O Haiti é um rio de crises cuja foz desemboca no abismo. A atual se aproxima de uma guerra civil, com a capital em estado de emergência, gangues libertando presidiários, atacando edifícios públicos e o aeroporto e enviando um ultimato ao primeiro-ministro Ariel Henry, que estava no Quênia negociando uma missão de paz para garantir eleições no país no ano que vem: para o Haiti você não volta. Se Henry conseguir apoio armado, o conflito pode ser inevitável.

As gangues são lideradas por Jimmy Cherizier, o “Barbecue” – na verdade ele se autoproclamou líder revolucionário, o que provocaria uma disputa de poder caso o golpe tenha sucesso –  e exigem o fim do governo provisório de Henry, que terminaria no dia 7 de fevereiro. Sem o anúncio, eles ameaçam tomar o poder.. Proibido de voltar ao país, o primeiro-ministro desembarcou em Porto Rico à espera de uma solução.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken pediu que Henry apoiasse uma proposta de transição e que deixasse o governo, mas a negociação ainda não obteve êxito.

As crises contínuas no primeiro país independente das Américas são resultado de um processo histórico, como lembra Gabriele Apollon em entrevista ao Nexo. Bilhões em indenização à França após a libertação do país dizimaram a economia; o país foi ocupado pelos EUA entre 1915 e 1934; 29 anos da ditadura de Papa Doc e seu filho Baby Doc – com apoio dos EUA – cavou 300 mil covas para dissidentes, o que resultou em uma fuga de cérebros. A primeira eleição democrática foi em 1990.

Em meio ao caos, cerca de 80% da população está desempregada. As atividades portuárias estão paralisadas, o que impacta fortemente a economia, os serviços de saúde estão em colapso. Já não se sabe se um aceno de Ariel Henry, marcando e garantindo a segurança de eleições presidenciais será suficiente. Em outubro de 2023, o Conselho de Segurança da ONU autorizou o envio de uma força internacional para ajudar a Polícia Nacional do Haiti a enfrentar os grupos paramilitares. O Quênia se comprometeu a iniciar a ação, mas a nação tem seus próprios problemas internos. No horizonte do Haiti, enxerga-se muita violência e rios de sangue.