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Zé Celso Martinez, último suspiro: entrevista na Folha(por Vitor Hugo)

Conversa direta, sem subterfúgios – ou “fabulações que costumam destruir as melhores entrevistas”

atualizado

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Zé Celso
1 de 1 Zé Celso - Foto: Reprodução/Instagram

Conversa direta, sem subterfúgios – ou “fabulações que costumam destruir as melhores entrevistas”, segundo Juarez Bahia, ex- editor Nacional do Jornal do Brasil, mestre de teoria e prática de comunicação de várias gerações do nosso jornalismo –, e sempre surpreendente, verdadeira e desconcertante.É assim a entrevista inédita do dramaturgo José Celso Martinez, publicada domingo passado no caderno cultural “Ilustríssima” da Folha de S. Paulo. Desde a abertura, quando o entrevistado subverte tudo, e pergunta ao repórter se ele tem um “baseado”, antes de começar a conversa.

Depois de ler e reler o texto, posso dizer: é destes momentos do jornalismo (cada vez mais raros) que empolgam, emocionam e viram referenciais do momento e do tempo que a sociedade e sua imprensa atravessam. Repleta de informações inéditas – ou recuperadas depois perdidas ou dispersas no espaço e no tempo – de inegável relevância jornalística, política e cultural, além de lances pessoais e humanos incríveis.

Ou as duras críticas, sem meias palavras, ao desastre e apagão completo para o teatro, cinema as artes e cultura em geral, “da bosta dos quatro anos do governo do Bozo (Bolsonaro)”. Ou, ainda, o relato do encontro recente com Chico Buarque, no show do artista no Rio de Janeiro, para fazer as pazes – “e pedir os direitos de uso da antológica canção “As Caravanas”, em uma de suas peças – depois do rompimento dos dois, em razão de polêmicas e mal entendidos com a adaptação da peça “Roda Viva”, de Chico, em São Paulo. E mais, muito mais, neste feito do jornalismo cultural brasileiro.

Além dos citados, são muitos e variados os dados, fatos e aspectos relevantes deixados no rastro fértil da conversa do consagrado nome da arte e cultura nacional, com o jovem jornalista diplomado pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia, Claudio Leal – de destacada passagem pela redação de A Tarde, na editoria de Opinião, ao lado deste articulista –, e recentemente diplomado mestre em teoria e história do cinema pela USP. Numa espécie de “Meu último suspiro” (livro do relato antológico das memórias do genial cineasta espanhol Luís Buñuel, o dramaturgo paulista fala de sua longa trajetória, sua formação intelectual, “o flerte juvenil com o integralismo de Plínio Salgado”, o convívio criativo com Glauber Rocha – que o orientou a se aproximar de Lina Bardi, “sua irmã de pensamento e criação”– Caetano e Chico, o impacto da antropofagia na cultura brasileira, o futuro do Teatro Oficina (traçado no casamento com Marcelo Drumond. Nesta derradeira conversa, Zé Celso fala também da sua ligação com o professor e historiador Hélio Rocha (marcante presença no ensino de gerações na educação da Bahia); a proximidade da morte, “e do desejo constante pelos palcos”, interrompido pelo incêndio (tudo indica causado por um aquecedor ligado no quarto do dramaturgo, na fria noite do inverno paulistano.

Realizada em 20 de maio, um mês antes de sua morte, a entrevista no apartamento do dramaturgo, na rua Achilles Masetti, em São Paulo, tinha como gancho jornalístico original, a adaptação do livro “A Queda do Céu”, de Davi Kopenawa, para os palcos. A demora na publicação e os fatos trágicos e inesperados que se seguiram, emprestam ainda mais amplitude e valor à entrevista da Folha, e fazem dela um marco do jornalismo cultural deste inverno brasileiro. Para ser lido, relido e permanecer.

 

Vitor Hugo Soares é jornalista, editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail:vitors.h@uol.com.br

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