Unir o Brasil (por Gustavo Krause)
Unir o Brasil significa enfrentar a violência disseminada que destruiu afetos familiares, longas amizades e glorificou a intolerância
atualizado
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“A ninguém interessa viver num país dividido e em permanente estado de guerra. Este país precisa de paz e união”. As primeiras palavras de Lula, Presidente eleito, celebram um compromisso histórico com a nação brasileira e, ao mesmo tempo, revoga o antigo discurso que dividia a nação entre “nós e eles”.
Não se trata de prioridade programática do chefe de governo. A promessa é uma tarefa gigantesca de quem pretende fazer história como estadista.
Renovada a cada eleição, a democracia assegura a alternância do poder de acordo com as regras da Constituição.
De outra parte, legitima os vencedores para o exercício do poder e aos perdedores aponta o caminho, igualmente legítimo, de assumir o papel de oposição e a dialética do contraditório.
Passadas duas semanas da eleição, dois movimentos saltam aos olhos da sociedade: o primeiro, por convicção e/ou pragmatismo, o Presidente acena para o centro, eleitoralmente esmagado, porém politicamente importante, para formar, como prometeu, um governo “além do PT”; o segundo, é a crônica de uma “resistência” anunciada pelo atual Presidente, ao colocar, desde sempre, a possibilidade de fraude nas urnas eletrônicas.
As tensões e os conflitos no período eleitoral se agravaram depois da apuração com o prolongado silêncio do Presidente Bolsonaro sobre a derrota eleitoral; o movimento dos caminhoneiros, com efeitos dramáticos sobre a população brasileira; e vozes irresignadas na porta de quarteis, clamando por uma intervenção militar.
A propósito, a afronta às regras da democracia e a violência política não são uma novidade do nosso tempo, muito menos, um produto made in Brazil.
Nos EUA, quatro presidentes foram assassinados no exercício do cargo e a invasão do Capitólio configura crime contra a democracia, cometido por Trump.
No Brasil, Prudente de Moraes, em 1897, foi salvo das punhaladas de Marcelino Bispo pelo sacrifício do Ministro da Guerra, Marechal Carlos Bittencourt, e o, então, candidato Bolsonaro foi vítima de uma facada desferida por Adélio Bispo.
Com efeito, a tarefa de unir o Brasil, não se limita à ampla coalizão para governar, nem se esgota na relação harmônica entre os poderes que funcionam como pesos e contrapesos.
Cabe enfrentar a violência disseminada, cruel, que destruiu afetos familiares, longas amizades e glorificou o demônio da intolerância que impede o “aprendizado pelo desacordo”. Uma de suas raízes está na obra do jusfilósofo e ideólogo do nazismo, Carl Schmitt, O conceito do Político, definido pela categoria amigo-inimigo e a consequente eliminação do outro.
Gustavo Krause foi ministro da Fazenda