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Governo se desfaz de 17 mil obras do acervo da memória da ditadura

São itens como relatórios da Comissão da Verdade, publicações sobre tortura e relatos de advogados de perseguidos do regime

atualizado

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Igo Estrela – Metrópoles
Ato contra a ditadura -- Metrópoles
1 de 1 Ato contra a ditadura -- Metrópoles - Foto: Igo Estrela – Metrópoles

Quando o governo Bolsonaro começou, a então ministra Damares Alves – da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos – iniciou uma cruzada para eliminar as memórias da ditadura e anulou centenas de concessões de anistia aprovadas anteriormente para perseguidos e torturados pelo regime militar.

Damares, mais de uma vez, deu declarações negacionistas sobre a existência dos anos de chumbo e, num vídeo, mostrou uma série de publicações sobre aquela época. Ela acusou ser desperdício de dinheiro público e armazenou todo esse material. São publicações elaboradas pela Comissão de Anistia, que pode ser encerrada pelo governo este ano.

O ministério, hoje, quer se desfazer desse material. Segundo suas próprias contas são cerca de 17 mil itens. O governo alega não se tratar de descaso com a memória da ditadura, mas uma questão de logística. Diz não haver espaço para tanta coisa. O ministério informou se tratar de uma doação. Esse material foi produzido nos anos dos governos do PT.

O Blog do Noblat teve acesso a relação desse acervo, o que contém nas caixas armazenadas em algum canto de uma sala na Esplanada dos Ministérios e longe dos olhos da sociedade.

Nesse acervo tem 500 CDs do relatório final da Comissão Nacional da Verdade, instituída no governo Dilma Rousseff, e que aponta uma lista de militares responsáveis por torturas e mortes durante a ditadura e que deveriam ser punidos.

Tem mais: 10 livros com o título “Paulo Freire, anistiado político brasileiro”. O educador foi escolhido como um dos nomes a serem combatidos pelo bolsonarismo. Consta também nesse acervo 40 publicações da extensa publicação “Os advogados contra a ditadura por uma questão de justiça”. Esse livro traz relatos de advogados que atuaram a favor de perseguidos políticos e que foram julgados em tribunais militares naquela época.

No material, 288 unidades da revista “Anistia Política e Justiça de Transição”. Há também 63 DVDs e 270 publicações do projeto “Sala escura da tortura”, uma mostra com telas inspiradas nos relatos de Frei Tito, durante seu exílio na França. Frei Tito foi um religioso brasileiro, preso e torturado pelos agentes da repressão. Morreu no exílio.

O ministério informou não ter espaço físico adequado para armazenar todo esse material e que o atual local onde está o acervo terá outra destinação. O material foi disponibilizado para doação em 2020. O governo também informou que há tratativas com  Universidade de Brasília, que se mostrou interessada no acervo. Segundo o ministério, estas publicações estão disponíveis na biblioteca do ministério e no acervo da comissão.

A jurista e professora Eneá Stutz, da UnB, que dirige um grupo de Justiça e Transição na instituição, mostra-se preocupada com o destino desse acervo e sua preservação. Ela demonstra outra preocupação que é com os milhares de processos de perseguidos que estão sob a guarda da comissão. Se tratam dos casos que foram e ainda estão para serem julgados nesse colegiado, com uma série de documentos, áudios e provas da ação do Estado contra essas pessoas.

“Há uma preocupação com a preservação desse acervo e também com a preservação dos processos, porque continuarão sob a guarda do ministério, o que inclui os áudios. Sempre estiveram sob a guarda do Ministério da Justiça e agora (no governo Bolsonaro) sob o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. É a preservação desses áudios, das gravações das sessões e das centenas, milhares de sessões de julgamentos minha e do meu grupo de pesquisa” – disse Eneá Stutz.

Segundo o ministério, esses processos de julgamento serão preservados e não estão inseridos na lista de publicações a serem doados.

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