver pelas costas o ex-juiz Sergio Moro.
Mendonça sucedeu a Moro no Ministério da Justiça, e um dos problemas que enfrenta é sua fama de lavajatista. Outro, a subserviência exagerada a Bolsonaro. O presidente voltou a repetir que Mendonça assumiu dois compromissos com ele caso vá para o Supremo: puxar uma oração na abertura semanal das sessões do tribunal e almoçar uma vez por semana com ele.
Os senadores querem no tribunal um ministro para chamar de seu, e não apenas do presidente da República. Pela mesma razão, ministros do Supremo também reagem à indicação de Mendonça. Isso não quer dizer que o Senado a rejeitará. Vai depender muito do comportamento de Bolsonaro depois do ensaio de golpe a ser encenado no próximo 7 de setembro.
Se ele continuar elevando o tom da voz contra a democracia, uma das formas que o Senado tem de retaliar é engavetar a indicação de Mendonça. A de Eduardo Bolsonaro, para embaixador do Brasil em Washington, chegou a ser enviada por seu pai ao Senado, e por lá ficou até mofar. Acabou sendo retirada.