A tentativa de golpe em 8 de janeiro foi tudo, menos imprevisível
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Bolsonaro: não viu, não sabe, não lembra
atualizado
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O governador Ibaneis Rocha (MDB) acertou ao descrever como “apagão geral” a paralisia da Polícia Militar do Distrito Federal diante dos atos golpistas de 8 de janeiro. Errou, porém, ao chamar de “coisa imprevisível” o que aconteceu na Praça dos Três Poderes, e arriscou-se ao dizer que “não foi culpa do Anderson”.
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça, está preso num batalhão da PM no Guará desde 14 de janeiro. No dia 2, ele havia assumido a Secretaria de Segurança Pública. No dia 6, embarcou de férias para os Estados Unidos, onde diz ter perdido seu celular. No dia 8, pela TV, assistiu de lá à tentativa fracassada de golpe.
Foi preso ao voltar porque a Polícia Federal encontrou na sua casa a minuta de um decreto que permitiria ao presidente da República intervir no Tribunal Superior Eleitoral. Se isso tivesse acontecido, a eleição presidencial de 2022 poderia ter sido anulada, certamente seria. Ontem, no tribunal, ele depôs.
Perguntaram-lhe três vezes se Bolsonaro sabia da minuta do decreto, e ele negou três vezes. Perguntaram-lhe sobre o autor da minuta, e ele respondeu que desconhecia. Perguntaram-lhe como a minuta chegou às suas mãos, e ele disse que foi por meio de um assessor. E o nome do assessor? Torres não lembra.
Em depoimento anterior, o ex-ministro taxou o conteúdo da minuta do decreto de “folclórico”, “loucura” e “lixo”. Se era tudo isso, porque guardou a minuta em sua casa? Torres alegou que só tinha lido o início da minuta, que nem tinha se dado ao trabalho de fazer a leitura de todo o documento:
“Comecei a ler, era uma loucura”.
Advogados de Bolsonaro anunciaram que irão pedir ao tribunal que mantenha em sigilo o depoimento de Torres. Antes, haviam tentado, sem sucesso, que Torres não fosse ouvido no processo que poderia tornar Bolsonaro inelegível. Quanto mais o processo se arrastar, melhor para o ex-presidente.
O que aconteceu em Brasília em 8 de janeiro foi tudo, menos “coisa imprevisível”. A Secretaria de Segurança Pública foi alertada para a chegada à cidade de ônibus lotados com bolsonaristas para o que nas redes sociais era chamado de “Operação Tomada do Poder”. Gentilmente, o Exército abrigou essa gente à porta do seu QG.
Na noite do golpe frustrado, um batalhão da PM foi prender os que participaram dos ataques ao Palácio do Planalto, Congresso e Supremo Tribunal Federal. O comandante do Exército não deixou, só no dia seguinte. Muitos, entre eles, parentes de militares, aproveitaram a madrugada para fugir do acampamento.