Funasa é um cantinho para o centrão chamar de seu
São décadas de verbas sem fiscalização, indicações, denúncias e obras inacabadas
atualizado
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A Medida Provisória que decretava a extinção da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) foi para o vinagre. Desde sua publicação, em 2 janeiro, o fim do órgão foi alvo de críticas de parlamentares, inclusive da base governista. A proposta do governo era que suas ações fossem incorporadas pelos Ministérios da Saúde e Cidades. Mas com tanto dinheiro para obras em redutos eleitorais – foram quase R$ 3 bilhões nos últimos quatro anos só para ações de saneamento – e indicações para cargos, o centrão prevaleceu. E o histórico de péssimos serviços e denúncias de corrupção deve continuar.
O relator da MP na Câmara, deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), até tentou incluir a extinção no parecer sobre a MP dos ministérios. Entretanto, os deputados aprovaram uma sugestão do PL para retirar o artigo do texto final. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que seria um “gesto de grandeza” do governo para fortalecer sua relação com a Câmara. Conversa. Até o Líder do PT na casa, o deputado Zeca Dirceu defendia a recriação da entidade.
Sinônimo de cabide de emprego e verbas sem fiscalização, a ideia de extinguir a fundação não é nova. Durante a transição para o governo Bolsonaro, ela foi alvo do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Ele teria levado a ideia para o ex-presidente. A proposta dissipou-se.
Criada em 1991, a Funasa é a porta de entrada de um sistema de saúde eficiente, pois tem entre suas competências ações de saneamento para prevenção e controle de doenças. A entidade é uma fusão de órgãos do setor, entre os quais a Fundação Serviços de Saúde Pública e a Superintendência de Campanhas de Saúde Pública.
O MDB reinou no órgão por décadas. Desde Bolsonaro, era regido pelo PSD de Kassab. Mas a decisão afetou também indicados de parlamentares de seis partidos diferentes, como Republicanos, Pros, PP, Avante e União Brasil. Tentaram cutucar um vespeiro.
O governo argumenta que os recursos são transferidos, mas as obras não são entregues. É o que apontou um relatório da CGU – Controladoria-Geral da União – que encontrou obras abandonadas e afirmou que os projetos obedeciam apenas às emendas parlamentares, sem planejamento nem estratégia. Ainda segundo o CGU, a fundação não criou um cadastro de prioridades das obras e, após a liberação das verbas, as superintendências regionais não fiscalizam os trabalhos. “A Funasa passou a ter um custo muito maior do que a sua execução”, disse o relator Isnaldo Bulhões.
Denúncias de corrupção? Durante o governo Bolsonaro o Estadão destacou um sobrepreço de 131 milhões de reais em uma licitação de R$ 454 milhões para ligar poços de água no sertão nordestino. Em 2005 houve um rombo de R$ 75 milhões em 176 convênios com as prefeituras ONGs. Em 2011 auditoria da CGU revelou um desvio de 500 milhões de reais rm convênios irregulares, contratações viciadas e repasses a Estados e prefeituras sem a prestação de contas exigida por lei. Em 2008, o Ministério Público Federal no Distrito Federal pediu que três ex-presidentes do órgão devolvessem R$ 56,6 milhões em contratações ilegais de mão de obra terceirizada.
De acordo com o relatório de Isnaldo, mesmo com a MP da Funasa caducando, o Poder Executivo poderia extinguir a fundação com base nas regras estipuladas na reorganização do governo. Outra alternativa é secar o orçamento do órgão e transferir as suas obras para os ministérios dentro de um plano estratégico que atenda às necessidades das pessoas e não dos políticos. O governo tentou se impor com uma MP sem negociar com o centrão. Caducou. Sua recriação ainda passará pelo Senado. A ver as cenas dos próximos capítulos.