Acostumado a ganhar, Arthur Lira foi derrotado por Lula na Câmara
Novas batalhas à vista até que se entendam – ou não
atualizado
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Lula disse, como se não quisesse dizer, que, se o problema de Arthur Lira (PP-AL) com ele e o governo fosse apenas a indicação de um ministro, seria fácil resolver. Lula estaria disposto a dar um ministério a Lira em troca do seu apoio e de parte dos votos que ele tem na Câmara dos Deputados. Não precisaria ser todos.
O apoio de Lira não precisaria implicar a entrada do seu partido, o PP, na base do governo. É claro que Lula não lhe daria qualquer ministério. Insinua-se, por exemplo, que Lira quer o Ministério da Saúde para chamar de seu, e a cabeça de Renan Filho (MDB-AL), ministro dos Transportes, para chamar de sua. Lira nega.
Lira nega também que vê a digital de Lula na operação da Polícia Federal que investiga fraude em licitação e lavagem de dinheiro na compra de kits de robótica em Alagoas com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Entre os alvos da operação está Luciano Cavalcante, ex-assessor de Lira.
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou, anteontem, para julgamento uma ação contra Lira, acusado de corrupção passiva. Em 2012, um assessor de Lira foi preso em São Paulo com 106 mil reais escondidos dentro da roupa. Segundo a denúncia, o dinheiro seria propina para Lira.
À época, Lula já não era presidente. Portanto, nada teve a ver com a prisão. Mas Toffoli é ministro por indicação de Lula. Não estaria interessado, logo agora, em agradar a Lula, que se sente acuado por Lira? Lira não acredita nisso. É pura coincidência. A ação deverá ser julgada na próxima semana por uma das turmas do tribunal.
Lula e Lira se falaram por telefone no meio da tarde da última quarta-feira. No dia seguinte caducaria a medida provisória que deu ao governo sua atual configuração. Se ela não fosse votada como Lira chegou a ameaçar, o governo perderia 14 ministérios de uma vez, ficando com a cara do governo Bolsonaro.
Lira reclamou a Lula de dificuldades na articulação política do governo e queixou-se dos ataques que sofre do senador Renan Calheiros (MDB-AL) nas redes sociais. Calheiros é aliado de Lula e adversário figadal de Lira no seu estado. Não se sabe o que Lula respondeu, mas Lira, no início da noite, cuspiu fogo.
Ao chegar à Câmara, adiantou-se às perguntas dos jornalistas e ditou:
“Há uma insatisfação generalizada dos deputados, e talvez dos senadores, que ainda não se posicionaram, com a falta de articulação política do governo, não de um ou outro ministro”.
Depois que a Câmara aprovou a Medida Provisória por 337 votos contra 125 sem que a “insatisfação generalizada” tenha se materializado, Lira passou recibo de sua derrota:
“Daqui para a frente, o governo vai ter que andar com suas próprias pernas”.
Foi uma vitória de Lula, que, pessoalmente, negociou o apoio de deputados em troca da liberação de emendas ao Orçamento para a construção de pequenas obras em seus redutos eleitorais. Lira foi passado para trás e não se conforma. Menos de 24 horas depois, o Senado votou e aprovou a Medida Provisória.
Presidente da República não pode tudo, mas pode muito. Lira é órfão de Bolsonaro, que lhe entregou a gerência do Orçamento Secreto, considerado inconstitucional pelo Supremo. É possível que Lula e Lira venham a se entender um dia, mas não neste momento. Os dois ainda irão travar duros combates.