Ao olhar-se no espelho, Bolsonaro se arrepia ao ver Jeanine Áñez
Se nada lhe acontecer, seus sucessores estarão autorizados a fazer coisas piores
atualizado
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O fantasma que assombra Bolsonaro desde que ele foi derrotado no último domingo atende pelo nome de Jeanine Áñez Chávez, uma advogada boliviana de 55 anos que governou seu país entre 12 de novembro de 2019 e 8 de novembro de 2020. Ela está presa.
Quando Evo Morales, o então presidente, foi forçado pelos militares a renunciar e deixar o país, Jeanine, na condição de vice-presidente do Senado, e na ausência do presidente e do primeiro vice, autoproclamou-se presidente interina da Bolívia.
Sua ascensão ao cargo foi legitimada pelo Tribunal Constitucional Plurinacional, o equivalente ao Supremo Tribunal Federal (STF). Um ano depois, ela tentou se reeleger, mas perdeu. Acusada de golpista, detida por 15 meses, foi condenada a 10 anos de prisão.
Sempre que menciona Jeanine, Bolsonaro se abate ou se revolta. Por quatro vezes, segundo o site da BBC de Londres, Bolsonaro falou dela publicamente. No momento, há quatro inquéritos no STF em que Bolsonaro é investigado por variados crimes.
Em abril último, em Brasília, sem que ninguém lhe tivesse perguntado nada, Bolsonaro comentou com devotos no Palácio da Alvorada a situação de Jeanine que já estava presa, mas ainda não havia sido condenada:
“Tenho certeza: eu jamais serei uma Jeanine. Jamais. Porque, primeiro, eu acredito em Deus e, depois, eu acredito em cada um de vocês que estão aqui. A nossa liberdade não tem preço. Digo mais: ela é mais importante que a nossa própria vida”.
Dois meses mais tarde, ao saber que ela fora condenada, Bolsonaro voltou ao assunto, e novamente sem ter sido provocado:
“O que for possível eu farei para que ela (Jeanine) venha para o Brasil, caso assim o governo da Bolívia concorde. Estamos prontos para receber o asilo dela, como dos outros dois (aliados de Jeanine) que foram condenados a 10 anos de cadeia”.
A própria Jeanine recusou a oferta por se considerar “inocente” e querer permanecer em seu país. Em junho, desta vez em viagem a Orlando, nos Estados Unidos, Bolsonaro comparou-se a Jeanine para atacar o ministro Alexandre de Moraes, do STF:
“A turma dela perdeu, voltou a turma do Evo Morales. O que aconteceu um ano atrás? Ela foi presa. E agora foi confirmado dez anos de cadeia para ela. Qual a acusação? Atos antidemocráticos. Alguém faz alguma correlação com Alexandre de Moraes e os inquéritos por atos antidemocráticos? Ou seja, é uma ameaça para mim quando deixar o governo?”
Seis dias depois da vitória de Lula, Bolsonaro ainda não a reconheceu. Limitou-se a dizer “acabou”. Da prisão, Jeanine reconheceu a vitória de Lula na segunda-feira e pediu que ele “condene abusos políticos” na Bolívia, Nicarágua e Venezuela.
Se Bolsonaro fez o que fez nos últimos quatro anos e não foi punido; e se o que fez não o levar a ser condenado depois que deixar o poder, então o seu sucessor, e o sucessor dele estarão autorizados a cometer os mesmos crimes ou talvez piores.